O jurista argentino Felix Loñ afirmou que a presidente Cristina Kirchner não pode destituir o presidente do Banco Central por decreto, como o fez hoje. “O presidente do BC tem estabilidade no cargo, não é um ministro, é um funcionário que tem por missão fundamental preservar a moeda”, disse Loñ. Segundo ele, “a demissão de Martín Redrado só pode ser feita se uma comissão da Câmara e do Senado estiver de acordo”. O jurista explicou que o decreto presidencial “é uma norma transitória, que precisa ser aprovada pelo Congresso para que Redrado possa ser demitido pela via legal”.
A deputada Elisa Carrió, da opositora Coalizão Cívica, acusou a presidente de “abuso de poder” pela investida contra o BC, por forçar o uso das reservas para o pagamento da dívida e o financiamento do gasto público. A governista Diana Conti, por sua vez, defendeu a decisão da Casa Rosada como “uma saída para superar a resistência de Redrado em cumprir um decreto com poder de lei”, referindo-se ao polêmico Fundo do Bicentenário, criado em dezembro passado. O decreto de criação do fundo prevê a transferência de US$ 6,5 bilhões das reservas para a conta do Tesouro, com o objetivo de cumprir os serviços da dívida em 2010.
A pressão do governo Kirchner para que Redrado apresentasse sua renúncia começou ontem e durou até o último momento. Contudo, o economista negou-se a atender ao pedido da Casa Rosada, apoiando-se no estatuto do BC, que prevê que o Poder Executivo só pode demitir o titular da instituição mediante aval de uma comissão bicameral. Redrado também alega que a transferência de uma parte das reservas ao Tesouro para pagar dívida pública fere a norma do BC. Em entrevista na manhã desta quinta-feira, ele explicou que “continuava trabalhando para implementar o fundo”.
No BC, os assessores de Redrado detalharam que estudos jurídicos não recomendavam a operação e que as reservas corriam risco de serem embargadas por credores no exterior. Porém, o governo aumentou sua aposta na substituição de Redrado para atingir seu objetivo de usar as reservas. Apesar de Redrado ter suspendido a habitual reunião da diretoria do BC, que é realizada todas as quintas-feiras, os diretores ligados ao governo se reuniram para colocar o fundo em andamento. A reunião foi conduzida pelo vice-presidente da autoridade monetária, Miguel Angel Pesce, nomeado no final da tarde como presidente interino do BC argentino.
Para o ministro de Economia, Amado Boudou, “esse assunto está encerrado e Redrado já não é presidente do BC desde ontem, quando o governo decidiu aceitar sua renúncia”.