Quem vai ao supermercado toda semana ou uma vez por mês sabe muito bem o valor dos produtos que ?pesam? no orçamento. E para quem resolve fazer algumas extravagâncias de vez em quando colocando no carrinho itens importados, o ?peso? é ainda maior. Mas nos últimos tempos, com o dólar beirando R$ 1,70, comprar algo diferente do habitual, como os importados, já não é motivo de preocupação.
Com a proximidade da Páscoa, alguns tipos de pescado, como o bacalhau, por exemplo, já estão sendo vendidos com preços até 20% mais baratos do que no mesmo período do ano passado. O preço de alguns chocolates também baixaram nesta média. Os valores convidativos já provocaram um acréscimo de até 30% nas vendas nos mercados somente nas duas primeiras semanas de fevereiro.
E o bacalhau é apenas um dos exemplos entre vários produtos importados que estão com os preços bem abaixo do esperado pelo consumidor. Em algumas redes, o quilo do peixe sai por R$ 34 ou até R$ 26, dependendo do tipo. A dona de casa Vanda Valter foi duas vezes ao mercado na última sexta-feira para comprar peixe. ?Comprei para minha patroa tainha e peixe-espada de manhã, e agora à tarde voltei para pegar mais, pois está valendo a pena?, conta ela. Dona Vanda nem estava pensando em comprar bacalhau, mas o preço bem que a atraiu. ?Quem sabe pra Páscoa?, disse. Em alguns mercados, o quilo do salmão inteiro já pode ser encontrado por R$ 12,90, mas já custou R$ 17.
Com a proximidade da Páscoa, os mercados já estão lotados dos tipos mais variados de chocolate. E muitos dos importados também estão chamando a atenção dos consumidores por conta do preço. O casal Rafael Soares e Milene Boçon estava atento à prateleira dos chocolates importados semana passada. ?Estamos pensando em levar, o preço está bom?, disse Milene. Algumas marcas de chocolate suíço, por exemplo, já chegaram a custar R$ 19 por 100 gramas. Na última semana, podia-se comprar por R$ 15 e até R$ 11. Outros tipos (também suíços) estão custando no máximo R$ 6, mas já chegaram a R$ 7. ?Ela não sabe, vou fazer surpresa, mas vou dar de presente o chocolate importado?, revelou Soares.
As frutas importadas também estão atraindo: o quilo de ameixa, pêssego e nectarina importados, que antes custavam cerca de R$ 7, agora podem ser comprados por R$ 4. Alguns vinhos e azeites importados também estão com o preço atraente com a baixa do dólar. Um vinho chileno de grande saída no mercado, por exemplo, que custava R$ 26 há alguns dias, na semana passada podia ser comprado por R$ 19. Já o valor dos azeites de oliva devem ser bem avaliados pelo consumidor, pois alguns não baixaram de preço. Mas há exemplares de algumas marcas que também tiveram o valor reduzido: um litro de alguns tipos de azeite de oliva que custava R$ 64, agora já pode ser encontrado por R$ 25,90. ?Quando o dólar estava mais alto nós não comprávamos tanto produtos importados para comercializar. Agora os clientes estão comprando mais e já há marcas importadas que estão com preços bem próximos dos nacionais?, comentou o encarregado de mercearia de um supermercado, Alcelírio Junior.
Desafio para o País é não ?sufocar? a indústria nacional
O aumento nas vendas de importados vem ocorrendo, mesmo que gradativamente, desde 1994. Em épocas de câmbio flutuante, as vendas diminuíam. Mas hoje o setor está tentando se recuperar e cerca de 5% dos produtos disponíveis nos mercados vêm de fora. Apesar do acréscimo na venda dos importados ser positivo para o consumidor, a longo prazo pode trazer problemas à economia do País.
Na opinião do superintendente da Associação Paranaense dos Supermercados (Apras), Valmor Rovaris, a baixa do dólar representa um grande desafio para o governo brasileiro. ?O desafio será manter a concorrência e não sufocar a indústria nacional?, diz ele. Rovaris comenta ainda que a baixa representa uma grande oportunidade para que os produtos importados caiam no gosto do consumidor.
?Ele consome uma primeira vez, gosta, e depois acaba adquirindo o hábito e mantendo a procura pelos importados?, analisa.
Os comerciantes é que comemoram. ?Vejo o dólar baixo como uma opção diferente ao cliente, que pode ter uma nova experiência de compra. Não vejo pontos negativos nisso?, comenta o gerente regional do grupo Pão de Açúcar, Marcelo Amorin.
Para o economista do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese) Sandro Silva, o quadro atual pode reduzir a competitividade dos produtos do mercado interno, prejudicar as exportações e, indiretamente, pode render demissões nas empresas de produtos brasileiros.
Por exemplo, um produto que custa R$ 100, com o dólar a $ 1,90 vai custar na exportação R$ 52,63. Com o dólar a $ 1,70, o preço seria de R$ 58,52. Ou seja, o exportador pode ser prejudicado. ?Neste caso ou ele reduz o preço, a margem de lucro, ou perde a exportação?, analisa o economista. Conseqüentemente, ao exportar menos, o País passa a produzir menos, uma vez que não necessita de tantos produtos, o que pode levar a um impacto negativo nas indústrias. ?Há a possibilidade de ocorrerem demissões e até fechamento de algumas empresas?, diz Silva.
O economista lembra que a grande ?sorte? do Brasil é o bom desempenho, ainda, do mercado interno. ?Mesmo com esse aumento no valor do produto exportado ainda assim alguns segmentos estão conseguindo se manter. O mercado internacional está aquecido?, comenta. Sem falar que a situação atrai cada vez mais investidores para o Brasil.
?E isto tem um custo para o nosso País. Quando entra muito dinheiro, a tendência é gerar inflação. Aí se emitem títulos e a dívida interna aumenta?, explica. (MA)