Foto: Arquivo |
Desvalorização do dólar frente ao real faz preço de importados cair. |
São Paulo – A notícia é boa: há condições para que os preços ao consumidor caiam. O dólar baixo – a moeda atingiu cotação de R$ 1,95 na última semana – diminui a inflação e aumenta o poder aquisitivo dos brasileiros. Mas cuidado na hora de gastar, pois os efeitos do dólar fraco podem levar até três meses para chegar às prateleiras.
O preço final dos importados é, em geral, definido no fechamento do pedido e os produtos só são remarcados quando as novas remessas chegam às lojas. O repasse, no entanto, depende de outras variáveis e pode não ser feito. ?Os preços não dependem apenas da taxa de câmbio, mas da produção?, diz o economista Flávio Godas, da Ceagesp.
Exemplo disto é o salmão. A queda da produção do peixe, no Chile, fez o pescado ficar mais caro no mercado internacional, mas a alta foi compensada com a queda do dólar. Para o consumidor, ficou tudo igual: de R$ 12 a R$ 15 o quilo.
Com a valorização da farinha de trigo no mercado internacional, derivados como biscoitos e macarrão terão os preços mantidos, segundo a Associação Paulista de Supermercados (Apas). ?Já azeites, vinhos e especiarias, que já vinham com boas ofertas, devem ter nova redução de 10%?, diz o vice-presidente da Apas, Martinho Paiva Moreira. ?Isso daqui a três meses, tempo para que os produtos comprados hoje, com o dólar baixo, cheguem às prateleiras.?
Os eletroeletrônicos devem ficar ainda mais baratos, segundo Celina Martins Ramalho, do Conselho Regional de Economia. ?Com mais oferta e concorrência ante os produtos nacionais, a expectativa é de que a redução nos preços de bens duráveis seja, a longo prazo, ainda maior do que a variação do dólar.?
Preço do celular caiu 72% em 3 anos
Se precisa esperar três meses para sentir os efeitos da baixa do dólar desta semana, o consumidor pode conferir, por enquanto, como a moeda americana vem afetando o preço desde 2004, quando começou o histórico de queda. Levantamento feito pelo coordenador do Índice de Preços ao Consumidor da Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas (IPC-Fipe), Márcio Nakane, mostra que o dólar influenciou diretamente o preço de pelo menos 13 produtos dos 525 analisados pelo instituto. A maior diferença é sentida nos eletroeletrônicos.
O telefone celular ficou 72% mais barato, enquanto o videocassete custa hoje 45,7% menos do que há três anos. Alimentos à base de trigo – o macarrão, por exemplo – ficaram com preço até 19% mais baixo. Itens importados, como o bacalhau, custam hoje quase 12% menos do que em 2004.
No caso de celular, computador, impressora e máquina fotográfica, a constante inovação tecnológica torna mais baratos e populares os aparelhos. ?É natural que o preço caia ao longo do tempo?, diz Nakane. ?Mas o dólar em baixa exacerbou este processo.?
O brasileiro passou a gastar menos também na hora de se vestir. Nas camisetas, a redução de preço chega a 4,4%. Pijamas, roupas de bebê e sungas também ficaram mais baratos. Em outras peças, o preço subiu pouco diante da inflação acumulada no período (13,8%), como é o caso do blazer feminino, com aumento de 0,06%.
A queda da moeda americana afeta a inflação brasileira ao tornar mais baratas as peças importadas, usadas na produção de eletrônicos, e ao facilitar a importação de produtos, como roupas, vinhos e bacalhau. Estimula, ainda, a concorrência, já que as empresas brasileiras procuram equiparar o preço dos produtos nacionais ao de importados para conquistar a preferência do consumidor.
Para Nakane, esses efeitos foram sentidos de forma forte entre 2004 e 2005, mas é possível que a inflação continue a acompanhar a queda do dólar. ?Se a moeda americana se mantiver fraca, teremos reflexo nos preços, mas não na mesma magnitude que vimos até agora?, diz o pesquisador.
O levantamento reúne o preço dos produtos analisados a cada quadrissemana (período de sete ou oito dias) pela Fipe. O comparativo dos últimos três anos foi elaborado por Nakane para mostrar o efeito do dólar na formação dos preços.
Temerosos, exportadores antecipam câmbio
Rio (AE) – A despencada do dólar fez o volume de antecipação dos contratos de câmbio ficar US$ 17 bilhões acima da receita normal das exportações nos primeiros quatro meses do ano. É mais do que a diferença entre antecipação e receita em todo o ano passado: US$ 11 bilhões. Este descolamento, diz o diretor de comércio exterior do Banco do Brasil (BB), Nilo Panazzolo, prova que a valorização do real foi ?precificada? pelo mercado, que já esperava que o câmbio furasse a barreira dos US$ 2.
?Essa tendência vem se intensificando. Já estava claro para as exportadoras que o real ia continuar se valorizando?, afirma Panazzolo. De janeiro a abril, segundo dados do Banco Central (BC) e do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior, as exportadoras brasileiras anteciparam contratos de câmbio no valor de US$ 63 bilhões. A antecipação é uma espécie de prevenção do mercado exportador, que contabiliza receita futura para evitar perdas maiores com a intensificação da desvalorização da moeda americana. No mesmo período, as exportações totais brasileiras acumulam receita de US$ 46 bilhões.
O diretor do Departamento de Pesquisas e Estudos Econômicos da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), Paulo Francine, confirma a disparada das antecipações de contratos de câmbio e adverte que esse movimento valoriza ainda mais o real. ?A antecipação gera uma oferta adicional de dólares no mercado, o que faz com que o real se valorize?, afirma Francine.
De acordo com o diretor da Fiesp, o real mais valorizado, independente do exportador gostar desse cenário ou não, faz com que seja melhor a realização do câmbio hoje do que no futuro. Isso porque, na avaliação de Francine, há o temor de que a cotação do dólar ceda ainda mais em relação ao real.