Emprego depende da escolaridade

Rio

(AG) – “Procura-se atendente de lanchonete. Exigem-se referências e Segundo Grau completo”. Este anúncio sintetiza uma realidade já captada nas estatísticas dos estudiosos do mercado de trabalho do país. Nos últimos dez anos, nos quais estão incluídos os oito anos do Real, foram lançados para fora do mercado mais de dois milhões de trabalhadores com até quatro anos de estudo. Já mais de 1,4 milhão de pessoas, com mais de 12 anos de escolaridade, entraram no mercado.

A exigência de mais escolaridade começou a alijar a população com pouco estudo primeiro do emprego com carteira assinada; depois, do trabalho informal e, por fim, até do contingente de desempregos. Desalentado, esse trabalhador acabou desistindo de procurar uma vaga (não entrando mais nas estatísticas do desemprego) e passou a buscar a rede de proteção familiar ou do governo. Este é o caso de Kátia Gonçalves, que conta com a ajuda do governo para fazer frente às despesas da casa. Recebe R$ 45 por mês de bolsa-escola para manter na sala de aula os três filhos: Jonathas, de 11 anos, Jaciara, de 9, e Jandiara, de 7.

Aos 32 anos, já trabalhou como auxiliar de serviços gerais e ajudante de cozinha, e tenta há cinco anos conseguir um emprego formal. Nos dois trabalhos anteriores, o vínculo empregatício era apenas verbal. Com até a quarta série do Ensino Fundamental, Kátia esbarra na falta de diploma para atingir seu objetivo. O marido, desempregado, vive de biscates que não chegam a um salário-mínimo por mês:

– Isso quando ele consegue algum bico de pedreiro.

A realidade do universitário Luís André Almeida, de 30 anos, é totalmente diferente. Almeida, que cursa propaganda e marketing, perdeu o emprego no início do mês mas pôde escolher entre duas propostas de trabalho, com salário de R$ 600 mais benefícios:

– É a primeira vez que fico desempregado. Das outras vezes que mudei de emprego, já tinha alguma coisa em vista – conta Almeida, que trabalha com atendimento ao cliente.

Lauro Ramos, do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), vê dois fatores para a queda de vagas para quem tem menos estudo. Segundo ele, a maior oferta de mão-de-obra (a taxa de desemprego médio subiu de 4,84% em 1991 para 7,16% em 2002) tornou os empregadores mais seletivos, exigindo mais escolaridade. Além disso, os trabalhadores estão mais escolarizados:

– A cada ano a taxa de participação da população de 15 a 17 anos vem diminuindo, o que pode indicar a busca de mais estudo para concorrer melhor no mercado de trabalho.

Renda em queda livre

O mercado de trabalho da Era Real lembra a história da pessoa que é convidada para uma festa num restaurante, se farta de comida e, apenas no fim, descobre que terá de rachar a conta. Nos primeiros anos do plano, o fim do chamado imposto inflacionário e a aceleração da atividade econômica resultaram em expressivos ganhos reais de rendimento e aumento da oferta de trabalho. De 1994 a 1997, a renda cresceu 28,4% acima da variação do Índice Nacional de Preços ao Consumidor (INPC), medido pelo IBGE.

Mas desde 1998, em razão das turbulências externas e da desvalorização do real, a renda não pára de cair. Este ano será o quinto consecutivo, estima o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea). Até abril de 2002 (último dado disponível), segundo o economista e professor da UFRJ João Sabóia, o aumento real acumulado desde a implantação do Real já tinha sido reduzido a 12,7%:

– Estamos muito perto de devolver todo o ganho obtido nos primeiros anos do plano. No mercado de trabalho, a avaliação é desfavorável. O crescimento econômico fez muita falta.

Sabóia calcula que para as condições do mercado de trabalho não piorarem, a economia precisa avançar, ao menos, 3,5% ao ano. Como no Real a expansão foi de 2,5% em média, o desemprego cresceu. Desde 1998, o índice de desocupação tem ficado acima de 7%. Só em 2001 a taxa foi de 6,2%, não por aumento de vagas, mas pelo alto número de brasileiros que desistiram de procurar trabalho.

O economista Marcelo Neri, chefe do Centro de Políticas Sociais da FGV, lembra, no entanto, que a crise do mercado de trabalho foi mais intensa nas metrópoles. Os habitantes das pequenas cidades e áreas rurais se beneficiaram com o aumento real do salário-mínimo, que passou de R$ 70 para R$ 200 nos oito anos do plano, e com programas do tipo bolsa-escola.

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