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‘É preciso estimular demanda doméstica’, diz ex-diretor do BC

A inflação sob controle, apesar das altas recentes do dólar, deve manter a perspectiva de que os juros básicos, hoje em 6% ao ano, fiquem na casa dos 5% ao ano até o fim de 2019. Mas também reflete o ritmo mais lento do que se imaginava para a recuperação de uma economia que ainda não conseguiu engatar.

A avaliação é do consultor e ex-diretor do Banco Central Alexandre Schwartsman. Ele também lembra que esses preços refletem o consumo ainda tímido das famílias e que a queda da renda dos brasileiros nos anos de crise ainda deve demorar a se recuperar. A seguir, trechos da entrevista.

O que a inflação registrada em agosto diz sobre o estado atual da economia brasileira?

Os números mostram que é a absoluta ausência de surpresas em relação à economia. Ela está parada mesmo. Os núcleos de inflação estão inalterados nos últimos 12 meses, é uma economia que não tem tensão inflacionária.

O exterior também tem contribuído para a inflação baixa?

Sim. Há alguns efeitos desinflacionários vindo do exterior: crescimento global mais fraco, preços de commodities em queda e a crise Argentina, que pesa direto na produção industrial do Brasil, pela importância que eles têm na compra de manufaturados brasileiros. Pelos números, dá para ver que a exportação de manufaturados do Brasil está perdendo fôlego, o que é preocupante, dado o estado crítico em que a indústria brasileira se encontra.

A recuperação, então, deve vir do mercado interno?

Exatamente. A recuperação da economia não vai vir de fora, é preciso colocar mais demanda doméstica para puxar a economia. O consumo está muito fraco ainda, mais forte do que o resto da economia, mas muito distante do ideal.

O consumo vai continuar fraco enquanto o desemprego continuar resistente?

A taxa de criação de empregos, na comparação com todo o resto, não está tão mal. Houve uma recuperação expressiva na comparação com os piores momentos da crise. Se a gente parar para pensar, eram 92,5 milhões de empregos em 2015, caiu para 89,5 milhões durante o pior momento da crise. A gente está na casa de 93,5 milhões, mas é um emprego de pior qualidade. O emprego formal ainda está muito abaixo do período pré-crise, subiu no informal e no conta própria. O que leva a uma renda mais baixa das famílias também.

O emprego informal acaba inibindo a concessão de crédito também, certo?

Sim, os bancos tendem a ser mais reticentes para dar crédito para quem está informal ou por conta própria. A economia depende muito da recuperação da renda e não tem muito como alavancar a renda neste momento.

Houve uma depreciação forte do real recentemente, com o dólar encostando em R$ 4,20. Isso pode afetar a inflação?

Foi, de fato, uma depreciação forte. O dólar rapidamente chegou a esse patamar entre R$ 4,10 e R$ 4,20, mas os efeitos ainda não apareceram na inflação de agosto. Se aparecerem, vai ser em setembro ou outubro. Ainda assim, deve ser um efeito de curto prazo, se o dólar parar mesmo em R$ 4,20. Se a moeda americana subir além disso, podemos ter problemas. Até agora, porém, não acho que seja um grande obstáculo para continuar cortando juros.

O ano de 2019 é dado como perdido, apesar de previsões anteriores, que mostravam uma recuperação mais forte. Foram as crises políticas que postergaram a retomada da economia?

A responsabilidade não é toda do Planalto. Eu acho que o presidente é fraco, mas o Congresso chamou para si a responsabilidade de tocar a agenda de reformas. O problema é que a economia perdeu fôlego no fim do ano e não recuperou desde então, apesar da perspectiva que os economistas tinham de que a eleição iria eliminar incertezas.

Com a inflação nesse patamar baixo, o espaço para novos cortes dos juros continua aberto?

Todas as indicações são de que o Banco Central vai continuar cortando juros, é um consenso de mercado que os juros vão ficar em alguma coisa na casa dos 5% até o fim deste ano e devem permanecer aí ao longo de 2020. Não tem muita opção, sem a queda de juros, dificilmente a inflação vai convergir para a meta. Em 2019 não tem mais o que fazer, o ano está perdido e o cenário já foi lançado, não tem política monetária que vá mudar alguma coisa agora. O foco do Banco Central já está em 2020.
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

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