Dez dias depois de o governo ter legalizado a possibilidade de os comerciantes oferecerem descontos para quem paga suas compras em dinheiro, a prática, que já era bastante disseminada informalmente, começa a ganhar mais fôlego, principalmente no pequeno comércio, que em geral tem maior necessidade de dinheiro imediatamente no caixa.

continua após a publicidade

Iraci Suzart Ito, dona da loja Suzart Modas, em São Paulo, disse que a prática do desconto no pagamento em dinheiro melhorou o capital de giro da empresa. “Deixei de pegar empréstimo no banco para quitar as contas do dia a dia”, contou.

continua após a publicidade

Ela adota o desconto desde novembro, um pouco antes de o governo legalizar a prática, para tentar reduzir a dependência de bancos. Na venda no cartão de crédito, diz, é preciso esperar até 40 dias para receber. No cartão débito são dois dias de espera e é cobrada uma taxa de 4% sobre o valor da transação. “A mudança foi boa para mim e para o consumidor”, disse.

continua após a publicidade

Mas nem todos concordam com isso. A Receita Federal – que sempre se posicionou contra essa permissão – teme que a diferenciação seja usada como forma de estimular a sonegação nas vendas à vista em espécie.

“Se o comércio informal dá 10%, 15% de desconto no dinheiro, é porque no fundo não quer pagar impostos. É muito mais do que o custo com o cartão, que pode chegar a no máximo 7%. Nas operações feitas no cartão, o lojista é obrigado a pagar imposto porque a Receita sabe o quanto é a transação”, disse uma fonte do governo que participou das negociações.

“Quando governo permite diferenciar o preço na tabela está dando um tiro no pé na arrecadação”, completou. Oficialmente, no entanto, o órgão disse que “até ajudou a MP, o que dá para inferir que não é contra”.

A medida provisória (MP), publicada no dia 27 de dezembro, permite que o valor cobrado por mercadorias e serviços varie “em função do prazo ou do instrumento de pagamento utilizado”. Em tese, o comércio pode oferecer descontos nas vendas em dinheiro, graças à eliminação do intermediário: as operadoras de cartão de crédito, que ficam com um porcentual de cada transação.

Para Carlos Thadeu de Freitas, chefe da divisão econômica da Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC), o desconto para pagamento à vista em dinheiro deve ficar entre 5% e 10% e ser mesmo oferecido principalmente por pequenos e médios lojistas. “As grandes redes de varejo têm mais poder para negociar um prazo menor para o repasse das vendas”, afirma.

Crítica

As entidades de defesa do consumidor, no entanto, pretender derrubar a MP no Congresso dentro do prazo de 120 dias em que passa a vigorar com força de Lei. Para o gerente de relações governamentais da Proteste, Henrique Lian, o texto da MP permite interpretação dúbia ao dizer ao falar em “diferenciação”, o que permite não apenas o desconto, mas também o sobrepreço. A entidade afirma que os lojistas já embutem atualmente os custos com as operadoras de cartão no preço das mercadorias e que, com a liberação da cobrança diferenciada, vão apenas elevar mais os preços para quem pagar no cartão de crédito.