Em boa parte das fábricas internacionais em solo paraguaio, a língua oficial é o “portunhol”. Isso porque os executivos dessas companhias costumam ser brasileiros. “Ao contrário do que acontece no Brasil, não há burocracia aqui para trazer funcionários de fora”, diz Fábio Lopes da Silva, gerente da planta da fabricante de autopeças alemã Leoni, que tem o mercado brasileiro como o principal destino de sua produção. Além do próprio Fábio, a Leoni trouxe um gerente de logística do Brasil e outro executivo da Itália.
É necessário trazer mão de obra especializada de fora, segundo o executivo, porque o desenvolvimento da indústria no Paraguai é muito recente. Mesmo o pessoal operacional precisa passar por treinamento, uma vez que a maior parte dos funcionários vem do mercado informal. O ministro paraguaio da Indústria e Comércio, Gustavo Leite, admite que a intenção número um do programa de maquilas é formalizar a força de trabalho do país.
Para brasileiros, a decisão de mudar para o Paraguai também pode ser uma forma de “pular etapas” na carreira. Foi o que fez o potiguar José Paulo Pereira Santos, de 26 anos, que trabalhava em uma das fábricas da Guararapes, dona da Riachuelo, em Natal. Depois de aceitar o convite para ser transferido para Assunção e ajudar a implantar a unidade paraguaia, há dois anos, o jovem executivo foi convidado para permanecer na empresa. Hoje, ocupa o cargo de gerente de qualidade da Texcin, parceira da marca brasileira no Paraguai.
“Acho que, se fosse disputar esse mesmo cargo no Brasil, teria muita gente apta para a função. O Paraguai é uma mata virgem, não tem ninguém”, afirma José Paulo. Do ponto de vista pessoal, diz ele, a mudança para a Assunção acabou sendo uma boa surpresa: “Não tenho tanta preocupação com segurança, parece a Natal de 20 anos atrás. E o custo de vida, até porque fico aqui na fábrica 12 horas por dia, é pelo menos 30% mais baixo”.
O gerente da Leoni, que morava no interior de São Paulo e fez a mudança com a esposa e a filha, diz que a capital paraguaia se revelou uma boa surpresa. “O custo de vida é menor, a cidade é tranquila e minha filha tem acesso a uma escola de melhor qualidade. Não moraria aqui a vida inteira, mas, se tiver de ficar mais um ou dois anos, não vai ser um problema.”
Treinamento
Na Texcin, por exigência da Riachuelo, todos os novos funcionários precisam passar por um treinamento intensivo. Mesmo os contratados que já tinham alguma experiência no ramo de confecção geralmente trabalhavam em pequenas oficinas com cinco ou seis máquinas. José Paulo e outros dois funcionários captados nas unidades da Guararapes em Natal são responsáveis por implantar os padrões brasileiros à fábrica paraguaia.
Ao contrário de outras maquilas de confecções, em que as máquinas são dispostas de maneira aleatória, a produção na Texcin organiza os funcionários de acordo com suas funções: os cortadores de tecido usam preto, os costureiros vestem laranja e os responsáveis pelo acabamento são identificados pela cor verde. “À medida que a fábrica cresce, isso nos ajuda a entender a função de cada um mais rapidamente”, explica José Paulo.
Os novos contratados passam entre um e dois meses trabalhando em uma seção da fábrica da Texcin denominada “escolinha”. Durante a visita do Estado à fábrica, em dezembro, havia pelo menos 30 novos funcionários sendo treinados para as diferentes funções dentro da unidade.
Informalidade
O afã do governo em atrair investimentos quase sem cobrar impostos está relacionado à abundância de mão de obra no mercado. Embora as estatísticas oficiais paraguaias posicionem o desemprego entre 6% e 7%, a realidade é que, descontando os subempregos muito comuns no país, como a venda de produtos em semáforos de Assunção ou serviços agropecuários esporádicos no interior, a taxa de desocupação varia de 20% a 25%.
Para os trabalhadores, além de um emprego em uma fábrica ser a garantia de uma renda constante, é também a única forma de ter acesso a certos serviços públicos. Ao contrário do que ocorre no Brasil, onde o acesso ao sistema de saúde é universal, um trabalhador informal pode ter problemas para ser atendido em um hospital. A facilidade em encontrar mão de obra, segundo o gerente da Texcin, reflete a busca do trabalhador paraguaio pelo IPS, seguro pago pelo empregador que garante acesso à saúde além da atenção básica.
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.