O ex-secretário de Política Econômica, Marcos Lisboa, defendeu que o próximo governo adote a mesma transparência usada na gestão da política social em relação às medidas federais de proteção de setores produtivos. “Sabemos que o programa Bolsa Família custa 0,5% do PIB, R$ 26 bilhões. Sabemos quem recebe os benefícios e quais são os objetivos”, destacou. “É preciso uma agenda horizontal onde haja uniformidade das regras tributárias. É importante fortalecer o Estado e para isso reduzir a discricionariedade do governo”, ponderou.
Segundo Lisboa, foi a intensificação das políticas de proteção a setores específicos, adotada pelo governo Dilma Rousseff, um dos principais fatores que provocaram piora da gestão da política macroeconômica desde 2011, o que gerou uma deterioração da qualidade de administração das contas públicas, patamar de investimentos estagnado como proporção do PIB e baixo crescimento em relação a outros países emergentes no período.
“Para haver investimentos em infraestrutura é preciso regras estáveis. O governo define o modelo, mas a execução é delegada a agências com poder de fato e autonomia”, disse Lisboa. Ele advogou em favor de “contratos de gestão transparentes. Sem intervenções, como foi feito com o BC, desde o governo de Fernando Henrique Cardoso”. “O sistema de metas de inflação é avaliado pelo resultado da sua ação, manter a inflação dentro da meta. Isso gerou um roteiro que dá capacidade de avaliar os rumos da política monetária”, disse. “E apesar da perda da qualidade da política econômica, o BC foi relativamente preservado”, ponderou.
Segundo Lisboa, o próximo governo deveria aprimorar a prática de lançar no Orçamento todas as despesas que pretende realizar no ano seguinte, inclusive de subsídios a políticas setoriais. “Tudo deve ser transparente no orçamento, créditos subsidiados, proteções tarifárias”, destacou. Ele defendeu que instituições de ensino de renome nacional possam avaliar o “custo de oportunidade” e os benefícios da adoção de tais políticas, com audiências públicas. “É preciso tratar a política pública como a política de medicamentos: com testes, grupos de controle e avaliações independentes”, destacou.
Lisboa ponderou que no Brasil as políticas de benefícios setoriais criaram um emaranhado institucional que é difícil de ser revertido, sendo uma delas a complexidade tributária do País. “É preciso simplificação e regras transparentes no pagamento de tributos. O médico paga igual ao médico, o mesmo se aplica às empresas”, destacou. Contudo, os sistemas de proteção discricionários concedidos pelo Estado provocam distorções na economia que são sentidas em créditos concedidos a alguns setores, pagos por toda a sociedade e com retorno questionável para o País.
“Todos temos que trabalhar para pagar R$ 26 bilhões por ano à Zona Franca de Manaus, onde cada emprego custa R$ 190 mil por ano”, disse. “Ficamos reféns da proteção. Desarmar a rede de proteções e interesses por políticas, muitas delas criadas de forma bem intencionada, não é uma tarefa fácil”, ponderou.
Nesse contexto, Marcos Lisboa destacou que no Brasil há uma espécie de cultura da “meia entrada”, termo que ele e a economista Zeina Latif tornaram popular. “Quando há a meia entrada para todo mundo, não existe mais a meia entrada. E inclusive seu preço sobe”, comentou. “Temos quem paga em operações financeiras 20% ao ano e quem paga 3%.”