São Paulo – O cenário de fim de ano, juro alto com ameaça de subir mais, aumento da dívida pública e dólar ainda fora do ponto não assustam o economista Antônio Prado, formado pela Unicamp e professor da PUC paulista, que ajudou a coordenar o programa do PT para o próximo governo. Nem o Orçamento apertado em 2003 impede que ele tenha uma previsão otimista já para o primeiro ano do próximo governo, para o qual projeta crescimento da economia de 3,5%.
A expectativa de que o dólar volte para níveis entre R$ 3 e R$ 3,20, segundo ele, poderá garantir uma taxa de juro real mais baixa, em torno de 9% ou até menos se houver condições.O petista argumenta que, para alcançar o crescimento de 3,5% em 2003, é preciso manter o ritmo de crescimento das exportações e das substituições de importações, o que poderá ser garantido pela reforma tributária.
AE – O superávit de 3,75% será suficiente para estabilizar a relação dívida/PIB?
Antônio Prado – Três variáveis definem o superávit primário: a taxa de juro real, a taxa de crescimento da economia e o próprio nível da dívida pública líquida em relação ao PIB. Como o câmbio afeta a dívida pública líquida, esse quarto elemento também deve ser considerado. Então, se há a expectativa de uma queda do dólar, de um crescimento maior e da redução gradual das taxas de juro reais, pode-se acreditar que um superávit de 3,75% seja mais que suficiente para atingir o objetivo de colocar a dívida pública líquida em relação ao PIB em trajetória descendente.
AE – É possível crescer?
Prado – É possível. Pode-se crescer até 3,5% em 2003. Há três movimentos importantes que são fontes de crescimento e autorizam essa projeção. Primeiro, a capacidade de recuperação da agricultura brasileira. Segundo, o crescimento das exportações e terceiro, o processo de substituição de importações.
AE – Qual o juro real para crescer 3,5%?
Prado – Para 3,75% de superávit e 3,5% de crescimento, o juro real pode recuar para algo em torno de 9% ao ano já em 2003.
AE – Esse juro real é suficiente para que os bancos voltem a financiar a produção?
Prado – Não. Tem de cair mais do que isso. Essa hipótese de 9% em média para o juro real é para o primeiro ano do governo. Mas o esforço é fazer com que caia mais.
AE – A inadimplência é justificativa para juros altos?
Prado – A inadimplência está ligada ao crescimento do desemprego nos últimos anos e à alta taxa de falências de microempresas. O que está por trás disso é uma instabilidade macroeconômica.
AE – Outro elemento é o custo da taxa básica de juro.
Prado – O objetivo é ir reduzindo gradualmente a taxa de juro nominal à medida que a questão fiscal se consolide e que a dependência externa seja reduzida. Existe ainda um fator que impede a redução dos spreads bancários, que é uma espécie de “embaçamento” jurídico nas garantias, que precisa ser revisto.
AE – Existe meta para a expansão do crédito?
Prado – Esse é um desafio importante. O crédito para a produção é extremamente baixo, em torno de 28% do PIB. O Chile opera com 60% do PIB. Países desenvolvidos, como a Alemanha, operam com 160% do PIB. O objetivo tem de ser levar o crédito próximo a 40% do PIB em quatro anos. Essa expansão vai estimular o financiamento de capital de giro e o financiamento de investimentos. E para colocar a economia num regime de crescimento sustentado é necessário que os investimentos voltem a crescer. Então, os estímulos aos investimentos deverão vir, via crédito e também pela reforma tributária.
AE – O dólar pode ir para quanto ?
Prado – Não seria desejável que caia abaixo de R$ 3 por causa das exportações. O Brasil precisa desse saldo comercial para fazer frente à necessidade de financiamento externo. Mas acho difícil o dólar voltar para níveis abaixo de R$ 3,20 até o primeiro trimestre de 2003.
AE – Os superávits comerciais têm contribuído para acalmar a turbulência?
Prado – Começamos o ano com uma projeção de US$ 4 bilhões e vamos fechar 2002 com US$ 11 bilhões. Em 2003, o saldo comercial pode chegar a US$ 18 bilhões. Esse fluxo econômico é muito importante no sentido de acalmar as expectativas quanto às condições de o futuro governo fazer frente às suas despesas em dólar. Também a queda acentuada do déficit em transações correntes , principalmente turismo, é muito positiva.
AE – E a inflação?
Prado – Neste momento, é a maior preocupação. Mas as pressões inflacionárias são decorrentes dos custos crescentes relacionados com a cotação irreal do dólar, como mostra o IGP-M. Com o dólar cedendo, nossa expectativa é de que essas pressões sobre os preços sejam diluídas.