Mercado aplaude queda do dólar, mas tem cautela

A volta do dólar ao patamar de R$ 3 é o sinal mais evidente do otimismo do mercado financeiro com o governo Lula. Mas, enquanto analistas aprovam a austeridade das políticas fiscal e monetária do governo, a euforia dá lugar à cautela quando se trata da estratégia da equipe de Lula para lidar com questões setoriais da economia, que podem inibir a boa vontade dos investidores estrangeiros em relação ao País. Crescem no mercado financeiro, por exemplo, as preocupações com possíveis mudanças nas agências regulatórias ? que cuidam dos setores de energia, telefonia e petróleo, entre outros ? e nos contratos de concessão de serviços públicos.

Rio

(AG) – Enquanto alguns analistas temem que a mudança de regras afaste investidores, outros afirmam que há distorções que precisam ser corrigidas para garantir a volta dos investimentos.

Na semana passada, no boletim da consultoria Tendências, o economista José Márcio Camargo alertou para o risco de que regulação falha, contratos descumpridos e agências enfraquecidas diminuam o interesse dos investidores em oferecer serviços de infra-estrutura no Brasil. Representantes do ministério e o próprio presidente Lula têm criticado o excesso de poder das agências e os critérios de reajuste das tarifas.

“Os microfundamentos pioraram com o novo governo. O risco se deslocou da área macroeconômica para a microeconômica”, afirmou Camargo, citando a melhora em indicadores como dólar e risco-País, por um lado, e as incertezas setoriais, por outro.

Mas, para Antônio Corrêa de Lacerda, presidente da Sobeet (entidade que acompanha os investimentos externos), o risco microeconômico não é recente. O problema, afirma, foi herdado da administração anterior. Ele cita especificamente os setores de energia e saneamento, nos quais a falta de regulamentação clara inibiu investimentos.

? O problema começou nas privatizações. Saímos de um modelo estatal para outro de mercado sem definição clara de regras. Esse é o pior dos mundos para o investidor.

O economista Aloísio Araújo, professor da FGV e do Impa, concorda que é preciso aprimorar as regras do setor elétrico. Mas acredita que não se pode mudar os parâmetros atuais, apenas aperfeiçoá-los:

? Estamos num ambiente regulatório novo desde as privatizações e é importante mantê-lo para não criar incertezas entre os investidores. O governo deveria ser mais firme no compromisso com o marco regulatório do governo anterior.

Araújo critica principalmente a proposta de mudança no índice de reajuste das tarifas públicas, o que, na sua opinião, seria desrespeitar contratos.

Já o pesquisador Helder Queiroz, do Grupo de Economia da Energia da UFRJ, afirma que o mais importante, agora, é definir rapidamente um novo modelo regulatório para os diferentes setores da economia:

? O governo tem que agir como fez no plano macroeconômico, onde houve um processo de redução de incertezas. Assim que as novas regras estiverem definidas, os investimentos voltam.

Melhoras terão que inserir mais ingredientes

Integrantes do governo reconhecem que as melhoras observadas até agora nos indicadores econômicos contaram com importantes ingredientes externos e, para se sustentar, serão necessários resultados concretos, com a manutenção e o aprofundamento do programa de Lula.

? Houve, sim, uma convergência de fatores. Mas, se não fossem as ações do governo para derrubar as dúvidas que existiam no mercado em relação ao projeto do governo Lula, as melhoras nos indicadores não teriam acontecido. Agora temos que aproveitar a janela de oportunidade e seguir com a proposta de crescer com austeridade fiscal e monetária e distribuir de renda e, para isso, as reformas são fundamentais ? disse um integrante do governo.

Para analistas, a sustentabilidade das melhoras observadas até agora e das que estão por vir depende muito das reformas. O ex-diretor de Política Econômica do BC Sergio Werlang afirmou que, se bem feitas, as reformas permitirão que o país cresça e consiga bons superávits primários sem carga tributária mais elevada.

? As reformas darão uma maior eficiência microeconômica sem pesar nos gastos do governo. Se forem bem feitas, o governo poderá cumprir os seus objetivos e o País poderá se tornar investment grade (a melhor classificação de risco para os investidores) em quatro ou cinco anos ? disse.

Para o presidente do Instituto para Economia Internacional, Fred Bergsten, para manter a melhora do cenário é preciso o país demonstrar que é possível crescer e distribuir renda ao mesmo tempo:

? À medida que resultados concretos forem mostrados, as reações do mercado serão ainda mais positivas. Então está na hora de demonstrar o que está no discurso.

Grupos de WhatsApp da Tribuna
Receba Notícias no seu WhatsApp!
Receba as notícias do seu bairro e do seu time pelo WhatsApp.
Participe dos Grupos da Tribuna
Voltar ao topo