O DVD “Batman, o Cavaleiro das Trevas”, que foi lançado nos Estados Unidos por US$ 24 (R$ 39,60) para o consumidor final, tem um peso no bolso do brasileiro equivalente a US$ 85,50 (R$ 141). Os dados são de um estudo coordenado pelo Social Science Research Council, uma entidade de pesquisas com base em Nova York, que será divulgado na próxima quarta-feira (9). Os números foram antecipados pelo portal Economia & Negócios.
Com o título ‘Media Piracy in Emerging Economies’ (Pirataria de Mídia em Mercados Emergentes, em tradução livre), é a primeira investigação científica empírica que analisa comparativamente a pirataria em países emergentes considerando não apenas as políticas de repressão e os preços dos produtos, mas também o poder de compra da população.
A pesquisa aponta que o brasileiro, ao comprar produto pirata, sente no bolso quase o mesmo que os moradores dos Estados Unidos sentem quando adquirem o produto original. O Batman saía por cerca de US$ 3,50 no mercado ilegal do Brasil em 2008 (ano em que foi feita a tomada de preços), só que esse valor, para a renda de um morador do País, corresponde ao que seria um gasto de US$ 20 para um americano.
O Produto Interno Bruto (PIB) per capita no Brasil foi de US$ 10,5 mil em 2008, pouco mais do que um quinto do americano (US$ 47,2 mil), segundo base de dados do Fundo Monetário Internacional (FMI). Entre cinco países em desenvolvimento pesquisados, a Índia é o que se encontra em pior situação.
O DVD do Batman pesa no bolso dos indianos o que equivaleria a US$ 641 para os moradores dos Estados Unidos. No país asiático, o PIB per capita foi de apenas US$ 2,9 mil no ano em que os dados foram coletados.
A Rússia, um dos países que estão na berlinda por questões relacionadas à pirataria e à falsificação, está melhor que o Brasil quando se analisa o peso do produto original no bolso do cidadão. O preço do Batman oficial ajustado ao poder de compra da população é de US$ 75. A versão ilegal do mesmo filme fica em US$ 25 no preço relacionado ao poder de compra – praticamente o mesmo valor do produto original nos EUA.
“O estudo demonstra em termos empíricos que a batalha contra a pirataria será vencida não no campo da repressão, mas sim no campo econômico, com a oferta de produtos cujos preços sejam compatíveis com a renda e o poder de compra local”, analisa o brasileiro Ronaldo Lemos, um dos autores da pesquisa.
Segundo Lemos, o Brasil se destaca pela amplitude das medidas que vem tomando contra a pirataria. “O País possui hoje estruturas públicas consolidadas com essa finalidade, como o Conselho Nacional de Combate à Pirataria, além de diversas organizações privadas atuando no apoio à repressão, como a Associação Antipirataria de Cinema e Música. Isso faz do Brasil um caso mundialmente exemplar na adoção de medidas severas para o combate à pirataria”, afirma Lemos, que é diretor do Centro de Tecnologia e Sociedade da Fundação Getúlio Vargas e professor visitante na Universidade de Princeton.
Terça-feira passada (1), o governo dos Estados Unidos anunciou que excluiu o Brasil da lista de “notórios mercados” da pirataria e do contrabando, o que significa que o País deixou de ser considerado um lugar “desafiador” do ponto de vista da transgressão das leis internacionais de propriedade intelectual
No mundo, a repressão ao produto ilegal também é crescente. O número de apreensões de materiais piratas, operações de combate à pirataria e a remoção de sites na internet vem batendo sucessivos recordes, mas, segundo Lemos, tudo isso tem registrado pouco impacto efetivo na redução da pirataria.
Cultura
No Brasil, o estudo traz munição para o conjunto de especialistas que defendem flexibilização no direito autoral, entre os quais Lemos aparece como um dos principais expoentes. Foi ele quem trouxe para o País a licença Creative Commons, um selo que autores podem colocar em suas obras sinalizando que permitem a reprodução do trabalho sob determinadas condições.
Esse grupo é contrário à mudança de rumo que o novo Ministério da Cultura assumiu. Uma das primeiras medidas da ministra Ana de Hollanda foi justamente retirar do site da pasta o selo Creative Commons. Na ocasião, a medida provocou protestos na internet por parte de defensores da flexibilização do direito autoral.
Grosso modo, a batalha na área de direitos autorais na área cultural opõe dois grupos. De um lado, os que defendem a flexibilização desse tipo de propriedade, facilitando o trabalho dos artistas que têm intenção de autorizar o uso de sua obra em massa, sem precisar assinar contrato por contrato com cada empresa ou entidade que queria reproduzir o trabalho.
De outro, os artistas e empresas que temem possíveis efeitos negativos dessa flexibilização, como a redução da arrecadação e distribuição do dinheiro oriundo da venda de direitos autorais. Ronaldo Lemos é um dos principais nomes no Brasil daquele primeiro grupo, enquanto a ministra Ana de Hollanda, em declarações à imprensa, mostrou-se dentro do segundo.