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José Alexandre Scheinkman: ‘Previdência, sozinha, não resolve problema fiscal’

O próximo presidente brasileiro terá de fazer mais do que a reforma da Previdência para resolver desafios do País na economia, afirma o economista brasileiro José Alexandre Scheinkman, professor da Universidade de Columbia e professor emérito da Universidade de Princeton. “Precisamos rever todo um sistema de gastos para chegar ao equilíbrio das contas e permitir ao governo fazer o que precisa fazer, como investir em ciência e tecnologia”, diz Scheinkman, em entrevista ao Estado.

Segundo o economista, o enfrentamento da crise fiscal e da baixa produtividade não se dará apenas “cortando um pequeno gasto”. Ele disse ter visto poucas propostas explícitas dos candidatos nesse sentido.

Leia, a seguir, os principais trechos da entrevista.

Quais os desafios econômicos do próximo presidente?

Temos dois tipos de desafios. Um é de curto prazo, que é o balanço fiscal. Chegamos a um ponto em que a combinação de despesas obrigatórias não permite investimentos do governo. Daqui a pouco, nem com investimento zero as contas vão fechar. Resolver o problema fiscal é uma situação de urgência. A segunda questão, de longo prazo, é a do baixo aumento da produtividade, que se traduz no baixo crescimento da renda da população.

Qual é o papel da reforma da Previdência nesse cenário?

A reforma proposta (por Michel Temer) foi substancialmente diluída no Parlamento. Minha impressão é que a reforma perdeu metade da eficácia nesse processo. No mundo inteiro, as idades da aposentadoria foram aumentadas. As pessoas estão vivendo mais tempo e é preciso de uma certa maneira fechar as contas. E há outras questões particulares ao Brasil, como a indexação das pensões ao salário mínimo, que cresce mais do que o custo de vida. No curto prazo, é o único tipo de reforma que se pode implementar.

Mexer na Previdência é suficiente para levar a uma situação fiscal saudável?

Sozinha, não. O crescimento dos gastos e transferências obrigatórias do governo federal aos Estados está deixando muito pouco espaço para investimentos. Precisamos também avaliar os programas nos quais o governo está gastando dinheiro. É algo que a Austrália, por exemplo, faz muito bem. No Brasil, se ouve falar no sucesso de um programa de governo dizendo quanto ele gastou. Mas a medida deveria ser qual é o objetivo do programa e se está sendo atingido.

Quais outras medidas podem ser tomadas?

Temos de imaginar qual a máquina que precisamos para tocar o Estado brasileiro. Há alguns níveis de salários absurdos e privilégios. Nos EUA, só o presidente da Suprema Corte tem um chofer – os outros dirigem os próprios carros. A questão de (auxílio) moradia também não existe. Isso é pequeno em relação aos problemas do Brasil, mas isso dá um certo clima dos gastos.

As isenções tributárias foram um dos fatores para o baixo crescimento da produtividade?

Certamente. Muitos desses incentivos permitiram a expansão de companhias que eram muito boas em lobby. Não quer dizer que a empresa que é melhor em convencer um governador a lhe dar isenção seja aquela mais produtiva. Há um certo encantamento com setores em que o Brasil tem tido um crescimento de produtividade muito baixo, como a indústria de transformação.

Como o País pode avançar no desafio da produtividade?

A economia brasileira é muito fechada. Muitas vezes os ganhos de produtividade vêm de combinações de insumos brasileiros com insumos estrangeiros. E uma economia na qual você protege bens de capital, afeta a produtividade de todos os outros setores. A proteção em si já traz embutida uma força que diminui o crescimento da produtividade. É um problema sério, pois os ganhos de produtividade em indústria são em geral trazidos por novos participantes que tomam o mercado das velhas firmas.

E a questão dos impostos?

Há alguns anos tentei entender o ICMS brasileiro só no Rio de Janeiro, e não consegui. O sistema foi construído pouco a pouco com “essa indústria pediu isso, outra aquilo”. Nesta eleição, houve várias propostas, que acho boas, de substituir todos esses impostos que afetam produção e distribuição, como ICMS, por um só imposto sobre valor agregado, que é um sistema que se usa na Europa.

Das propostas apresentadas pelos candidatos, alguma faz acender sinal de alerta?

Na campanha do Bolsonaro, no começo, o sistema de capitalização estava aparecendo como uma solução mágica para o problema da Previdência. Acho que agora está se admitindo que precisa ser algo com transição. Mas é o tipo da coisa que preocupa, porque a passagem para o sistema de capitalização no curto prazo vai ter um custo fiscal. Do lado do Fernando Haddad, o que me preocupa é diminuir a importância da reforma da Previdência e os ataques à reforma trabalhista.

E o combate à corrupção? Pode ajudar a fomentar o crescimento nos próximos anos?

Os problemas do Brasil estão muito acima disso. O combate à corrupção não é a solução para todos os problemas. Tínhamos um problema seriíssimo de inflação – e resolvê-lo não solucionou todos os problemas. De certa maneira, isso tem um efeito muito maior na economia do que o custo da corrupção. Não vai se resolver tudo só pensando em combate à corrupção. Precisamos trabalhar as instituições, melhorar a qualidade das instituições, decidir o que o governo poderá fazer. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

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