O risco de um novo racionamento de energia elétrica volta a rondar o País. Analistas e empresários prevêem que o novo modelo para o setor não vai garantir os R$ 20 bilhões em investimentos anuais, estimados como necessários, para aumentar a oferta de energia e acompanhar o ritmo de crescimento da economia. O resultado é que o País, segundo eles, corre sérios riscos de sofrer um novo apagão em 2007, a exemplo do que aconteceu em 2001.

Rio (AG) – O especialista em energia Adriano Pires Rodrigues, do Centro Brasileiro de Infra-Estrutura (CBIE), diz que o racionamento só não deverá acontecer se a economia brasileira crescer apenas em torno de 2% ao ano até 2007. Essa taxa está muito abaixo do que espera o governo. Para este ano, por exemplo, a estimativa oficial é de que o Produto Interno Bruto (PIB) cresça 3,5%.

O presidente do CBIE, Cláudio Salles, diz que as mudanças previstas no novo modelo do setor elétrico – que terá suas medidas provisórias 144 e 145 votadas no Senado a partir do próximo dia 2 de março – não estimulam os investimentos privados indispensáveis para o atendimento da demanda futura de energia. Salles afirma que pelos estudos feitos, 55% dos R$ 20 bilhões, ou seja, R$ 11 bilhões, terão que ser injetados pelo setor privado.

– É claro que não haverá investimentos privados se o novo modelo mantiver algumas condições que prejudicam as empresas que já estão no País e que vieram, na época da privatização, para ficarem no País por muitos anos – afirmou Salles.

Segundo o estudo de Pires Rodrigues, se o País voltar a crescer a taxas entre 4% e 4,8% ao ano, é grande o risco de faltar energia em 2007. Nesse caso, a diferença entre o consumo e a oferta de energia será em torno de 43 TWh (terawatt/hora, medida de energia que significa um milhão de megawatts/hora). Ou seja, o déficit será equivalente a quase metade do consumo do Estado de São Paulo.

– No curto prazo, o novo modelo não afeta a vida do consumidor. Mas, no médio prazo, o consumidor corre o risco de ficar sem energia porque as regras previstas não atraem os investimentos privados – diz Pires Rodrigues.

Pelo estudo do CBIE, somente na hipótese de o País não crescer é que não haverá riscos na oferta de energia. O especialista acentua que o estudo levou em consideração o aumento de oferta de energia com projetos já aprovados pela Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), que já têm licenças ambientais e financiamentos aprovados.

Para o especialista, o tempo é curto para serem iniciados projetos que possam entrar em operação antes de 2007. E a idéia do governo, de que esses investimentos poderão ser feitos em sua maioria pelo setor estatal, está equivocada, segundo o especialista.

– Não vejo qualquer indicação concreta de que haverá investimentos privados. Ao contrário, a lógica do modelo da ministra (das Minas e Energia, Dilma Rousseff) é reeditar um novo ciclo de investimentos públicos. Só que não há recursos públicos suficientes para atender a uma demanda de crescimento da economia de 3,5% a 4% ao ano – diz Pires Rodrigues.

Nas regras para o setor previstas na Medida Provisória 144, constam algumas questões que preocupam os investidores, segundo Cláudio Salles. Uma delas refere-se à separação que o novo modelo introduz entre a chamada energia velha (das usinas existentes) e a energia nova (de usinas construídas a partir de 2003 em diante). O problema é, segundo Salles, que as empresas que investiram nos últimos anos no setor terão sua energia classificada como velha, e portanto, vendida a um preço inferior à energia nova, com custo maior.

Novo modelo trará aumento para as tarifas

A proposta do governo que consta do novo modelo do setor elétrico – de separar a energia velha (gerada pelas usinas existentes) da energia nova (que será gerada por novos projetos) – vai provocar, no longo prazo, aumento de tarifas, diz o especialista em energia do banco norte-americano Morgan Stanley, David Souccar. Ele é um dos autores do estudo feito pela instituição que mostra que as tarifas da energia nova terão aumento de até 50%, passando de US$ 20 (R$ 60) o megawatt/hora (MWh) para US$ 30 (R$ 90). Segundo Souccar, isso vai significar um aumento entre 20% e 25% nas tarifas finais para os consumidores.

Esse aumento só vai acontecer no longo prazo, a partir de 2009, quando está prevista a entrada no mercado de novos projetos de usinas.

– No curto prazo, o novo modelo não vai afetar as tarifas porque a maior parte da energia consumida é a velha. Num primeiro momento, quando a energia nova começar a entrar no sistema, acredito que o impacto nas tarifas será da ordem de 2% – disse Souccar, acrescentando que esse impacto aumentará no futuro.

Segundo o especialista, mesmo depois de juntar os preços da energia velha com os da nova, não haverá aumentos menores para os consumidores. Isso porque, com o passar do tempo, quanto maior for o volume da chamada energia nova, maiores serão os impactos nas tarifas.

Os empresários concordam que essa divisão entre energia velha e nova, prevista no novo modelo, vai resultar em aumentos nas tarifas dos consumidores. Um dos relatores da medida provisória do novo modelo, senador Delcídio Gomes (PT-MS) acredita que serão feitas mudanças para evitar esse aumento de tarifas.

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