A cimenteira argentina Loma Negra começou, no ano passado, a negociar ações na bolsa local e na de Nova York. Captou US$ 1 bilhão, na maior oferta de uma empresa argentina em quase 25 anos. Depois do feito da Loma Negra, deixou de existir qualquer dúvida sobre a volta da Argentina ao radar dos investidores globais.
Em 2017, cinco empresas fizeram ofertas de ações no país vizinho e, para 2018, a expectativa é que esse número mais que dobre.
“A Argentina atravessou uma grave crise, mas muitas empresas boas sobreviveram a esse período e sem endividamento. À medida que a economia volta a crescer e o mercado se normaliza, é natural que elas pensem em fazer investimentos e em captar dinheiro”, diz Emerson Leite, diretor da área de renda variável do Credit Suisse para a América Latina.
A volta das empresas à bolsa por lá começou em 2016, com bancos como o Supervielle e o Macro, levantando recursos para atenderem à retomada da demanda por crédito no país. Agora, se estende para empresas de infraestrutura, como a Loma Negra e a Corporación America, que atua em aeroportos, agroindústria e energia e a Central Puerto.
A retomada econômica do país vizinho começou a se desenhar com a posse do presidente Mauricio Macri, em 2016. Após anos de severa crise política e econômica, ele restabeleceu o diálogo do país com os investidores e está arrumando a casa. Macri combateu a inflação, resolveu as questões cambiais e tomou medidas pró-mercado, como a redução de impostos sobre os ganhos de capital e a flexibilização de entradas e saídas de recursos no país. O resultado é que a Argentina voltou a crescer e, onde há crescimento, no cenário atual de liquidez global, não haverá de faltar recursos.
Apesar de o mercado estar mais aquecido por lá do que no Brasil neste momento, profissionais de bancos de investimento descartam uma competição por investidores entre os dois países. Na verdade, o Brasil até já participou da festa: a Camargo Corrêa era parte da holding controladora da Loma Negra; e a empresa de viagens online Despegar, outra novata, tem boa parte de suas receitas em seu braço brasileiro, a Decolar.
Para Roderick Greenless, diretor de banco de investimentos do Itaú BBA, o problema do Brasil no quesito ofertas é mais uma “questão nossa” do que qualquer problema de concorrência. “Estamos em ano eleitoral, houve a questão da reforma da Previdência. São questões nossas. Já a Argentina vive cenário oposto, de crescimento econômico e com um presidente fazendo o que os investidores acham que tem de ser feito”, diz.
Emerson Leite, do Credit Suisse, acredita que, eventualmente, ofertas do Brasil e da Argentina podem concorrer pelo investidor internacional se saírem ao mesmo tempo e forem de empresas do mesmo segmento. “O investidor global vê a América Latina como um ativo único, então um caso como esse pode dividir atenções. Mas esses serão apenas casos específicos”, diz. Ambos afirmam que o Brasil tem uma bolsa muito maior e mais desenvolvida do que a Argentina, que no governo Macri também partiu para uma integração.
Desde 2016, a bolsa argentina é a BYMA, que integrou bolsas regionais, a instituição depositária e abriu capital. Ainda assim, negocia cerca de R$ 5 milhões por dia em média, enquanto a brasileira movimenta R$ 10 bilhões. Não há uma indústria desenvolvida de fundos de investimento na Argentina, porque os anos de paridade cambial com o dólar levaram os poupadores a enviar seus recursos para investir fora do país, via offshores.
“Uma de nossas metas mais importantes é repatriar o capital local que hoje está negociando em Nova York”, afirma Matias Lara Mateos, diretor de relações com investidores da BYMA. “Sabemos que algumas de nossas companhias não conseguem acessar o volume de capital que desejam em nossa bolsa. Mas é nosso dever criar condições para que isso aconteça.”
Entre outras medidas, a BYMA está criando um segmento especial de governança, copiando, como já declarou seu presidente, o Novo Mercado da bolsa brasileira. “Esperamos repetir o sucesso que o Brasil teve”, afirma Mateos. Enquanto o dinheiro não volta e o estrangeiro não vem, a opção das empresas é ir buscar investidores em seu país, mas se for preciso também em Nova York, por meio de duplas listagens. Empresas com captações menores como o Laboratorios Richmond e a Molino Canuelas, ou a agrícola Inversora Juramento, ficaram só na BYMA. Loma Negra e Despegar também foram para Nova York.
A imprensa local fala em operações da Genneia, que atua na geração de energia renovável, e de empresas já abertas, como a Central Puerto e a TGLT.
Cálculos da InvertirOnline.com estimam que ao final dos seis anos do governo Macri, mantido o ritmo atual, haverá 30 novas empresas na bolsa argentina, em ofertas que somarão US$ 15 bilhões. Eles estimam ofertas na casa dos US$ 300 milhões, em média. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.