São Paulo – A elevação da carga tributária sobre o setor elétrico está produzindo um fato raro: a unificação do discurso dos segmentos da cadeia de comercialização de eletricidade, mais dados a embates entre si, contra a utilização das contas de energia elétrica para elevar o nível de arrecadação. É consenso entre os representantes de todas as etapas da cadeia que, depois de terem oferecido a sua cota de sacrifício para a implementação do novo modelo do setor, chegou a hora de os governos federal e estaduais darem sua contribuição para que se atinja a meta de obtenção da sonhada modicidade tarifária.
As estimativas relacionadas à participação da carga tributária no valor final da conta de luz variam de acordo com a fonte. Um estudo da PriceWaterhouseCoopers indica que a carga do setor elétrico poderá elevar-se de 38,18% do valor das contas de luz em 2004 para 41,56% em 2005, caso prosperem algumas iniciativas dos governos federal e estaduais para elevar a arrecadação. Um levantamento mais recente, realizado pela Câmara Americana de Comércio (Amcham), aponta para uma carga tributária de 51% do valor da conta.
Para as companhias, a gota d?água da "sanha arrecadatória" do poder público, como comumente vem sendo tratada a elevação da carga tributária setorial, foi a decisão do Confaz de taxar com o ICMS a energia de baixa renda. A taxação, segundo os agentes, teria efeito de anular em parte os esforços do governo federal de democratizar o acesso de camadas mais pobres da população ao conforto proporcionado pela eletricidade.
É indiscutível que todos os segmentos da cadeia de comercialização de energia elétrica tiveram de abrir mão de parte de privilégios e conquistas na implementação do novo modelo. As geradoras viram os preços definidos pelo leilão de energia existente ficarem abaixo de todas as projeções, o que deverá influir, direta ou indiretamente, nos seus resultados. As distribuidoras tiveram cassada a possibilidade de realizar o self-dealing (autocontratação) de energia elétrica, que havia orientado boa parte dos seus investimentos em produção própria de energia elétrica.
Já as comercializadoras ficaram frustradas com um retrocesso no processo de abertura maior da brecha que permite que clientes cativos das distribuidoras migrem para a sua área de atuação. E até os grandes consumidores industriais vivem um processo de eliminação de subsídios. Mas um argumento inquestionável, que deve ser levado em conta pelos governos em uma necessária revisão do aumento de arrecadação de impostos, taxas e tributos via tarifas de energia, é que quem acaba pagando, direta ou indiretamente, a conta, é o cidadão.