A possibilidade de um alívio financeiro para todos os Estados em 2003, sem alteração dos atuais contratos de refinanciamento das dívidas junto ao Tesouro Nacional, está na prorrogação, a partir de janeiro, do fundo de ressarcimento das perdas de receitas dos governos estaduais causadas pela Lei Kandir (Lei Complementar 87/1996). Até agora, o único socorro federal garantido a um Estado é a devolução de cerca de R$ 500 milhões a Minas Gerais por conta do encontro de contas realizado recentemente entre a União e o governo mineiro. Os recursos deverão ser liberados dentro de um mês.
Quanto à manutenção do fundo da Lei Kandir, se aprovada, obrigará a União a continuar repassando anualmente aos Estados o total de R$ 5 bilhões para cobrir perdas na arrecadação do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS). A chamada Lei Kandir eliminou o ICMS nas exportações de produtos primários e semi-elaborados desde 1996, provocando redução na arrecadação dos Estados.
De acordo com a Lei Complementar 102/2000, o fundo de ressarcimento dos prejuízos no ICMS acaba em dezembro. Isso, na prática, significaria o fim da transferência de R$ 5 bilhões ao ano de verbas federais para os Estados. Pressionados pela crise financeira, os governos estaduais querem manter a compensação até sair a reforma tributária. O dinheiro é dividido proporcionalmente às perdas de cada Estado na arrecadação do ICMS.
A continuidade do fundo de ressarcimento começou a ser reivindicada pelos Estados há seis meses, mas as negociações ficaram para ser concluídas pelo novo governo, dentro do processo de transição. Como a medida implica em mais despesas para a União no próximo mandato, o presidente Fernando Henrique Cardoso preferiu compartilhar a decisão com o sucessor.
Pelas regras atuais, no lugar do fundo de ressarcimento, seria ressuscitado o ?seguro-receita?, a primeira sistemática de compensação do ICMS e que foi derrubada pelos Estados por não cobrir todo o prejuízo. Segundo o coordenador do Conselho Nacional de Política Fazendária (Confaz) e secretário de Fazenda do Ceará, Edenilton Gomes de Soarez, a volta do ?seguro-receita? excluirá quase todos os Estados da compensação e aqueles que permanecerão – dois ou três – ainda verão os recursos federais muito reduzidos. Nesta hipótese, a devolução permaneceria somente para os Estados que exportam grandes volumes de produtos semi-elaborados e primários, como o Paraná e Pará.
Os Estados também querem adiar mais uma vez o dispositivo da Lei Kandir, que aumentaria, significativamente, as perdas nas receitas do ICMS. Trata-se da desoneração dos bens de uso e consumo das empresas.
Por esse mecanismo, os estabelecimentos comerciais e industriais poderiam descontar do ICMS devido o imposto embutido no preço de tudo o que for adquirido para o funcionamento da empresa.
Desde que o ICMS foi retirado das exportações e dos investimentos das empresas em bens de capital, os Estados pleiteiam uma devolução maior das perdas. Segundo Soarez, os Estados deixaram de recolher cerca de R$ 6 bilhões ao ano de ICMS de 1997 para cá. Portanto, os R$ 5 bilhões compensados pela União seriam insuficiente para cobrir o prejuízo. O coordenador da equipe de transição do governo eleito, Antônio Palocci Filho, avisou que os contratos de rolagem de dívidas firmados em 1998 serão revistos no âmbito de uma reforma tributária ampla, uma das prioridades da agenda no primeiro semestre de 2003. Palocci Filho acredita que a unificação da legislação do ICMS, um dos pontos da reforma tributária, aumentará a arrecadação própria dos Estados, reforçando o caixa dos governos estaduais.