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Lula com Jacques Chirac: nova defesa das medidas adotadas pela Bolívia. |
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva disse ontem, ao lado do presidente da França, Jacques Chirac, que a América do Sul passa por ?um momento político muito rico?. Lula voltou a reforçar sua crença na integração regional como uma necessidade para a construção da democracia e da paz e também como a única possibilidade de ver os países da região entre as nações ricas.
?Para os que duvidam, há 20 anos, a América do Sul vivia quase completamente em regime autoritário. Em todos os países, havia grupos que acreditavam na luta armada?, afirmou, ao ser indagado se os movimentos nacionalistas, a exemplo do ocorrido na Bolívia, onde o presidente Evo Morales anunciou a nacionalização do gás e ocupou militarmente as empresas que trabalham no país, afetaram a percepção de risco na América do Sul e poderiam afugentar investimentos estrangeiros.
?Da década de 90 para cá, todos os grupos, com exceção das Farc, abandonaram a luta armada e entraram na disputa democrática. Até o presidente Chávez (Hugo Chávez, da Venezuela) tentou e não conseguiu (dar um golpe de Estado nos anos 90s) e voltou pela via da eleição?, completou Lula que, pela primeira vez, fez menção à tentativa de golpe de Chávez.
Lula defendeu, mais uma vez, o processo de nacionalização do gás na Bolívia, no que foi seguido pelo presidente francês. Segundo Lula, a nacionalização do gás não se deu ?por causa do Evo Morales?. A causa teria sido, na opinião de Lula, a queda do presidente Gonzalo Sanchez de Lozada e um referendo organizado sob a presidência de Carlos Mesa, no qual 92% dos bolivianos se mostraram a favor da nacionalização.
Chirac contou que esteve duas vezes com Morales e viu que ele estava totalmente empenhado na questão da nacionalização do gás. ?As conversas com Morales me levaram a constatar que ele é um homem que devolveu a honra a um povo machucado?, disse Chirac, acrescentando que está convencido que o Brasil e a Bolívia se entenderão. ?Eu confio nos dois presidentes para encontrar uma solução harmoniosa para esta pequena dificuldade?, completou.
O presidente Lula aproveitou para, uma vez mais, rebater as críticas de vários setores da sociedade brasileira à reação moderada de seu governo às atitudes tomadas por La Paz. ?Muita gente queria que eu fosse mais duro com a Bolívia, e eu, em vez de ser truculento, acreditei no poder da conversa e na capacidade do diálogo?, declarou, lembrando que, desde o tempo de campanha, ?adotou o lema paz e amor?.
Segundo Lula, com a visita do ministro das Relações Exteriores, Celso Amorim, a La Paz, no dia 22, tornou-se claro que ?a Bolívia é sabedora que é dona do gás e é sabedora também que precisa vender gás para o Brasil?. Por isso, para ele, a solução é simples: ?De forma equilibrada, temos de encontrar um preço que atenda aos interesses do povo da Bolívia, mas que também atenda aos interesses dos consumidores brasileiros?.
Presidente francês não abre o jogo sobre subsídios
Brasília (AE) – Em visita de Estado ao Brasil, o presidente da França, Jacques Chirac, não apresentou nenhuma garantia de que apoiará uma maior abertura do mercado agrícola da União Européia, caso o governo brasileiro e seus aliados do G-20 concordem com uma maior liberalização dos setores industrial e de serviços na Rodada Doha da Organização Mundial do Comércio (OMC).
Ao lado do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, no Palácio da Alvorada, Chirac atacou os Estados Unidos, por sua resistência em reduzir os subsídios à produção agropecuária, e cobrou do Brasil e das demais economias em desenvolvimento a ausência de ofertas nas áreas industrial e de serviços. Por fim, em uma expressão clara de suas intenções na rodada, declarou que a ?Europa já fez tudo o que podia e devia?.
As declarações foram feitas depois de um encontro de três horas entre Chirac e Lula, na residência oficial do presidente da República. Chirac, entretanto, reagiu com nervosismo quando questionado sobre as garantias de apoio francês a uma proposta melhorada da União Européia na área agrícola, se o Brasil e seus aliados fizerem os movimentos cobrados pela Europa. Tirou o fone de ouvido, que lhe permitia escutar a tradução simultânea, e passou a fazer perguntas a Lula, que não entende francês. Sem saída, disparou: ?Não vou repetir pela segunda vez o que eu disse. Eu disse há pouco qual era a posição da Europa, dos países emergentes, dos países menos adiantados. Deixe que cada um faça um pouquinho. Os Estados Unidos é que devem dizer o que deve ser feito?.
O líder francês mostrou-se visivelmente alheio à avaliação do governo brasileiro, para quem essa postura da União Européia levará a Rodada Doha ao fracasso. Primeiro, porque será impossível obter dos Estados Unidos uma proposta melhor na área de subsídios domésticos; segundo, porque será improvável arrancar das economias em desenvolvimento maior liberalização dos setores industrial e de serviços.
Fincado nos interesses dos agricultores franceses, Chirac propôs uma inusitada aliança entre a Europa e o Brasil na OMC contra os Estados Unidos. ?Os Estados Unidos, na realidade, têm a chave do problema. A Europa fez tudo o que podia e devia fazer. Honestamente, não tem novos passos a dar?, afirmou, para depois acrescentar que ?o fato é que os países em desenvolvimento não deram nenhum passo significativo em direção à Europa, nos planos da indústria e serviços. É preciso esperar um pouco de progresso nesses planos?.