Prevendo uma derrota histórica no Congresso Nacional, o governo desistiu de aprovar a MP 232, que ampliava a carga tributária para empresas prestadoras de serviço. A medida contava com forte resistência de entidades empresariais e associações de classe. Acontece que a medida provisória também corrigiu a tabela do Imposto de Renda Pessoa Física em 10% desde janeiro de 2005. Sem a MP 232, o contribuinte deverá voltar a ter retido na fonte mais imposto já em abril. Com isso, o limite de isenção do IR cai dos atuais R$ 1.164 para R$ 1.058.
O deputado Carlito Merss (PT-SC), relator da MP 232, disse que seu parecer seria pela rejeição integral do texto apresentado pelo governo. ?Não há condição de aprovar a MP. Nesse sentido, a minha intenção é fazer um relatório simples e sucinto pela rejeição total da MP?, afirmou o deputado. Como há consenso entre líderes partidários da base aliada para aprovar o relatório de Merss, a MP deve ser mesmo derrubada.
Estratégia futura
O relator disse não saber o que o governo fará em relação à correção da tabela do IR. O ministro Aldo Rebelo (Coordenação Política) acertou com os líderes partidários que seria negociado um projeto de lei substitutivo – a ser apresentado dentro dos próximos 15 dias – e que tramitaria em regime de urgência.
Nesse novo texto, o governo deverá tentar incluir ao menos parte das mudanças previstas na MP 232 relativas às empresas prestadoras de serviço. O texto original previa o aumento de 32% para 40% da base de cálculo do IR e da CSLL (Contribuição Social sobre o Lucro Líquido) para empresas que optarem pelo pagamento com base no lucro presumido.
Depois de obtido um acordo, o governo aceitaria incluir no texto a correção da tabela do IR.
Palocci
Ao comentar a MP 232, o ministro da Fazenda, Antônio Palocci, disse apenas que não é seu papel ?definir procedimentos de votação? da Câmara e do Senado. ?Meu papel é discutir conteúdo e avançar num acordo com a Câmara e o Senado, o papel de definir procedimentos de votação não é do Ministério da Fazenda?, afirmou ele.
?(A retirada) é um procedimento de ordem política que a Câmara vai tratar. E no governo quem trata desses procedimentos é o ministro Aldo (Rebelo, da Coordenação Política).?
Alguns pontos já estavam certos para modificação
O governo já havia decidido modificar alguns pontos da MP para garantir a aprovação da matéria na Câmara. O esforço, no entanto, não foi suficiente. Entre as modificações já aceitas pelo Executivo está o fim do limite de R$ 50 mil para que as multas sejam negociadas no Conselho do Contribuinte em decisões desfavoráveis da Receita Federal, como forma de atender à reivindicação dos empresários de simplificar os mecanismos de cobrança de pequenas multas firmadas com a Receita. Em contrapartida, a MP daria poderes para que os conselhos criem mecanismos simplificados para cobrar pequenas multas.
Outra mudança era o aumento da base do cálculo da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL) de 32% para 40% nas empresas prestadoras de serviços. As empresas que gerassem mais empregos seriam beneficiadas com redução na base de cálculo. Na prática, a empresa que gastasse a partir de 20% do seu faturamento com pagamento de folha de pessoal, continuaria com a base de cálculo em 32%. Entre os limites de 32% e 40%, a redução da incidência do aumento poderia variar em 1% para cada 1% do faturamento gasto com folha de pessoal.
Tabela
O presidente da Fiesp (Federação das Indústrias do Estado de São Paulo), Paulo Skaf, defendeu que seja mantida a correção de 10% na tabela do Imposto de Renda, apesar de o governo ter desistido de aprovar a MP 232 no Congresso . ?Essa MP nasceu para trazer a correção da tabela do Imposto de Renda. O resto veio de carona e de forma errada?, disse.
O texto original da MP previa também o aumento de 32% para 40% da base de cálculo do IR e da CSLL (Contribuição Social sobre o Lucro Líquido) para empresas que optarem pelo pagamento com base no lucro presumido, principal crítica do setor produtivo.
Segundo Skaf, se o governo manter a correção da tabela, terá o aplauso do setor industrial.
Sem a MP 232, o contribuinte poderá voltar a ter retido na fonte mais imposto já em abril. Com isso, o limite de isenção do IR cai dos atuais R$ 1.164 para R$ 1.058 – o mesmo do ano passado.
Questionado se a retirada da MP não seria um reconhecimento de derrota do governo, Skaf afirmou que ?não é importante se falar em vitória ou derrota?.
Novo projeto corrigindo tabela deve sair em 15 dias
O governo se comprometeu a enviar, no prazo de 15 dias, um projeto de lei em caráter de urgência para garantir a correção da tabela do Imposto de Renda em 10%. A decisão da base governista de votar contra a Medida Provisória 232, que aumenta a carga tributária para prestadores de serviços, retoma a tabela do Imposto de Renda aos níveis de 2004, com o limite de isenção em R$ 1.058.
O líder do governo na Câmara dos Deputados, Arlindo Chinaglia (PT – SP), disse que o texto pode garantir o benefício retroativo à data da rejeição da MP, mas vai criar mecanismos para compensar essas perdas com elevação de tributos. Caso contrário, os contribuintes terão um prejuízo, contabilizado entre a data de rejeição e a data em que os deputados aprovarem o projeto de lei. Nesse meio tempo, haverá aumento de imposto.
?Nós da base temos uma decisão de votar contra a MP e derrotá-la para criar condições de tempo e políticas para corrigir a tabela e achar compensações?, disse Chinaglia. ?Se não tomássemos essa decisão, a medida provisória seria derrotada pela oposição?, completou.
Com a rejeição da MP, a base governista tenta jogar para a oposição o ônus da extinção – mesmo que temporária – da nova tabela do IR, com limite de isenção de R$ 1.164. ?Os mais radicais da oposição estão felizes, mas na política há ônus e bônus. E esse ônus (o fim da correção) fica com a oposição?, afirmou Carlito Merss (PT – SC), relator da MP.
Coesão
Chinaglia afirmou que a decisão de retirar a MP da pauta estava em discussão desde a quinta-feira passada. Levar o texto à votação poderia dividir ainda mais a base aliada, o pior cenário para os líderes depois da suspensão da reforma ministerial. ?Eu disse que nós não entraríamos divididos ou para sermos derrotados?, afirmou. A decisão de retirar o texto serve, de acordo com ele, como uma tentativa de unir os partidos aliados. ?A base precisava desse protagonismo político?, disse.
Severino
O presidente da Câmara, Severino Cavalcanti (PP-PE), disse não ser o único vitorioso com a rejeição da MP. Ele afirmou que interpretou um desejo da sociedade. ?Ninguém faz sozinho as coisas. Foi uma vitória da sociedade. Eu interpretei o desejo da sociedade?, afirmou.
Entidades empresariais do PR comemoram
Entidades empresariais do Paraná receberam com entusiasmo a notícia de que o governo federal desistiu de aprovar a MP 232, que ampliava a carga tributária para empresas prestadoras de serviço. ?Felizmente, o governo tirou da pauta do Congresso mais um ônus que pesaria sobre o setor produtivo. Mas também levou o bônus, que era a correção da tabela do Imposto de Renda, a única boa notícia no campo fiscal que o País teve nos últimos anos?, avaliou o vice-presidente do Sistema Federação das Indústrias do Estado do Paraná (Fiep), Arthur Carlos Peralta Neto.
Para ele, o texto atual da MP 232 somente reforça a política da União de ampliar a carga tributária. ?O governo não percebe o impacto que provoca com os aumentos de tributos, principalmente quando a elevação é baseada apenas em dados estatísticos e estimativas?, afirmou.
?A suspensão da Medida Provisória 232 é uma vitória da democracia, vitória da população quanto à sua capacidade de dizer não ao aumento de impostos e a uma política econômica exclusivamente preocupada com a arrecadação e indiferente à melhoria de vida das pessoas e expansão das atividades?, apontou o presidente do Conselho Regional de Contabilidade no Paraná (CRCPR), Maurício Fernando Cunha Smijtink.
O presidente do Sistema Fecomércio (Federação do Comércio no Paraná), Darci Piana, também comemorou a decisão. ?É um reconhecimento por parte do governo de que era muito grande o aumento de impostos de uma só vez?, afirmou Piana. Para ele, depois das derrotas do governo federal – a vitória de Severino Cavalcanti na Câmara de Deputados foi uma das principais -, toda vez que o governo decidir aumentar a carga tributária será pressionado. ?Cada vez mais a sociedade irá se organizar na tentativa de sensibilizar o governo, até ele recuar?, comentou.
Imposto de Renda
Para a advogada tributarista Isabel Cristina Szulczewski, da Pactum Consultoria, a decisão do governo foi puramente política. ?Seria mais uma derrota do governo Lula?, apontou. Segundo ela, a urgência agora é criar um mecanismo que corrija logo a tabela do Imposto de Renda.
?O problema maior é que devem corrigir a tabela em 10%, quando o correto seria corrigi-la em 30%, para compensar as perdas inflacionárias dos trabalhadores?, afirmou. Segundo ela, sindicatos e outras organizações devem se mobilizar e pedir urgência na tabela de correção. ?Salário não é renda, é uma remuneração da prestação de serviços?, salientou. (Lyrian Saiki)
Centrais sindicais cobram compromisso do governo
As centrais sindicais vão continuar cobrando do governo a correção da tabela de Imposto de Renda. A correção de 10%, negociada no final do ano passado, constava da MP (medida provisória) 232, que deve ser retirada de pauta.
Segundo a CUT, o governo e o Congresso Nacional têm que cumprir o compromisso assumido em 2004 de corrigir a tabela de IR. ?Lembramos do compromisso do presidente Lula em corrigir a tabela do IR com a inflação correspondente a seus quatro anos de mandato?, diz nota oficial divulgada pela CUT.
Para o Sindicato dos Metalúrgicos de São Paulo, ligado à Força Sindical, a correção da tabela de IR precisa ser mantida para não prejudicar os trabalhadores. ?Caso isso aconteça, o governo federal estará rompendo o acordo feito com as centrais sindicais no final do ano passado?, informa a entidade.
Paulo Pereira da Silva, o Paulinho, também cobra o compromisso do governo. ?O governo precisa honrar o prometido e cumprir o acordo com as centrais sindicais de manter a correção da tabela do Imposto de Renda.?
Para ele, é ?inaceitável? que o governo ainda não tenha demonstrado de ?forma convincente se irá honrar o acordo com as centrais sindicais?.
OAB
O presidente nacional da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil), Roberto Busato, espera que o governo encontre uma forma de corrigir a tabela de IR sem onerar o contribuinte.
?A derrota da medida provisória não resulta de uma simples decisão política, nem foi acertada em gabinetes. Ela foi articulada nas ruas, a partir das discussões dos diversos setores produtivos do País e do contribuinte, que não consegue suportar mais o peso da exorbitante carga tributária brasileira?, diz Busato em nota oficial.
Segundo ele, a edição dessa MP deu uma lição ao governo. ?Editar medida provisória, exceto nos casos rigorosamente definidos na Constituição, no mínimo revela um gesto autoritário, sobretudo quando seus efeitos atingem a todos, de trabalhadores a empresários, indistintamente.?
Contribuinte vai pagar R$ 42 a mais de IR por mês
Sem a correção de 10% da tabela do Imposto de Renda, o contribuinte passará a recolher até R$ 42,28 a mais de Imposto de Renda por mês, segundo cálculos do IBPT (Instituto Brasileiro de Planejamento Tributário). Esse valor vale para quem ganha a partir de R$ 2.500 por mês.
Com a correção da tabela do IR, esse contribuinte estava recolhendo mensalmente um imposto de R$ 222,15. Sem a correção da tabela, o mesmo contribuinte passará a recolher um imposto mensal de R$ 264,43, ou seja, uma diferença de R$ 42,28.
Para quem ganha menos de R$ 2.500 por mês, a perda mensal será menor. Um trabalhador com renda mensal de R$ 1.500 por mês, por exemplo, paga R$ 50,40 com a correção da tabela de 10%. Sem a correção, o IR retido mensalmente subirá para R$ 66,30. Sua perda, portanto, é de R$ 15,90.
Mudanças
Com a retirada da correção da tabela de IR, o contribuinte passará a pagar mais imposto neste ano do que no final de 2004. É que no segundo semestre de 2004, o contribuinte contava com um redutor de R$ 100 no cálculo do imposto devido.
Esse redutor – instituído em agosto de 2004 – gerava um ganho para o contribuinte de R$ 15 ou de R$ 27,50, de acordo com a alíquota da faixa de contribuição: R$ 15 para quem paga 15% de IR e R$ 27,50 para quem tem descontados 27,5% sobre o rendimento.
Sem o redutor e sem a correção da tabela, o contribuinte volta a pagar o mesmo IR do começo de 2004.
A tabela de IR está congelada desde 1996, com exceção de 2002, quando foi corrigida em 17,5%. A correção de 10% estava prevista na MP rejeitada no Congresso por vontade do governo.
Severino diz que quem ganhou foi a sociedade
Depois de se reunir com os líderes dos partidos, o presidente da Câmara, Severino Cavalcanti (PP-PE), foi para o plenário Nereu Ramos comemorar a decisão do governo de rejeitar a Medida Provisória 232 com empresários e sindicalistas. Na saída, disse que o governo se curvou ao apelo e à pressão da sociedade.
?Quem tem idéia fixa é doido?, disse Severino. Indagado se estava dizendo que o governo era doido, respondeu que seria doido se não tivesse desistido da MP.
?Não está doido porque atendeu. Se não tivesse atendido, era doido.?
Severino disse ainda que o projeto de lei que corrigirá a tabela do Imposto de Renda vai tramitar em regime de ?urgência urgentíssima? na Câmara, mas mandou um aviso ao governo: ?Se tiver outro imposto embutido, aí será outra luta?.
O presidente da Câmara pediu o apoio dos empresários para reagirem às ?críticas sórdidas da imprensa? que estariam sendo feitas aos deputados por causa de medidas como o aumento da verba parlamentar. Severino bateu nas costas do presidente da Associação Comercial de São Paulo, Afif Domingues, e pediu:
?Só quero que você me ajude porque tenho levado muito cacete. Eu tenho muita história pra contar. Diziam que iam pedir o meu impeachment, mas hoje (ontem) eu fui unanimidade na reunião dos líderes. Todas as críticas que quiserem fazer, façam que o Severino agüenta?, disse o presidente da Câmara.