O ministro da Fazenda, Antônio Palocci, mesmo pressionado por empresários e parlamentares, descartou rever a decisão de aumentar a contribuição previdenciária de empresas para pagar a dívida de R$ 12,3 bilhões do governo com aposentados. Na última sexta-feira, o ministro Amir Lando (Previdência) anunciou o aumento da contribuição das empresas à Previdência, que passaria de 20% para 20,6% da folha de pagamento.
A medida foi criticada por empresários. O presidente da CNI (Confederação Nacional da Indústria), Armando Monteiro Neto, disse que a elevação do tributo contribuiria para aumentar a informalidade do mercado de trabalho – a nova alíquota incide sobre a folha de pagamento dos trabalhadores formais.
No domingo foi a vez do presidente da Câmara, João Paulo Cunha (PT-SP), demonstrar descontentamento com a medida. Segundo ele, o “aumento de impostos é um erro político”. “A Câmara não ficará confortável votando isso”, disse ele, sugerindo que o governo busque uma medida mais “criativa”.
Palocci, entretanto, mostrou firmeza e disse que o governo não deve desistir porque precisa de recursos para arcar com a dívida da Previdência. “Você não tem muitas outras opções. Poderia aumentar um outro imposto, o que não mudaria muita coisa”, disse o ministro.
A dívida de R$ 12,3 bilhões existe porque a Justiça entendeu que as 1,88 milhão de pessoas que se aposentaram entre março de 1994 e fevereiro de 1997 têm direito a um correção de até 39,67% no benefício. Além do passivo, o governo também vai precisar de R$ 2,3 bilhões por ano para pagar a correção daqui em diante.
Apesar de elevar o tributo cobrado das empresas, o governo decidiu não aumentar a contribuição ao INSS das pessoas físicas.
Compensações
Palocci também voltou a afirmar que o aumento da carga tributária gerado a partir da medida será compensado pela redução de outros tributos.
Em primeiro lugar, ele citou a desoneração da folha de pagamento. O governo vai enviar ao Congresso um projeto que reduziria a cobrança de impostos que as empresas pagam para ter funcionários. Os tributos passariam a ser cobrados sobre o valor agregado produzido pelas empresas. “É uma medida saudável porque estimula mais empregos formais”, afirmou.
Além disso, o ministro afirmou que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva deve assinar nesta semana a medida provisória que cria o redutor para o Imposto de Renda.
O ministro ainda prometeu compensar a possível alta da carga tributária com a mudança na cobrança da Cofins (Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social). Neste ano, o tributo deixou de ser cobrado nas diversas fases da produção, mas passou a incidir sobre produtos importados e sua alíquota foi aumentada de 3% para 7,6%. A medida gerou ganho de arrecadação para o governo.
Palocci também lembrou que o governo vem reduzindo impostos. Ele citou, por exemplo, os incentivos para a importação de bens de capital (máquinas e equipamentos).
Por último, o ministro voltou a dizer que o governo mantém o compromisso de não elevar a carga tributária, como aconteceu no ano passado pela primeira vez em 10 anos. Na verdade, em 2003 a carga tributária teve um pequeno aumento.
Aposentados não querem parcelamento
A Cobap (Confederação Brasileira de Aposentados e Pensionistas) vai entregar hoje aos ministérios da Fazenda e Previdência uma contraproposta para o pagamento da dívida de R$ 12,3 bilhões do governo com os aposentados do INSS (Instituto Nacional do Seguro Social). O presidente da Cobap, João Rezende Lima, disse que os aposentados rejeitaram a proposta do governo.
“Ficou parecendo que os aposentados já aceitaram a proposta. E não existe acordo nenhum. Estamos submetendo a proposta para as federações de aposentados e nos comprometemos a apresentar amanhã (hoje) uma contraproposta ao governo”, disse Lima.
Segundo ele, os aposentados discordam dos dois principais pontos da proposta: prazo de pagamento e elevação da alíquota patronal de contribuição ao INSS, de 20% para 20,6% por dez anos.
“Não aceitamos a elevação de alíquota para trabalhador nem para empregador. Também queremos o pagamento num prazo menor de tempo”, afirmou o presidente da Cobap.
A proposta da Cobap prevê o pagamento da dívida em no máximo cinco anos. Os aposentados que já entraram com ação na Justiça reivindicando a diferença de benefício receberiam imediatamente.
Em três anos, seriam pagas as dívidas junto aos aposentados que entraram com ação, mas não têm sentença favorável. Os que ainda não moveram ação receberiam em cinco anos a diferença.
Medida vai estimular a informalidade
Para o professor de Economia da Universidade Federal do Paraná (UFPR), Vamberto Santana, o aumento da contribuição previdenciária de empresários – de 20% para 20,6% – pode gerar uma das seguintes situações: incentivo à informalidade ou alta dos preços finais das mercadorias. “Para o governo evitar que haja ou aumento de preços ou aumento da informalidade, ele teria que fornecer alguma forma de compensar o empresário, como a redução de um percentual equivalente em outras formas de contribuição”, aponta Santana.
“Existe um rol imenso de tributos que podem ser reduzidos para compensar a elevação da contribuição previdenciária”, afirma, tomando como exemplos o IPI (Imposto sobre Produtos Industrializados) e o IOF (Imposto sobre Operação Financeira). Nesse sentido, o economista acredita que o ministro Antônio Palocci pode, de fato, cumprir a promessa de compensar a possível alta da alíquota da contribuição previdenciária. “O governo tomou a decisão que no momento parecia a mais razoável, dentro da insuficiência de recursos. E a solução mais simples foi cobrar mais”, afirma o economista, referindo-se ao acordo fechado na sexta-feira. “Agora ele deve usar a criatividade para que haja efeito positivo sobre a economia num todo.”
Já o presidente do Sistema Fecomércio-PR (Federação do Comércio no Paraná), Darci Piana, se mostra incrédulo quanto à promessa do governo federal em compensar o aumento da alíquota previdenciária. “Não deve haver compensação. Se o governo estivesse disposto a isso, faria a transferência de um outro setor para cobrir a deficiência do INSS ao invés de aumentar a contribuição previdenciária dos empresários”, acredita Piana. Tanto para ele como para o economista Vamberto Santana, a história da CPMF (Contribuição Provisória sobre o Movimento Financeiro) deve se repetir, e o aumento da alíquota se tornar permanente.
“É mais um aumento que teremos que pagar, mais dinheiro fora de circulação, mais gente na informalidade, mais concorrência desleal e mais problemas para o governo e para o País”, desabafa o presidente da Fecomércio-PR. Para ele, cabe ao governo federal fazer o “dever de casa” para solucionar o impasse. “Não adianta arrecadar mais e permitir que os desvios de recursos continuem ocorrendo. O governo tem que consertar o INSS”, critica Piana, referindo-se ao rombo na Previdência Social que ultrapassou R$ 165 milhões nos primeiros quatro meses do ano, segundo cálculos da força-tarefa do governo federal.
A superintendência do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) no Paraná informou, via assessoria de imprensa, que só falará sobre o assunto quando o governo federal assinar a medida provisória elevando a alíquota, o que deve acontecer esta semana. (Lyrian Saiki)