Empresas americanas e o governo da China se uniram ontem nas críticas à decisão de Donald Trump de impor tarifas sobre a importação de US$ 50 bilhões em produtos do país asiático. Mas a medida deve agradar à base do presidente, a cinco meses da eleição crucial que definirá o controle do Congresso e o futuro de seu governo.
“No presente momento, lançar uma guerra comercial não é do interesse do mundo”, disse nota divulgada pelo Ministério do Comércio da China. “Nós conclamamos todos os países a atuarem em conjunto para frear com firmeza esse movimento ultrapassado e retrógrado.”
Presidente da principal entidade empresarial americana – a Câmara de Comércio dos Estados Unidos -, Thomas Donohue divulgou declaração contrária à medida. “A imposição de tarifas coloca o custo das práticas comerciais desleais da China diretamente sobre os ombros dos consumidores, fabricantes, fazendeiros e rancheiros americanos. Essa não é a abordagem correta.”
Arthur Kroeber, da consultoria Gavekal, disse ver chance “zero” de Pequim modificar as políticas industriais previstas no programa Made in China 2025 em razão das tarifas de Trump. Segundo ele, setores importantes de ambos os lados serão prejudicados, mas as economias como um todo não sofrerão tanto.
Como exporta mais para o mercado americano do que importa, a China tem mais a perder em um primeiro momento, observou Kroeber. Mas a continuidade da guerra comercial deve afetar a imagem dos EUA e reduzir no longo prazo a sua credibilidade internacional.
Em sua avaliação, as restrições a investimentos no setor de tecnologia que deverão ser impostas por Trump dentro de duas semanais serão mais prejudiciais para a China do que as tarifas. “Investimentos chineses no setor de tecnologia nos EUA, na Europa e no Japão são um dos elementos da estratégia de Pequim para avançar no setor tecnológico”, observou Kroeber.
Estratégia. Monica de Bolle, do Peterson Economic Institute, também não vê possibilidade de a guerra comercial forçar a China a mudar sua política industrial. Em sua opinião, o que o governo Trump chama de “roubo” de tecnologia é uma estratégia legítima de desenvolvimento adotada por um país emergente. “A China exige que certas empresas americanas que queiram entrar em seu mercado façam parcerias com empresas locais e transfiram tecnologia. A empresa tem a escolha de entrar ou não.”
Trump usou a necessidade de proteger o setor tecnológico dos EUA como justificativa da medida protecionista anunciada ontem. “Nós temos o poder de grandes cérebros no Vale do Silício, e a China e outros roubam esses segredos e nós vamos proteger esses segredos. Eles são as joias da coroa deste país”, declarou o presidente em entrevista à rede Fox News.
Mas representantes desse setor supostamente beneficiado também criticaram a imposição de barreiras às importações. “Tarifas são a resposta errada às práticas comerciais discriminatórias e prejudiciais da China. Ao impor sanções sobre bens de consumo e componentes essenciais desses bens, o presidente vai tirar dinheiro do bolso dos americanos de maneira desnecessária, prejudicando as pessoas que ele espera ajudar, não punindo a China”, declarou Dean Garfield, presidente do Information Techology Industry Council, que reúne grandes empresas do setor, entre as quais Amazon, Apple e Google.
Com uma cadeia de produção que se estende dos Estados Unidos à China e abrange outros países asiáticos, a Apple foi uma das empresas que se manifestaram de maneira mais aberta contra as tarifas no período anterior ao anúncio de Trump. O presidente da companhia, Tim Cook, se reuniu com o presidente na Casa Branca em abril, e disse ter levantado a questão do protecionismo.
“Eu falei sobre o comércio e a importância do comércio e como eu acredito que dois países realizando comércio entre eles tornam a torta maior”, disse Cook no mês seguinte em entrevista à Bloomberg Television. “Eu senti que tarifas não eram a abordagem certa. Eu mostrei a ele (Trump) algumas coisas analíticas que demonstravam o por quê.”
A julgar pela decisão de ontem, Cook não foi convincente o bastante. No fim, Trump foi fiel à sua retórica de campanha e à sua promessa de confrontar a China quando chegasse à Casa Branca. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.