O surto de febre aftosa no Mato Grosso do Sul e a suspeita da doença no Paraná, que estão gerando prejuízos incalculáveis em toda a cadeia produtiva e industrial, podem ser agravados na semana que vem. Fiscais federais agropecuários do Ministério da Agricultura e Pecuária ameaçam entrar em greve a partir da próxima segunda-feira, dia 7. A paralisação está prevista para durar sete dias, mas pode se prorrogar se não houver acordo com o governo federal.
A categoria é responsável pela fiscalização de zoonoses como a gripe aviária e a febre aftosa dentro do território nacional. Além disso, encarrega-se do Serviço de Inspeção Federal (SIF), que certifica os produtos agropecuários que entram e saem do Brasil.
?Se essa greve se concretizar, o maior prejuízo será a imagem do Brasil lá fora, a exposição da imagem crítica que estamos vivendo?, analisou o assessor econômico do Sindicato da Indústria de Carnes e Derivados no Estado do Paraná (Sindicarnes-PR), Gustavo Fanaya. Segundo ele, a expectativa é que não haja adesão integral dos fiscais que atuam nos frigoríficos. ?Isso inviabilizaria todo o processo das empresas?, afirmou.
No Paraná, segundo Fanaya, há cerca de 37 estabelecimentos (frigoríficos) de carne bovina com Serviço de Inspeção Federal, 35 estabelecimentos de carne suína, mais de 50 de carne avícola. ?Fora os laticínios, que somam mais de 70?, observou. Fanaya lembrou que nesses locais não pode haver abate sem a presença de um fiscal federal, que assina os laudos e bate o carimbo do SIF. ?Se for necessário, teremos que entrar na Justiça e pedir para que uma pessoa habilitada possa desempenhar esta função. Caso contrário, o frigorífico pára?, afirmou. Para Fanaya, a expectativa é que o governo federal feche acordo com a categoria. No País, há cerca de 4,5 mil fiscais federais agropecuários na ativa, aproximadamente 230 no Paraná.
Sem prejuízos
De acordo com o fiscal federal agropecuário Alexandre Bastos, o objetivo da paralisação não é agravar a crise da febre aftosa, instalada no País há quase um mês. ?Pelo contrário. Aqueles que estão atuando no combate e prevenção da febre aftosa e da gripe aviária vão continuar trabalhando. E nos colocamos à disposição do superintendente, caso surja alguma questão emergencial?, afirmou. ?No que for preciso, a gente vai estar colaborando?, garantiu.
A pauta de reivindicações da categoria inclui o pedido de descontingenciamento de recursos, maior programa orçamentário para 2006, criação de escola de capacitação permanente na área de fiscalização agropecuária, realização de novo concurso público e valorização do fiscal – que inclui reajuste salarial. O salário inicial da categoria é de R$ 2,6 mil. No Paraná, a expectativa é que a adesão seja de 90%.
De 106 amostras, 18 apresentaram reação para vírus
Das 106 amostras de sangue colhidas no gado suspeito de febre aftosa no Paraná, 18 apresentaram reação positiva para o vírus. Os resultados, parciais e inconclusivos, foram divulgados ontem pela Secretaria Estadual de Agricultura e Abastecimento. Na terça-feira, durante o lançamento da segunda etapa da campanha de vacinação contra a aftosa, o vice-governador e secretário da Agricultura, Orlando Pessuti, havia anunciado que os resultados eram inconclusivos, mas ele não detalhou os dados.
Conforme nota técnica divulgada ontem, das 106 amostras colhidas, 16 apresentaram reação positiva ao Elisa 3ABC e duas ao EITB. O material analisado foi o sorológico, que já havia sido mandado para o Laboratório Nacional da Agricultura (Lanagro), em Belém do Pará, no último dia 21. Ao todo, foram analisados materiais de 19 animais suspeitos de quatro propriedades, localizadas em Grande Rios, Amaporã, Maringá e Loanda.
Na última segunda-feira, o ministro Roberto Rodrigues (Agricultura) afirmou que os exames realizados no gado do Paraná estavam mostrando que não haveria a doença no Estado. De acordo com a secretaria, os resultados dos exames EITB e Elisa 3ABC ?ainda não oferecem informações suficientes para diagnóstico conclusivo das suspeitas, pelas quais se aguardam os demais resultados?.
A conclusão definitiva sobre a existência da doença no rebanho paranaense só deverá ser conhecida neste fim de semana, quando devem ficar prontas as provas de isolamento viral.
Lista
Na última terça-feira, o Ministério da Agricultura publicou no Diário Oficial da União uma lista de 41 municípios considerados área de risco de contaminação de febre aftosa – entre elas, 36 do Paraná. Essas cidades não poderão permitir a saída de animais suscetíveis à doença nem a venda de produtos e subprodutos como a carne.
Até o momento, 47 países oficializaram embargos totais ou parciais à carne brasileira devido à contaminação do gado pela aftosa. O ministro Roberto Rodrigues estimou em US$ 1,7 bilhão o prejuízo para o Brasil durante os seis meses estimados para a duração do embargo. (Lyrian Saiki e agências)
Doença traz retrocesso econômico ao País
O vice-presidente da Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA), Omero Alves Pereira, discordou, ontem, da afirmação do ministro da Agricultura sobre o compartilhamento de responsabilidades em relação à ocorrência da febre aftosa no país.
O ministro Roberto Rodrigues considerou que houve um ?relaxamento geral de todos? que propiciou o surgimento dos focos. Mas, para Omero Pereira, também presidente da Federação da Agricultura e Pecuária do Mato Grosso (Femato), essa generalização é um equívoco.
Retrocesso econômico
A febre aftosa pôs o Brasil em situação de ?retrocesso?, segundo afirma o presidente do Conselho Nacional de Pecuária de Corte, Sebastião Guedes. O Brasil é ainda, segundo ele, o maior exportador de carne bovina do mundo. Ontem, Guedes se encontrou com o ministro da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, Roberto Rodrigues, para discutir medidas relacionadas ao controle da febre aftosa no país.
?Vejo danos à política de exportação do Brasil. Esse problema nos trouxe retrocesso e vai atrasar a nossa entrada em mercados de alto preço, nos quais o país vinha se desenvolvendo para introduzir a carne brasileira, como o Japão e os Estados Unidos, bem como em países do sudeste asiático.?
Mato Grosso do Sul tem 21 focos
O estado do Mato Grosso do Sul tem 21 focos de febre aftosa, todos localizados na área de risco sanitário, interditada desde que foi detectado o primeiro caso no país neste ano. A chamada ?área tampão? engloba os municípios de Eldorado, Mundo Novo, Japorã, Itaquiraí e Iguatemi e tem um raio de 25 quilômetros.
Imunização total
A campanha de vacinação compulsória da Secretaria de Agricultura do Estado do Rio de Janeiro, que começou ontem e vai até o dia 30 de novembro, vai imunizar contra a febre aftosa os bois e vacas criados em terrenos baldios ou amarrados por cordas próximo a estradas do Rio de Janeiro. A expectativa, segundo o secretário estadual de Agricultura, Christino Áureo, é vacinar cerca de 40 mil animais no entorno da região metropolitana, o que representa 2% do gado cadastrado no Rio, que soma 2 milhões de cabeças.
Sindicato quer garantir trânsito avícola
O Sindicato das Indústrias de Produtos Avícolas do Estado do Paraná (Sindiavipar) ingressou ontem na Justiça contra os estados de São Paulo e Rio Grande do Sul. O objetivo é garantir o trânsito de aves abatidas, ovos férteis e pintos de um dia destinados a estes dois estados brasileiros, assim como as cargas destinadas à exportação via portos localizados nestes estados.
O presidente do Sindiavipar, Domingos Martins, informa que a entidade decidiu impetrar mandados de segurança contra estas unidades federativas em razão das dificuldades encontradas pela indústria avícola local para enviar cargas para estes estados. SP e RS instalaram barreiras sanitárias e têm impedido o trânsito de subprodutos avícolas desde o surgimento das suspeitas de febre aftosa no Paraná, há cerca de 10 dias.
Para Martins, a falta de bom-senso por parte das autoridades de SP e RS está tumultuando a atividade da avicultura paranaense, que começa a sofrer danos patrimoniais e de imagem. O presidente do Sindiavipar destaca que a ação dos paulistas e gaúchos se caracteriza como abuso do poder, cujos danos podem ser cobrados judicialmente em um segundo momento.
A avicultura paranaense é a maior do Brasil, respondendo por cerca de 26% do total de frangos de corte produzidos no país, sendo responsável por cerca de 50 mil empregos diretos e mais de 500 mil indiretos.
Mais um município pode decretar estado de emergência
Os municípios paranaenses de Amaporã e Grandes Rios declararam estado de emergência por causa da suspeita de febre aftosa. Amaporã, no Noroeste, baixou decreto com a decisão na terça-feira (1) e Grandes Rios, no Norte, deverá oficializar a medida hoje. Se for comprovada a presença da aftosa no Estado, 29 municípios da região Noroeste do Estado poderão adotar a mesma medida.
?Foi uma atitude preventiva?, justificou a prefeita de Amaporã, Terezinha Fumiko Yamakawa. Ela disse não saber avaliar quanto o município – com pouco menos de 5 mil habitantes e orçamento anual de R$ 6 milhões – já perdeu desde que foi decretado seu isolamento sanitário, em 21 de outubro. Mas, observou, ?os prejuízos são grandes, muito grandes?.
A pecuária é a principal atividade econômica de Amaporã. Os produtores de leite estão jogando fora 19 mil litros diariamente por causa da proibição de comercializar o produto. Já Grandes Rios – 10 mil habitantes e orçamento de R$ 6 milhões – está deixando de comercializar 30 mil litros de leite diariamente.
O prefeito de Loanda, no Noroeste, deverá repassar para a Associação dos Municípios do Noroeste do Paraná (Amunpar) a decisão de decretar o estado de emergência. ?Se fizermos isto em conjunto, teremos mais força?, afirmou Álvaro Freitas Neto, que espera que a medida seja oficializada na próxima segunda-feira.
O presidente da Amunpar e prefeito de Terra Rica, Mario Luiz Lanziani, ressalvou que o estado de emergência somente será decretado em toda a região se for constatada a aftosa – hipótese que todos os exames descartaram, até o momento. A Amunpar reúne 29 municípios e contabiliza um rebanho de 1 milhão de bovinos.