A equipe econômica conta com uma trégua no mercado de câmbio para segurar a dívida líqüida do setor público num patamar equivalente a, no máximo, 60% de tudo o que é produzido no País, o Produto Interno Bruto (PIB) no final deste ano. Em setembro, a desvalorização de quase 29% da taxa de câmbio fez a dívida subir R$ 110 bilhões, chegando a cerca de R$ 894 bilhões, 66% do PIB. Um valor recorde. ?Não se imagina que o câmbio se depreciará muito mais do que R$ 3,89?, destaca uma fonte do Banco Central, referindo-se à taxa média do último dia de setembro.
Ainda assim, os R$ 3,89 da segunda-feira deixaram estragos. O governo não conseguirá cumprir a meta fixada no novo acordo com o Fundo Monetário Internacional (FMI) de registrar um saldo de R$ 810 bilhões no final de setembro. Apesar de não prejudicar a liberação dos recursos do Fundo, o descumprimento dessa meta é uma sinalização ruim para o mercado e vem num momento de grande ansiedade, entre outras coisas, por causa da reta final do processo eleitoral.
E, nesse clima de insegurança e indefinições, o governo terá que rolar nada menos do que R$ 86,32 bilhões em títulos, entre outubro e dezembro deste ano. Desse total, R$ 26,6 bilhões são papéis atrelados ao câmbio, R$ 32,1 bilhões são títulos cuja remuneração é definida com base na taxa de juros do dia do vencimento (pós-fixados) e R$ 27,6 bilhões são com taxas previamente estabelecidas (prefixados).
Para o diretor de Política Monetária do BC, Luiz Fernando Figueiredo, os rumores de que o País pode vir a ter problemas para administrar a sua dívida pública e, como conseqüência, teria de suspender pagamentos não têm cabimento. Ele argumenta que o Tesouro tem caixa para, na pior das hipóteses, resgatar todos os papéis que vencem no período. ?O Tesouro está mantendo a sua folga de caixa e está numa posição bastante confortável?, diz.
Mas, ainda assim, na avaliação de analistas do mercado financeiro, a elevação brutal cria um clima de insegurança e exigirá que o presidente eleito influencie no processo de administração da dívida muito antes de tomar posse. ?O mercado estará à espera da definição dos nomes do novo ministro da Fazenda e do presidente do BC, para avaliar qual será o rumo da economia?, afirma a economista Sandra Utsumi, do BES Investimento. A cobrança do mercado estará refletida nos leilões de rolagem da dívida.
Nos primeiros três meses do ano que vem, os vencimentos de títulos programados dobraram. Em janeiro, o governo projetava pagamentos da ordem de R$ 15,1 bilhões entre janeiro e março de 2003. No mês passado, os cálculos do BC apontaram vencimentos de R$ 32 bilhões. O segundo trimestre será ainda pior: os vencimentos somam R$ 74 bilhões contra R$ 50 bilhões anteriormente. Do total previsto para os primeiros seis meses de mandato do novo presidente, a maior parte é de títulos pós-fixados, R$ 69,7 bilhões. Os títulos cambiais somam R$ 25,2 bilhões e os prefixados, R$ 11,5 bilhões.
?Já se esperava que esses pagamentos aumentassem por causa da rolagem dos papéis de prazo mais curto, que foram vencendo ao longo do ano e substituídos por outros também de prazo menor. A crise financeira contribuiu para elevar o montante ainda mais?, afirma o economista Júlio Callegari, da consultoria Tendências. Segundo ele, essa situação vai exigir do novo presidente muita habilidade para dissipar tensões num momento de grande ansiedade. ?A definição rápida, por exemplo, dos substitutos de Malan e de Fraga podem aliviar esse cenário.?