O diretor de Estudos Macroeconômicos do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), João Sicsú, afirmou nesta quarta-feira (4) que o governo pode aumentar os gastos sociais e de investimento ampliando o déficit nominal. Ele afirmou que esse déficit, que no ano passado ficou em 1,5% do Produto Interno Bruto (PIB), pode ser ampliado desde que não supere 3% do PIB. “Um déficit abaixo de 3% do PIB é bastante aceitável”, disse Sicsú que, em nenhum momento, defendeu explicitamente a redução da meta de superávit primário, apesar de argumentar ser a favor da ampliação dos gastos, mesmo em um ambiente em que ele prevê uma queda de arrecadação de R$ 25 bilhões. “Defendo cumprir a regra do superávit primário”, disse, de forma genérica. Superávit primário é a economia que o governo faz para o pagamento dos juros da dívida pública. O Ipea é uma fundação pública federal vinculada à Secretaria de Assuntos Estratégicos da Presidência da República.
Sicsú apresentou hoje uma nota técnica em que defende uma redução gradual da taxa básica de juros (Selic) dos atuais 12,75% ao ano até o nível de 7% ao ano em dezembro. Segundo ele, a medida provocaria uma redução de R$ 30 bilhões na despesa pública com juros. “Neste momento, é importante a administração fiscal responsável. Não podemos cortar gastos sociais e investimentos e devemos cortar os gastos com juros, que têm impacto nulo sobre a geração de emprego, renda e o crescimento econômico”, afirmou.
Ele destacou que os investimentos públicos, naturalmente, são mais lentos porque demandam questões burocráticas e de engenharia e os gastos sociais têm um impacto mais rápido na economia porque se transformam mais rapidamente em consumo das famílias. Ou seja, a estratégia postulada pelo economista é que, a partir de uma redução dos juros, o governo tenha condições, não só de evitar cortes drásticos nas despesas em função da queda de R$ 25 bilhões prevista para a Receita, mas também ampliar essas despesas, o que teria como consequência, na visão dele, um impacto positivo na demanda privada e, por conseguinte, no crescimento do país e na geração de emprego.
Ao ser questionado sobre o impacto que essa redução drástica nos juros teria sobre a inflação, Sicsú refutou a hipótese, explicando que não existe relação direta entre juro e inflação, mas que a relação é entre atividade econômica e inflação. Ele disse acreditar que os juros sozinhos hoje não teriam poder para estimular investimentos e a retomada do crescimento e, portanto, não teria impacto na inflação.
Ele citou como exemplo os casos de países como Estados Unidos e Japão em que, apesar de os juros estarem praticamente zerados, a atividade econômica não está respondendo. De acordo com o economista, neste momento de crise, que avança rapidamente, o juro básico é uma variável importante da política fiscal, ao permitir que o governo faça uma política de gastos para estimular o crescimento, sem que a situação de solvência fiscal seja prejudicada.
“É possível enfrentar a crise de forma contundente, mantendo a responsabilidade orçamentária e contábil, fazendo algo que o mundo inteiro está fazendo: cortando juros”, afirmou Sicsú. “A política ideal, do ponto de vista fiscal, para o enfrentamento da crise é aquela que combina redução da Selic com ampliação de gastos sociais e de investimento”, completou.
Segundo Sicsú, a preocupação agora não é inflação, é o desemprego e, na sua avaliação, se essa política for bem-sucedida e estimular a demanda e o crescimento econômica e, eventualmente, gerar inflação mais à frente, o governo poderá atacar o problema inflacionário, já que a questão do desemprego estará resolvida.