O ex-presidente do Banco Central, o economista Armínio Fraga, acredita que o mundo vive hoje uma crise sistêmica de dimensões globais que ainda não tem prazo para acabar. “É uma crise que, no fundo, é proporcional à euforia que aconteceu antes, uma fase de muito crescimento, sem dúvida, mas uma fase também de muita alavancagem (quando se investe mais do que possui)”, observou o economista em entrevista ao programa Espaço Aberto, da Globo News.
Ele disse que o período de grande alavancagem do sistema, quando os investimentos são feitos através de recursos de terceiros, e de altas margens de lucro chegou ao fim. Com isso, ele defendeu a intervenção no sistema para evitar que o problema se torne ainda maior. “Se deixarem a crise correr solta, mais bancos vão quebrar”, previu
Armínio salientou que a crise é grave e inédita, fruto da conjugação de falhas de regulação, administração de risco e também de governança. “Enfim, um problema bastante generalizado” frisou. “Chegou ao extremo de o lucro do setor financeiro dos EUA ser um terço dos lucros totais da economia, o que não faz o menor sentido”, ponderou o ex-BC. Ele acrescentou que, desta vez o problema ocorre no centro do sistema e não mais nos países periféricos. “Nesse mundo globalizado, com derivativos e uma enorme integração dos mercados, a crise está contaminando a base do sistema.
Ele lembrou que o Brasil também já viveu “um show de horrores” parecido, quando o Tesouro teve de socorrer alguns bancos estaduais e federais. “Custou. E acho que a lição foi razoavelmente aprendida.”
Questionado se o Brasil será afetado, ele respondeu: “Sim, faz parte do pacote”, referindo-se ao crescente grau de globalização da economia brasileira, com maior abertura ao mercado externo. Ele prevê que alguns itens de exportação serão afetados, mas que mesmo assim o País está muito bem posicionado diante da crise. “Não dá para querer o filé mignon sem ter algum osso de vez em quando.
Sobre a contradição existente entre a polícia monetária de austeridade do Banco Central para reduzir a demanda e declarações do ministro da Fazenda, Guido Mantega, de que o País ainda necessitaria aumentar o crédito para enfrentar a crise internacional, Armínio Fraga contemporizou. “Eu acredito que o governo sabe que não dá para ter a demanda doméstica crescendo a 8% ou 9%”, argumentou. E fez uma analogia com uma prova de Fórmula 1 sob chuva: “Às vezes se entra na pista com um pneu liso, começa a chover e tem de trocar de pneu. É melhor do que acelerar demais e depois ter um problema lá na frente.