Quase um em cada cinco beneficiários mais pobres do Minha Casa, Minha Vida está com pelo menos uma prestação vencida há mais de três meses do imóvel que recebeu a custo praticamente zero. A inadimplência entre as famílias que ganham até R$ 1,6 mil está em 17,5%, segundo dados obtidos pelo ‘Estado’. O porcentual é muito superior ao registrado nos financiamentos imobiliários de forma geral, nos quais os atrasos acima de 90 dias não superam 2%.
O número de calotes entre os beneficiários com renda mais baixa também é destoante em relação às outras duas faixas de renda de mutuários, cujo porcentual de inadimplência fechou abril em 1,9%.
Das 3,39 milhões de unidades contratadas no programa, 1 milhão são direcionadas às famílias classificadas como faixa 1, cuja renda mensal não ultrapassa R$ 1,6 mil. Sob esse critério, a prestação de cada casa não deve ultrapassar 5% da renda do beneficiário, com valor mínimo de R$ 25 pelo período de dez anos. Se o mutuário pagar R$ 25 por dez anos, terá pago R$ 3 mil em prestações, em valores atuais, por um imóvel com valor que pode chegar a R$ 76 mil. Ou seja, o subsídio pode chegar a 95% do imóvel, bancado com recursos do Orçamento Geral da União (OGU).
De 2009 a 2013, o governo federal desembolsou R$ 73,2 bilhões apenas em subsídios na faixa 1. As famílias inadimplentes também não perdem as casas. O calote é arcado pelo Tesouro Nacional, sem impacto para os bancos públicos do programa – Caixa Econômica Federal e Banco do Brasil.
Flávio Brandão, vice-presidente de Habitação Econômica do Secovi-SP, o sindicato de empresas do setor em São Paulo, afirmou que o nível alto da inadimplência entre os mais pobres do programa é um dos pontos que o setor da construção civil deseja aprimorar na terceira fase do Minha Casa. Ele considera que as condições são “exageradamente favoráveis” para o calote e que falta uma qualificação mais precisa das condições financeiras das famílias.
Depois de anunciar a terceira etapa do programa habitacional, vitrine de sua campanha à reeleição, a presidente Dilma Rousseff recuou da promessa de contratar 3 milhões de casas nos próximos quatro anos e admite aumentar a meta para 4 milhões de imóveis, uma contraproposta à promessa feita ao setor de construção civil pelo presidente do PSD e pré-candidato à Presidência, Eduardo Campos.
As inscrições das famílias beneficiárias da faixa 1 do programa são feitas pelas prefeituras com base nos critérios estipulados pelo governo federal. É possível ser contemplado com a casa mesmo com restrição no CPF, desde que não haja registro no Cadastro de Inadimplentes (Cadin) do governo federal. Nas demais faixas do programa, por se tratar de financiamento, os critérios mais rigorosos inclui a análise do histórico de calotes. “O programa deve ser indutor de bons pagadores, e não deixar espaço para famílias com histórico de maus pagadores”, defende.
Brandão também considera baixo o valor pago pelas famílias. De acordo com ele, o fato de a pessoa não investir mais recursos próprios torna a relação de propriedade menos efetiva. “A casa não pode ser vista como um presente. Às vezes, você ganha um presente e não gosta, devolve, deixa de lado. Agora, tudo o que é obtido com o esforço conjunto da família é mais valorizado”, compara.
Ele sugere que o valor das prestações do imóvel seja calculado de acordo com a disponibilidade de renda das famílias. Um casal sem filhos teria condições de pagar um pouco mais do que uma família maior, exemplifica.
O governo diz que o programa é uma prioridade porque está alinhado com a política habitacional. O Ministério das Cidades informou, em nota, que promove “ações educativas” para orientar os beneficiários a pagar em dia. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.