A Eldorado, exportadora de celulose, interrompeu há um mês o escoamento de sua produção pela hidrovia Tietê-Paraná para chegar até Santos (SP). “Não foi uma opção. O calado estava muito baixo e não tínhamos como usar a hidrovia”, diz José Carlos Grubisich, presidente do grupo. A empresa utiliza o trecho de Três Lagoas (MS), onde está a fábrica, até Pederneiras (SP) por hidrovia, depois faz transbordo via ferrovia.
A celulose é apenas uma pequena parte das commodities que são transportadas por hidrovia. Os grãos ocupam a maioria das barcaças. São quase 6 milhões de toneladas de capacidade de produtos por ano. Mas, desde fevereiro, o escoamento pela Tietê-Paraná está comprometido pela estiagem. Com a seca, a navegação pela hidrovia está restrita. As águas locais estão sendo direcionadas para a geração de energia. Os comboios reduziram de 21 para sete unidades e a capacidade de transporte dessas unidades caiu de 6 mil toneladas habituais para algo entre 2 mil e 3 mil toneladas. “Não há condições para navegação”, afirmaram fontes ao jornal o Estado de S. Paulo. O calado está em 1,40 metro. O padrão, com os comboios, é de 2,70 metros.
A Caramuru Alimentos, maior processadora nacional de grãos, já notificou a Aneel (Agência Nacional de Energia Elétrica), a Ana (Agência Nacional de Águas), o ONS (Operador Nacional do Sistema Elétrico) e a Cesp por se sentir prejudicada por ter de desviar boa parte dos grãos para outros modais – ferrovia e rodovia – para garantir o transporte de seus produtos, afirmou César Borges, vice-presidente da empresa. O grupo está preparando uma cobrança judicial contra Cesp por conta dos prejuízos, que estão sendo levantados.
A expectativa da companhia era escoar 1 milhão de toneladas de grãos este ano a partir de São Simão (GO) até Pederneiras (SP). Até abril, foram escoados 130 mil toneladas, das 300 mil programadas para o período. Procurada, a Cesp informou que as usinas que integram o sistema têm sua operação determinada pelo ONS. Essa operação leva em consideração todos os fatores considerados multiuso relacionados às usinas.
Custos
As discussões sobre o uso múltiplo das águas, desviadas para as usinas hidrelétricas para gerar energia, vão ganhar novos contornos nesta semana. “Pedimos ajuda para o governador de Goiás, Marconi Perillo (PSDB), interceder por nós em Brasília”, afirma Luiz Fernando Horta Siqueira, presidente do Sindicato dos Armadores de Navegação Fluvial do Estado de São Paulo (Sindasp). “O prejuízo provocado pela paralisação do sistema às empresas que operam a hidrovia é estimado em mais de R$ 100 milhões até o momento, sem contar o descrédito que causa ao modal hidroviário junto aos embarcadores.”
Uma das maiores empresas que operam as embarcações, a DNP Indústria e Navegação, que também esteve na mesma reunião com Perillo, já fez as notificações aos órgãos do governo federal.
“Cada comboio que não desce coloca nas estradas cerca de 200 caminhões. Os custos com frete chegam a ser de quatro a seis vezes mais caros. A tonelada embarcada por hidrovia gira entre R$ 40 a R$ 60, dependendo da carga. Por caminhão, varia de R$ 140 a R$ 200”, diz Nelson Michielin, presidente da companhia.
Indústria
Não é apenas o transporte de mercadorias que fica prejudicado pelo baixo nível dos rios – processos industriais também são afetados. A Rhodia paralisou uma de suas unidades em Paulínia (SP) por 14 dias. A interrupção ocorreu entre os dias 6 e 20 de fevereiro na unidade que produz materiais para a cadeia do náilon.
O complexo da Rhodia em Paulínia opera 20 fábricas. A unidade afetada tem um processo produtivo específico em que capta água do rio Atibaia para usar em sistemas de resfriamento de caldeiras, explicou um porta-voz da empresa. Em razão da baixíssima vazão do Atibaia, a Rhodia foi obrigada a parar essa unidade – os 122 empregados foram deslocados para outras atividades. A empresa teve de importar produtos para não comprometer contratos.
“Essa situação toda coloca o setor em estado de alerta. Só para ter uma ideia, um apagão de dois a três minutos significa três dias de fábrica parada”, afirma Fernando Figueiredo, da Abiquim (Associação Brasileira da Indústria Química). Para Carlos Cavalcanti, diretor da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), a iminência de racionamento de água é mais presente na cidade de São Paulo. “Boa parte do abastecimento na cidade é pelo sistema Cantareira. O que dizer para as indústrias de alimentos e bebidas que vão utilizar volume morto? Qual a qualidade dessa água?”
Segundo ele, indústrias cimenteiras, de cerâmica e metalurgia serão altamente afetadas pelo racionamento. “O que mais assusta é que você não sabe quando isso vai ocorrer, se antes ou depois das eleições.” No caso das cimenteiras, segundo José Otávio Carneiro de Carvalho, do Sindicato Nacional da Indústria de Cimento, a falta de água vai afetar diretamente a construção civil. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.