Brasília
– O próximo presidente receberá uma herança ingrata do atual governo: o maior nível de endividamento do setor público já registrado na história do País. A dívida líquida do setor público no final deste ano deverá ser equivalente a 59% de tudo o que é produzido pelas empresas nacionais e pelos grupos estrangeiros instalados no País, o Produto Interno Bruto (PIB). Isso, num cenário favorável traçado pelo Banco Central em que a cotação do dólar encerra o ano abaixo dos R$ 3,12.Em julho, a dívida cresceu num ritmo assustador. Foram R$ 2,3 bilhões por dia, R$ 69,1 bilhões em um mês. Com isso, o saldo ficou em R$ 819,4 bilhões, 61,9% do PIB.
Em agosto é prevista pelo Banco Central uma queda do estoque da dívida para cerca de R$ 790 bilhões, 59% do PIB em valores atuais. Para isso, o valor da taxa de câmbio de hoje será fundamental. A projeção do BC foi feita com uma cotação do dólar de R$ 3,12, o que se for confirmada resultará numa valorização do câmbio de 8,94% no mês. Se o valor da taxa for menor, a dívida poderá recuar um pouco mais.
Desde o início do ano, a dívida pública aumentou R$ 158 5 bilhões, praticamente cinco vezes o ajuste fiscal imposto pelo governo à população no mesmo período. De janeiro a julho, o setor público conseguiu arrecadar R$ 32,8 bilhões a mais do que os gastos previstos, sem incluir o pagamento de juros. No mês passado especificamente, esse ganho, conhecido como superávit primário, somou R$ 3,9 bilhões. Esse dinheiro serve para abater a dívida e tentar evitar que ela assuma um comportamento explosivo.
Mesmo com tamanha economia, o governo não tem tido sucesso no controle da dívida. Apesar de o chefe do Departamento Econômico do BC, Altamir Lopes, assim como a cúpula da instituição, insistir que “a trajetória da dívida não é explosiva”, o nível de endividamento do setor público faz acender a luz amarela quando se analisa as perspectivas do País.
“Julho teve um comportamento atípico. Durante a maior parte do mês o câmbio ficou abaixo de R$ 3 e ultrapassou esse valor nos últimos dias”, afirma Lopes. “Se considerarmos a taxa média de julho, a dívida cairia para 57,8% do PIB”, ameniza.
Dependência do dólar
O vilão nessa história toda é realmente o dólar. Como boa parte da dívida está vinculada à moeda americana, o setor público fica vulnerável cada vez que a cotação sobe. No mês passado, os papéis do governo federal atrelados à taxa de câmbio representavam 28,5% da dívida em títulos, o que significa R$ 192,2 bilhões.
Além disso, por causa das turbulências no mercado financeiro, o governo passou a vender contratos de câmbio (swap cambial) aos investidores, o que elevou a exposição do setor público em dólar para R$ 249,9 bilhões.
Fora isso, há ainda a parcela da dívida externa que é convertida para reais na hora de calcular a dívida líquida do setor público. Ao somar tudo, a dívida vinculada ao dólar chega a R$ 448,7 bilhões, mais da metade do endividamento público. Com isso, o sobe-e-desce do câmbio provoca oscilação na dívida.
A vantagem é que, como ela não está vencendo integralmente agora, o País pode se beneficiar de uma queda no estoque da dívida se o dólar recuar. Quanto mais a dívida cresce maiores as chances de o próximo presidente ter de aumentar o superávit fiscal de 2003 estimado em 3,75% do PIB para evitar problemas maiores de administração da dívida já no seu primeiro ano de mandato.