A conjunção de problemas que atingiu as estatais brasileiras nos últimos anos derrubou a capacidade de investimentos das empresas, paralisou obras e colocou em xeque até a sobrevivência de algumas delas. Além do ajuste fiscal, que afeta a rotina daquelas que dependem de repasses do governo, cada uma tem um problema específico para lidar, como a Operação Lava Jato na Petrobras, os efeitos da MP 579 na Eletrobras e a perda de receitas da Infraero por causa das concessões de aeroportos.
Apesar das peculiaridades, o resultado na vida financeira das empresas é igual. Segundo dados da ONG Contas Abertas, o volume de investimentos feitos pelas estatais de janeiro a abril deste ano, em relação ao orçamento, é o pior desde 2005. Neste ano, as empresas conseguiram investir apenas 17,4% do orçamento. No ano passado, nesse mesmo período, esse número foi de 27,6%.
O problema é que as decisões estão demorando demais para sair do papel por causa das incertezas e da crise de confiança que afeta o País. Além disso, quem depende do governo sofre com os atrasos nos repasses.
Na Petrobras, que vive a pior crise da história, o valor aplicado até o segundo bimestre foi o menor em 12 anos; na Eletrobras, trata-se do pior valor na série pesquisada desde 2000. A estatal de energia afirma, no entanto, que tem batido recordes de investimento com os projetos tocados pelas Sociedades de Propósito Específico (SPEs), em parceria com a iniciativa privada. Uma parte pequena desses recursos sai do orçamento público. A maioria é financiamento.
O caso mais grave é o da Petrobras, já que a empresa tem forte participação no volume total de investimentos do País e, consequentemente, no Produto Interno Bruto (PIB). Desde que a Operação Lava Jato foi deflagrada, a estatal tem reduzido o ritmo de obras, revisado o tamanho de alguns projetos e cancelado outros. O último plano de negócios, anunciado no fim do mês passado, reduziu em 37% o volume de investimentos da estatal no período de 2015 a 2019.
Entre os projetos que foram revistos está o Comperj, no Rio de Janeiro. No anúncio do plano, o presidente da estatal, Aldemir Bendine, afirmou que os investimento serão focados na parte de refinaria do projeto. O polo petroquímico está suspenso temporariamente, assim como as unidades de fertilizantes 3 e 5 em Minas Gerais e Mato Grosso do Sul e as Refinarias Premium 1 e 2, no Nordeste. Além disso, a empresa deve dar início a um processo de venda de alguns ativos para fazer caixa.
“A Lava Jato ainda vai demorar. Não vejo boas perspectivas para a empresa voltar a investir de forma substancial nem no primeiro semestre de 2016. Pelo contrário, acredito no desinvestimento”, afirma o professor do Insper, Paulo Furquim. De janeiro de 2014 até agora, a estatal perdeu quase R$ 40 bilhões em valor de mercado por causa do escândalo de corrupção, segundo dados da empresa de informações financeiras Economática. “A crise na Petrobras tem um efeito cascata em toda a economia, pois afeta a capacidade de seus fornecedores”, diz o professor.
Segundo ele, as estatais vivem histórias semelhantes causadas por problemas diferentes. O revés da Eletrobras, por exemplo, começou com a MP 579, que antecipou a renovação das concessões, e reduziu drasticamente o preço da energia gerada pelas usinas antigas. “A MP saqueou a empresa. As usinas foram renovadas por quase nada”, afirma o investidor, Roberto Moura, acionista minoritário da companhia há 30 anos.
De 2012 até o ano passado, a empresa acumulou prejuízos de R$ 16,1 bilhões e perdeu o grau de investimento. “Apesar da melhora financeira nos resultados de 2015, a estatal continua apresentando métricas de crédito que são muito fracas para a categoria de rating Baa3”, justificou a agência de classificação de risco Moody’s ao revisar a nota da empresa.
Além disso, segundo a agência, a partir de 2016, a Eletrobras não poderá mais contar com os recursos de indenização (pela renovação das concessões das usinas), “o que provavelmente colocará pressão adicional na liquidez e na alavancagem da empresa”. Pelo balanço da estatal, as empresas do grupo têm R$ 3,4 bilhões de indenização a receber.
Hoje, o valor de mercado da empresa representa um terço do registrado antes da MP 579, segundo a Economática: caiu de R$ 26 bilhões para R$ 8,8 bilhões na Bolsa. A lenta recuperação, aliada à crise econômica do País, deverá obrigar a empresa a rever seu plano de investimentos, previsto para sair nas próximas semanas.
Os problemas, no entanto, não se limitam ao setor energético. A estatal Infraero, que administra alguns dos principais aeroportos brasileiros, também tem tido limitações para investir. No primeiro bimestre deste ano, apenas 14% do orçamento havia sido aplicado.
A empresa explica que o resultado é decorrente de dois fatores. Um deles foi que, em 2014, o ritmo de algumas obras teve de ser acelerado no primeiro semestre por causa da Copa do Mundo, o que elevou os valores da execução orçamentária. Neste ano, o problema foi o ajuste fiscal que obrigou a Infraero a rever “o ritmo de execuções dos empreendimentos às novas diretrizes estabelecidas”.
Em nota, a estatal afirma que, com as concessões dos principais aeroportos do País, ela teve de rever o plano de negócios. “Os cinco aeroportos (Guarulhos, Brasília, Viracopos, Galeão e Confins) respondiam por 53% do faturamento da Infraero, o que gerava resultado superavitário para sustentar a operação dos demais aeroportos da rede, que atualmente conta com 60 aeroportos. A partir de 2013, todos os investimentos feitos pela empresa são executados com recursos do Fundo Nacional de Aviação Civil (Fnac).” As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.