Com a convicção de que a economia brasileira continuará enfrentando dificuldades em 2015 e o próximo governo, seja da oposição ou da atual gestão, não conseguirá escapar de fazer ajustes nem sempre populares, o ex-diretor do Banco Central, economista-chefe e sócio do banco Brasil Plural, Mario Mesquita, vê o aumento de impostos como a opção mais provável para financiar a necessidade de recursos do setor público. E o caminho mais fácil poderia ser ressuscitando a CPFM. “Seria uma versão repaginada, uma CPMF modelito 2015.”
Em entrevista ao Broadcast, serviço de notícias da Agência Estado, Mesquita avalia que o País passará por turbulências e o BC terá de deixar o câmbio flutuar para garantir o equilíbrio do balanço de pagamentos.
Na lista das dificuldades internas aparece a inflação resistente, devendo estourar a meta e ficar entre 6% e 7%, pressionada pelo câmbio flutuante, mas, principalmente, pela necessidade de reajustes que foram represados desde 2012, como combustível, energia elétrica e tarifa de transporte público. E não menos preocupante é o baixo crescimento econômico, que na sua estimativa será em torno de 1% neste e no próximo ano. A seguir, os principais trechos da entrevista.
Diante da perspectiva de o banco central dos EUA aumentar os juros, tirando o apetite do investidor estrangeiro por ativos de emergentes, o Brasil conseguirá atravessar bem esse processo?
Acho que sim, temos reservas amplas. Mais do que reservas, temos taxa de câmbio flutuante para regular o balanço de pagamentos em última análise. O mais razoável é deixar a taxa de câmbio se ajustar.
A política do BC de administrar a taxa de câmbio não vai ficando cada vez mais perigosa?
O BC tem essa política de limitar a volatilidade da moeda. Mas não dá para imaginar que essa política vai persistir indefinidamente. Devemos voltar para um regime de câmbio flutuante. Se o programa de intervenção se tornar permanente, efetivamente estaremos mudando de um regime de meta de inflação para um de câmbio fixo ou banda cambial relativamente estreita. Não acho que esse seja o objetivo do governo nem dos candidatos de oposição. O mais provável é que tenhamos mais variação na taxa de câmbio no ano que vem. O fator determinante será a política monetária nos EUA.
O que o BC deveria fazer em relação ao câmbio?
Na minha opinião, não deveria ter programa. Deveriam deixar o câmbio flutuar mais livremente. O déficit em conta corrente está em 3,6% do PIB, bem acima da média histórica. Um déficit normal brasileiro, dependendo do período, é algo entre 2,5%, 2,7%. O próprio BC sempre diz que o principal mecanismo de resistência a choques externos é a taxa de câmbio, então deixe flutuar. A visão do BC é que é importante manter o câmbio estável agora, provavelmente por preocupação com inflação. Mas acredito que depois das eleições a administração da taxa de câmbio será menos restritiva.
Isso significa um componente a mais para a inflação em 2015?
Sim, pode ser. A taxa de câmbio deve depreciar para algo como R$ 2,50, R$ 2,70 no fim do ano que vem. É um movimento na direção do equilíbrio, porque são níveis mais consistentes com déficit em conta corrente. É difícil ver a inflação cedendo em 2015. O mais provável é que fique entre 6% e 7% durante boa parte do ano.
Isso independentemente de quem ganhar a eleição?
Sim, porque quem ganhar vai ter de lidar com a questão dos preços atrasados da Petrobrás. Eu não imagino que São Paulo nunca mais vai ter reajuste de tarifa de ônibus urbano, por exemplo. A eletricidade também vai ter de ser precificada de acordo com oferta e demanda. De outro lado, não vejo uma descompressão do mercado de trabalho que leve a uma redução importante da inflação de serviços. Com administrados indo mais rápido e serviços pressionados, a inflação deve se manter elevada. Em parte, vamos pagar em 2015 pelo controle dos preços administrados em 2012 e 2013 e 2014.
Sem os ajustes necessários, o Brasil corre o risco de perder o grau de investimento?
O nosso grau de investimento já começou a ser questionado pelas agências de avaliação de risco. Nos foi dado o benefício da dúvida, mas isso não é eterno. Em 2015, a discussão de rating pode voltar. O Estado não tem capacidade para financiar o empresário industrial via BNDES e subsidiar o setor de energia, que este ano vai demandar mais do Tesouro do que o Bolsa Família. A não ser que haja aumento da carga tributária.
O sr. acredita que pode ter aumento de imposto?
Eu acho que pelo menos tentativa de aumento é bem provável. Uma versão atualizada da CPMF eu acho que é quase como uma linha de menor resistência para os políticos. É mais fácil introduzir um imposto com alíquota baixa do que cortar gastos. Acho que haverá uma tentativa de ressuscitar uma nova versão da CPMF, repaginada, modelito 2015. A CPMF em 2007 arrecadava algo como R$ 36 bilhões a R$ 37 bilhões por ano. Este ano, ajustando pela inflação, imagino que poderíamos arrecadar uns R$ 50 bilhões. O Congresso derrotou a CPMF em 2007, mas a situação fiscal era muito mais confortável. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.