O governo se prepara para ceder às empresas em mais um ponto, na batalha para tornar viável o programa de concessões em infraestrutura.
Está em análise a possibilidade de incluir, nos contratos, uma margem financeira chamada de “contingência” que servirá para cobrir gastos imprevistos no projeto. Essa margem ficaria embutida no preço, disse ao Estado o ministro dos Transportes, César Borges. Mas a aceitação do mecanismo depende do sinal verde do Tribunal de Contas da União (TCU).
Se uma concessionária arremata uma rodovia no leilão e, nas obras de duplicação, descobre um sítio arqueológico, isso vai exigir estudos e, eventualmente, medidas compensatórias, o que vai atrasar a execução e a cobrança de pedágio. Assim, a tarifa que a concessionária se comprometeu a cobrar no leilão não dará mais o retorno originalmente previsto. A margem cobriria esse risco.
“Se o projeto tiver todo o detalhamento necessário, vai diminuindo o grau de incerteza e o valor que está na contingência”, explicou Borges. “Se vai para uma região alagadiça, como a Região Amazônica, aí seu grau de incerteza aumenta.”
Software
O Departamento Nacional de Infraestrutura de Transporte (Dnit) até comprou um software que calcula essa margem. A contingência já vem sendo aceita nas contratações pelo Regime de Contratação Diferenciada (RDC) integrado. Isso porque nesse tipo de contrato a construtora se compromete a fazer o projeto e a obra, e se houver erro no planejamento ela não pode pedir para elevar o valor (aditivo), como nas licitações tradicionais, feitas com base na Lei 8.666, de 1993.
“Se o Dnit aceita a contingência no RDC, o governo deveria aceitá-la nas concessões”, disse o presidente do Sindicato Nacional da Indústria da Construção Pesada (Sinicon), Rodolpho Tourinho. “A natureza é a mesma, por que o tratamento é diferente?” Ele disse que vem conversando sobre o assunto com a Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT).
Restrição
A área técnica do governo, porém, não vê a proposta com simpatia. A avaliação é que a margem de contingência elevaria as tarifas. Além disso, o risco alegado pelos potenciais investidores já teria sido coberto quando o governo concordou em elevar a Taxa Interna de Retorno (TIR) de 5,5% para 7,2%.
As empreiteiras querem pelo menos mais duas alterações nas regras dos leilões de rodovias. “São questões muito técnicas”, informou o presidente do Sinicon. Segundo ele, a elevação da TIR foi “satisfatória” e o governo avançou bastante na estruturação financeira das operações.
Quadro preocupante. Mas a rentabilidade segue como o problema central do programa de logística. “É preciso melhorar a rentabilidade dos projetos em geral”, disse o presidente da Associação Brasileira de Infraestrutura e Indústrias de Base (Abdib), Paulo Godoy. O problema não afeta só rodovias e ferrovias, mas também o setor elétrico. “O último leilão foi muito ruim, o quadro é preocupante.”
Para Godoy, o programa de logística envolve valores “altíssimos” e o desafio é atrair poupança interna e externa para financiá-los. Sem rentabilidade adequada, isso dificilmente ocorrerá. “É estabelecer um padrão justo e deixar o mercado decidir”, defendeu. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.