Não é apenas a suspeita de febre aftosa que está assustando os produtores rurais do Paraná. A gripe aviária, que atingiu a Ásia, chegou à Europa e, na semana passada, teve um caso confirmado na Colômbia – porém, causado pelo vírus H9 e não o H5N1, o mais letal – está colocando o Estado em alerta. O Paraná é o maior produtor brasileiro de frangos e também o maior exportador.
De acordo com o chefe da Seção de Sanidade Avícola da Divisão de Defesa Sanitária Animal da Secretaria Estadual de Agricultura e Abastecimento (Seab), Odilon Douat Baptista Filho, desde 2001 o governo federal, as secretarias estaduais e a iniciativa privada vêm discutindo o Programa de Regionalização Sanitária da Avicultura, que prevê padronização de procedimentos sanitários dentro dos estados de cada região. O programa, porém, até hoje não saiu do papel.
"O coordenador desse programa no governo federal saiu e não se colocou outro no lugar. O projeto ficou meio solto, e, como era um programa nacional, a maior parte dos estados não se manifestou", lamentou Douat. A expectativa é que haja alguma definição durante o 19.º Congresso Brasileiro de Avicultura, que acontece nos próximos dias 25, 26 e 27, em Brasília.
"A partir do conhecimento do número de estabelecimentos, da identificação por satélite, é possível fazer o controle sanitário, conhecer o ponto de origem e o destino das aves, fazer desinfecção nas barreiras sanitárias", explicou Douat. "Com isso, diminuiria o impacto econômico e social para o País." A região Sul, lembrou o chefe da Seção de Sanidade Avícola, responde por mais de 80% da produção nacional de frangos. "Se hoje houvesse um problema no Rio Grande do Sul, por exemplo, haveria a interrupção de comercialização em todo o País. Quebraria o setor avícola."
O prejuízo, estima, seria da ordem de R$ 73 bilhões para o Brasil. "O desdobramento da avicultura é muito grande. É uma indústria que vai do produtor, passa pelos fornecedores de ração, de medicamentos, até a industrialização (abatedouros, frigoríficos) e o comércio", comentou.
Se em nível nacional não for tomada medida na prevenção contra a gripe aviária, pelo menos no Paraná a intenção é formar equipes técnicas que atuem diretamente na prevenção da gripe aviária. "A secretaria deve determinar, até o dia 10 de novembro, a reposição das vagas existentes com ênfase em sanidade avícola. Também deve nomear técnicos que vão formar o Grupo de Atendimento Sanitário Emergencial de Aves (similar ao que já existe para o caso de surgimento da febre aftosa, em bovinos)", afirmou.
Para Douat, medidas para se prevenir contra a gripe aviária são imprescindíveis.
"Quando a cepa é forte, virulenta, a mortalidade é alta: de 80% a 100%", afirmou Douat. "Os plantéis de postura comercial, com 300 mil aves, pode de um dia para outro ter 100% dos frangos mortos. E com os pássaros entrando e saindo desse plantel, imagina a quantidade propriedades que as poderiam contaminar", alertou.
A falta de laboratórios preparados para identificar a gripe aviária é outro problema. Em todo o País, existe apenas um laboratório capacitado, localizado em Campinas (SP). No Paraná, um laboratório da Universidade Estadual de Londrina (UEL) está capacitado para identificar a New Casttle, outra doença que ataca o frango. No Paraná, segundo Douat, o monitoramento é feito com o laboratório de Campinas desde 2003.
Mais suscetíveis
O médico veterinário homeopata Raymundo Araújo Filho, especialista em controle de zoonoses, também chamou a atenção para o efeito avassalador da gripe aviária. ?O vírus se transmite pelo vento e, quando os frangos estão confinados, não mata não só um, mas 70% a 80%?, disse. Segundo ele, são os frangos criados industrialmente os mais suscetíveis à doença. ?Há um espaço de menos de 20 centímetros quadrados por ave, e são criadas com antibióticos, com alimentos perniciosos. Assim, eles ficam fracos, estressados e mais suscetíveis a doenças?, apontou. Para o veterinário, não é o caso de acabar com a criação industrial, mas introduzir produtos naturais tanto nos medicamentos como na alimentação. ?Insumos naturais vão fazer com que os animais resistam mais?, disse.
Cuidados estão sendo tomados
O presidente do Sindicato das Indústrias de Produtos Avícolas do Estado do Paraná (Sindiavipar), Domingos Martins, afirmou que todos os cuidados estão sendo tomados na região. "Nossa preocupação é que o vírus venha de outras localidades", disse. Segundo ele, as granjas do Paraná são bem localizadas, longe das aves silvestres e exóticas (hospedeiros do vírus H5N1). Também houve o plantio de eucaliptos, que funcionam como barreiras naturais, e proibição de visita de qualquer pessoa que não seja do meio. "O dever de casa está sendo bem feito. Não podemos correr qualquer risco", disse. "Esperamos que, em nível brasileiro, os mesmos cuidados estejam sendo tomados."
A produção de frango de corte paranaense fechou o mês de setembro com a produção de 86.576.995 cabeças, registrando aumento de 7.68% em comparação a setembro do ano passado. Em setembro, pela primeira vez, o setor superou a barreira dos US$ 100 milhões em vendas. O faturamento do setor chegou a US$ 101.147.121,00, um aumento de 42,04% em relação ao mesmo período do ano passado. Foram exportados 77.832.295 kg no mês passado. (LS)
Vírus pode chegar despercebido
Bem ao contrário do esperado, a gripe aviária pode chegar ao Brasil de forma despercebida e silenciosamente. O alerta é do pesquisador Edir Nepomuceno da Silva, professor titular da Faculdade de Engenharia de Alimentos da Unicamp e integrante da Diretoria Executiva da Facta – Fundação Apinco de Ciência e Tecnologia Avícolas. "Em se tratando de Influenza Aviária, alguns dizem que a questão é ‘quando’ e não ‘se’ vai chegar ao Brasil. Com essa expectativa, a Defesa Sanitária Animal coloca-se de prontidão, o plano de contingência é estabelecido e todos ficam à espera do aparecimento de um quadro devastador da doença, com mortalidade elevada e sintomatologia típica", comentou. "Engano. O inimigo (vírus) pode chegar sorrateiramente, sem nenhum alarde, até disfarçado sob o manto de qualquer outra doença respiratória que atinge as aves rotineiramente, com sintomas leves. E aí é que reside o perigo, pois o inimigo pode passar despercebido", acrescentou.
O professor lembrou que, em muito países, os primeiros surtos apareceram desta maneira, numa forma de baixa letalidade. "Com o tempo (que pode chegar a um ano), o vírus se multiplicou, se espalhou e, pior, mutou para a forma mais virulenta e mais difícil de ser controlada. É preciso ter esta situação em mente e trabalhar com toda a estrutura de vigilância e diagnóstico avícola disponível no País", alertou.
A sugestão do professor é que o governo produza ou importe antígenos e os distribua inativados a laboratórios credenciados.