A criação e a divulgação do cadastro de empregadores que tenham submetido trabalhadores ao regime análogo ao da escravidão são legítimas e não constituem penalidades administrativas. Esse é o posicionamento da procuradora-geral, Raquel Dodge, em parecer enviado ao Supremo na terça-feira, 3, na Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental proposta pela Associação Brasileira de Incorporadoras Imobiliárias (Abrainc).

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A instituição questiona a Portaria 4/2016, dos ministérios das Mulheres, da Igualdade Racial, da Juventude e dos Direitos Humanos e do Trabalho e Previdência Social, além das já revogadas portarias 2/2015, 2/2011 e 540/2004.

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As informações foram divulgadas pela Secretaria de Comunicação Social da Procuradoria-Geral da República.

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Por considerar a exploração de trabalhadores em condições análogas às de escravos uma das mais graves violações aos direitos humanos, a PGR afirma ser do “poder público o dever de agir, de maneira firme, para, efetivamente, eliminar essa prática”. Desse modo, a atuação dos auditores-fiscais do trabalho, responsáveis por fiscalizar e lavrar autos de infração, “está de acordo com os princípios da legalidade, da divisão funcional dos poderes, do devido processo legal e da presunção de inocência”.

Para Raquel, os atos normativos do Ministério do Trabalho “não têm caráter sancionatório e restritivo de direitos”.

“A Portaria Interministerial 4/2016, assim como as demais impugnadas já revogadas, nada mais é do que instrumento administrativo concebido para dar concretude aos princípios constitucionais da publicidade, da transparência da ação governamental e do acesso à informação”, afirma a procuradora ao STF.

Ela destaca que não há ofensa à Constituição na criação ou divulgação da portaria, pois os atos normativos apenas regulamentam a publicação do resultado de procedimentos administrativos praticados em defesa de direitos humanos e de proteção do interesse público.

“O propósito da portaria é facilitar o acesso dos cidadãos e dos agentes econômicos a informações sobre empregadores em geral que tenham infringido a legislação trabalhista”, ressalta a procuradora.

Raquel anota que as autuações “não são sigilosas, e que a publicidade dos atos administrativos é um imperativo constitucional”.

ADI 5802

A PGR também apresentou ao Supremo parecer pela procedência da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 5.802/DF, de autoria do PDT, por meio da qual solicita a inconstitucionalidade da Portaria do Ministério do Trabalho nº 1.129/2017.

O ato normativo questionado dificultou o combate ao trabalho escravo ao alterar os conceitos de jornada exaustiva e de condição degradante, requisitos para a categorização penal dessa prática.

A procuradora-geral aponta a perda do objeto da ADI. Isso porque, ao editar uma nova portaria sobre o assunto (Portaria nº 1.293/2017), substituindo integralmente o ato anterior, o Ministério do Trabalho o revogou tacitamente. Em relação ao mérito, opina pela procedência do pedido formulado na petição inicial, por considerar a Portaria nº 1.129/2017, do Ministério do Trabalho, violadora de preceitos fundamentais constitucionais, pois ofende o princípio da dignidade humana e o artigo 149 do Código Penal, que trata da tipificação e da pena relativa ao crime de reduzir alguém à condição análoga à de escravo.

PGR defende ainda que seja acolhida proposta de medida saneadora, já que, em vez da ADI, o instrumento adequado para fazer o questionamento junto ao Supremo é a ADPF, por se tratar de um assunto de origem não legislativa ou parlamentar.