O lance de R$ 19 bilhões pelo aeroporto do Galeão, no Rio – valor acima até mesmo do que foi pago por Cumbica, o maior do país, no ano passado – surpreendeu o mercado, que levantou dúvidas sobre as condições de retorno que terá a Odebrecht, líder do consórcio vencedor. Além da outorga, a concessionária precisa investir cerca de R$ 6 bilhões em infraestrutura.
Uma importante consultoria que possui modelos de rentabilidade para concessões de aeroportos estima que para um retorno de 6,49%, que era o considerado ideal pelo governo federal para remunerar o investimento nos aeroportos, a receita anual da concessionária precisa chegar a R$ 2,1 bilhões. Levando em conta o fluxo de passageiros estimado pelo governo para o Galeão, apenas um terço desta receita seria das tarifas aeroportuárias. Isso significa que a receita comercial, com hotéis, lojas, restaurantes, representaria 70% do faturamento da concessão.
“O lance foi de fato elevado se considerando que em Guarulhos que tem fluxo muito maior de passageiros, apenas cinco anos a menos de concessão, e a concessionária vencedora pagou R$ 16 bilhões. Mas temos que ponderar que a Odebrecht precisava levar esta concessão se quisesse entrar de verdade no ramo”, disse um consultor que auxiliou os vencedores de outros leilões no País. Mas nas contas da Odebrecht, o fluxo estimado pelo governo, de 60 milhões de passageiros ao final da concessão, entretanto, está subestimado. E isso fez valer nas contas de seu lance.
Lance. O lance vencedor foi 16% mais alto do que o ofertado pelo segundo colocado, de R$ 16 bilhões. Em relação ao lance mínimo, foi 293% maior. O terceiro colocado, um consórcio liderado pela Ecorodovias com a Invepar como sócia (que foi a vencedora do leilão de Cumbica), ofereceu R$ 13 bilhões. De acordo com uma fonte desse consórcio, para dar o lance a rentabilidade estimada sobre o investimento seria entre 7,5% e 9,5% ao ano. “Mas o consórcio vencedor pode ter vislumbrado uma receita comercial maior do que vislumbramos.”
A Odebrecht terá como parceria a operadora Changi, de Cingapura, que possui um dos aeroportos mais modernos do mundo com serviços que vão desde hotéis com piscina até cinemas e teatros. Em Cingapura, entretanto, somente no ano passado, passaram cerca de 50 milhões de passageiros em suas instalações. O fluxo atual do Galeão é bem menor, de 17,5 milhões.
Na avaliação do presidente da Sociedade Brasileira de Pesquisa em Transporte Aéreo, Erivelton Pires Guedes, os concessionários podem ficar pressionados nos retornos sobre seus investimentos. Ele diz que os investimentos são complexos pois envolvem grandes desapropriações e riscos ambientais.
A acirrada disputa pelo aeroporto de Confins, em Belo Horizonte, também chamou a atenção do pesquisador. O lance vencedor foi de R$ 1 bilhão com 66% de ágio. Gudes acredita que a CCR pode obter um retorno ainda melhor que a Odebrecht no Galeão, diante da exigência menor de investimentos. “O governo de Minas faz um planejamento há dez anos para o distrito do aeroporto ser uma área industrial, gerando maior desenvolvimento associado ao terminal”, diz.
O professor de microeconomia da Fundação Getúlio Vargas (FGV) e sócio-diretor da consultoria Pezco Microanalysis, Cleveland Prates, diz que para equilibrar o caixa a tendência é que o crescimento das receitas ocorra por meio da ampliação do mix de negócios e aumento nos preços de produtos e serviços destinados aos consumidores que passam pelos terminais e não somente no Galeão, mas também em Confins. “Quem vai pagar essa conta é o usuário do aeroporto”, diz Prates, Mas pondera que a situação pode impulsionar uma maior competição entre aeroportos, com redução das taxas cobradas de companhias aéreas com o intuito de atrair mais voos.