Um ano depois da quebra do banco de investimentos norte-americano Lehmann Brothers fato que marcou o início da fase mais aguda da crise econômica mundial, ainda ficam mais dúvidas do que certezas nem só quanto ao futuro da economia, mas até quanto ao que realmente aconteceu no mundo, neste período.

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No Brasil e, mais especificamente, no Paraná, as conclusões são mais claras: a crise não atingiu o País com tanta força, afetou, e ainda afeta, alguns setores específicos e já não tem a mesma força que tinha no início do ano.

Essas e outras conclusões foram apresentadas durante a semana, em um debate promovido pelo Conselho Regional de Economia do Paraná (Corecon-PR), que reuniu, na quarta-feira (15) data exata em que a falência do banco norte-americano completou um ano , quatro economistas que atuam no Estado, sendo três deles conselheiros da entidade.

Para eles, a crise também abriu oportunidades para o Brasil, que soube lidar de forma determinante com as dificuldades apresentadas nos últimos 12 meses. Para o economista e supervisor técnico do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese), Cid Cordeiro, um dos pontos positivos mais importantes trazidos pela crise foi a descentralização do debate econômico mundial.

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“As decisões saíram do G-8 e passaram para o G-20”, afirmou, lembrando do papel cada vez mais influente do Brasil nesse grupo. Segundo ele, o País também mostrou rapidez ao reagir à crise, com o governo tomando medidas que foram rapidamente absorvidas pelo mercado interno.

Por outro lado, ele concluiu que a indústria brasileira e paranaense foi bastante afetadas pela crise, sendo os setores automotivo, metal-mecânico, eletro-eletrônico, de madeira e mobiliário e de papel e papelão os mais atingidos.

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“São setores dependentes de financiamento, que ficou mais escasso, caro e de difícil acesso. Não que os demais setores não sentiram a crise, mas nesses ela foi mais intensa”, observou.

O economista Carlos Magno Bittencourt, que também é diretor do curso de Ciências Econômicas da Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUCPR), lembrou da forte pressão que o Banco do Brasil e a Caixa Econômica Federal exerceram na expansão do crédito de veículos e imobiliário.

Para ele, também foi importante o Brasil ter conseguido tornar-se independente do Fundo Monetário Internacional (FMI). “Não precisamos mais seguir a “receita do bolo’ passada por eles”, afirmou.

De acordo com o também economista Jackson Bittencourt, coordenador do curso de Economia da Universidade Positivo, o panorama apontado pelo próprio FMI já mostra que, em 2010 o mundo deve iniciar uma recuperação para, em 2011, apresentar desempenho “bastante positivo”.

Quanto ao Brasil, ele considera que os números da crise vêm resultando em um gráfico em formato de “V’, o que é melhor que os dos Estados Unidos e de países da Europa, por exemplo, em que o formato é de “U’, ou até “L’.

Já o economista Nivaldo Camilo, que também é coordenador do curso de Economia da Fundação de Estudos Sociais do Paraná (Fesp), disse que a grande quantidade de dinheiro colocado em circulação amenizou os efeitos da crise em todo o mundo. Mas fez um alerta: “Ainda é uma incógnita o que vem a partir daí.”

O economista e presidente do Corecon-PR, Luiz Antonio Rubin, encerrou o debate lembrando que as crises econômicas são muito mais comuns do que se imagina, e destacou o lado humano que as atitudes tomadas durante esses períodos devem levar em consideração.

“Além da análise econômica, financeira e técnica, também passa por uma avaliação que esquecemos hoje, que é o tratamento ético das coisas humanas. Toda crise que envolve o ser humano envolve também uma questão ética”, afirmou.

Ao largo

“O Brasil passou ao largo da crise. Foi um dos últimos a entrar e está entre os primeiros a sair”, concluiu o economista Carlos Magno Bittencourt.

Para ele, o Brasil não sofreu ataque especulativo constante, até por conservadorismo dos banqueiros brasileiros.

No fim, ele acredita que a famosa marolinha, indicada pelo presidente Luis Inácio Lula da Silva, foi verdadeira para alguns, mas não para outros.

“As medidas de desoneração tributária, o Estado injetando recursos de forma maciça e os incentivos ao consumo ajudaram o País”, afirmou.

Família ajudou

O economista Jackson Bittencourt acredita que o crescimento da economia nacional no segundo trimestre, que livrou o País de uma recessão técnica, foi puxado justamente pela área mais afetada: a indústria.

Ele lembrou também de um fator importante que propiciou a recuperação, que foi o aumento no consumo das famílias.

Mas mostrou preocupação com a queda da participação do Paraná no Produto Interno Bruto (PIB) em 2008.

“A redução foi fruto também do crescimento da região Nordeste do País, mas de qualquer forma não é interessante para o Estado”, frisou. (HM)

Riquezas

De acordo com o economista Nivaldo Camilo, nem só as ideias do inglês John Maynard Keynes, que voltaram com força durante a crise por defenderem uma maior intervenção do Estado na economia, devem ser levadas em conta.

Ele recordou também do economista francês François Quesnay, para quem a circulação de riqueza e bens na economia é como o sangue circulando no corpo humano.

“Mas pode haver consequências quando pacientes recebem sangue injetado”, ressaltou.

Para ele, se há excesso de moeda, pode haver crise de preços. “Isso significaria um processo inflacionário.”

Desemprego

Para o economista Cid Cordeiro, o maior custo da crise foram os empregos perdidos.

“Só no Paraná foram cerca de 80 mil”, informou. A crise também custou, para ele, um ano de possível crescimento no PIB, que ficou próximo de zero no período, e o tempo de recuperação da capacidade ociosa, o que ainda vem acontecendo.

“O ritmo da recuperação surpreendeu, mas ainda não estamos a salvo de novas situações”, avaliou, lembrando que o Brasil, hoje, é visto de forma diferente. “Passamos a discutir problemas que nos levam para a frente”, observou.