A restrição imposta pelo teto de gastos tem encorajado o Congresso a dar aval a soluções consideradas como precedente perigoso na criação de “válvulas de escape” ao limite de despesas, na avaliação de técnicos que monitoram as contas públicas.
Um dos exemplos disso é a medida provisória (MP) 809, que cria um fundo privado para receber o dinheiro da arrecadação de compensações ambientais, que poderá ser usado pelo ICMBio nas unidades de conservação. Em outro exemplo, o relator do projeto de privatização da Eletrobrás, José Carlos Aleluia (DEM-BA), incluiu no texto a criação de uma estrutura fora do Orçamento para aplicar recursos na revitalização da Bacia Rio São Francisco.
Fontes ouvidas pelo Estadão/Broadcast avaliam que as iniciativas são forma clara de burlar o Orçamento, especificamente o teto de gastos. No caso do ICMBio, o texto foi aprovado pela Câmara e está na pauta de terça-feira do Senado. Se aprovado, vai à sanção presidencial.
Os parlamentares que formaram a comissão mista dedicada a debater a MP 809 admitem a intenção de burlar o teto. “Por conta da Emenda Constitucional 95, que estabelece limite de gasto, por conta de um parecer do Tribunal de Contas da União, estamos impedidos de usar quase R$ 1,5 bilhão de compensação ambiental”, disse o senador Jorge Viana (PT-AC), relator da MP na comissão.
O problema, dizem técnicos, não está no objetivo da política, mas no precedente criado para que o Congresso tente apartar outras receitas e despesas, à medida que o teto imponha restrições maiores. O temor é que a MP abra o caminho para a criação de “orçamentos paralelos”.
É justamente esse movimento que está acontecendo no projeto de lei da privatização da Eletrobrás. A proposta enviada pelo governo ao Congresso propõe que a companhia destine R$ 9 bilhões ao longo de 30 anos para a revitalização da Bacia do São Francisco, sendo R$ 350 milhões anuais nos 15 primeiros anos e R$ 250 milhões anuais nos últimos 15.
Aleluia quer garantir que esse dinheiro não passe pelo Orçamento, para não ficar sujeito a contingenciamentos e cortes. Uma possibilidade é a criação de uma fundação, a exemplo da Renova, criada para reparar os danos do rompimento da barragem de Fundão, em Mariana (MG), em 2015.
O deputado nega que essa seja uma forma de driblar o teto de gastos. “Trata-se de dinheiro privado, e seria uma fundação de direito privado. Teto de gastos só se aplica a gasto público.”
O Ministério do Planejamento, que assinou a MP 809 com o Ministério do Meio Ambiente, nega que haja brecha para burlar o limite constitucional. Segundo a pasta, apenas receitas de caráter privado podem ser direcionadas para um fundo à parte, fora do teto de gastos.
O Ministério do Meio Ambiente também negou que a criação do fundo seja uma forma de burlar o teto. Procurado, o Tesouro não comentou, por se tratar de medida ainda em tramitação. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.