Filho de um lavrador e de uma dona de casa, João Batista Brito Pereira nasceu na zona rural, no interior do Maranhão. Mudou de cidade várias vezes para estudar até chegar a Brasília. Em 1976, passou em um concurso para datilógrafo. O emprego era no Tribunal Superior do Trabalho (TST) e o salário não era dos melhores. Para economizar e conseguir pagar o curso noturno de Direito, ia a pé para a faculdade. Advogou e virou procurador.
Em 2000, retornou ao tribunal onde fora datilógrafo. Dessa vez, como ministro. Daqui a um mês, Brito Pereira mudará novamente de cargo no TST: tomará posse como presidente da instância máxima da Justiça do Trabalho no Brasil.
Eleito em dezembro, Pereira tomará posse em 26 de fevereiro para um mandato de dois anos. O novo presidente do Tribunal é considerado conciliador e advogados acreditam que essa característica será importante para o grande desafio de pacificar o entendimento da Corte sobre a reforma trabalhista, em vigor desde novembro do ano passado. Colegas dizem que a nova presidência pode apaziguar ânimos diante dos relatos de um TST dividido em dois grupos – um de magistrados com posições pró-trabalhador e outro alinhado ao pensamento dos empregadores.
“O ministro Brito Pereira tem tom conciliador e tenta aproximar grupos e opiniões divergentes. Extremamente discreto, ele não deve se apresentar ostensivamente sobre temas polêmicos como a reforma”, diz o professor de direto do trabalho da Fundação Getúlio Vargas, Jorge Boucinhas Filho. Ao destacar a divisão ideológica entre ministros do TST, o professor avalia que o perfil do novo presidente deve reduzir diferenças e fomentar um debate construtivo sobre como o Tribunal se posicionará sobre a reforma trabalhista.
O vice-presidente da Comissão de Direitos Sociais da OAB Nacional, Raimar Machado, concorda e diz que a mudança é pertinente porque Pereira não é vinculado a nenhum dos grupos citados pelos advogados. “O ministro é sabidamente um conciliador, adepto do diálogo e com trânsito entre as diferentes correntes de pensamento. Brito Pereira não se enquadra em nenhuma tendência preestabelecida. É técnico e independente”, diz.
O Estadão/Broadcast procurou João Batista Brito Pereira, mas o magistrado só deve falar publicamente após a posse.
Artigos assinados pelo atual ministro do TST indicam que ele é simpático a alguns pontos da reforma trabalhista. “Tenho a convicção de que o fortalecimento e o crescimento dos sindicatos e da negociação coletiva é fator indispensável para o fortalecimento do direito do trabalho”, defendeu em um livro da Academia Brasileira de Direito do Trabalho, onde ocupa a cadeira 69. Na reforma, acordos ganharam força e podem se sobrepor à lei.
Para permitir essa negociação coletiva, o ministro defende que “sindicatos sejam, de fato, livres, autônomos e independentes”. Nesse desejo, sugere o fim da unicidade sindical – regra que impõe um sindicato por categoria, empresa ou delimitação territorial – e demonstra apoio ao fim do imposto pago às entidades. “Graças à combatida contribuição sindical que retira da entidade sindical o gosto pela conquista do associado e pelas campanhas em favor da filiação. Assim, os sindicatos são contemplados sem esforço”, defendeu na revista do próprio TST em abril de 2002.
Técnico. Apesar da simpatia a algumas mudanças incluídas na reforma, colegas acreditam que Brito Pereira deverá se debruçar sobre a nova legislação com olhar crítico. “O ministro não parece alguém que irá se indispor antecipadamente e pregar a não aplicação da reforma, nem que vá concordar com todas as mudanças”, diz Boucinhas Filho. Esse perfil técnico do novo presidente, diz Raimar Machado, será importante para superar eventuais impasses, especialmente na avaliação de trechos da reforma que podem ser incompatíveis com a Constituição.
Boucinhas Filho chama atenção ainda para o que ele define como “contraponto visível” entre o atual presidente do TST, Ives Gandra da Silva Martins Filho, e o escolhido para sucedê-lo. “O atual presidente teve participação direta nos debates da reforma. O próximo presidente é um homem mais discreto e demonstra ser uma pessoa menos afeita aos holofotes”, diz o professor.
Meses atrás, enquanto a reforma tramitava no Congresso Nacional, um dos argumentos dos defensores do projeto era a perspectiva de menor litígio entre trabalhadores e patrões na Justiça. O tema, porém, parece não despertar preocupação do futuro presidente do Tribunal. “Fala-se muito do ‘crescente demandismo’, porque as pessoas estão recorrendo muito ao Judiciário. Eu gosto disso, porque se o cidadão recorre à Justiça do Trabalho significa que acredita nela”, escreveu em 2014, no livro da Academia de Direito do Trabalho.
Na mesma publicação, o ministro, que, quando criança, ajudava o pai na roça e no engenho de cana-de-açúcar em Sucupira do Norte, também fala com orgulho de sua trajetória. “Imagine você prestar concurso para datilógrafo no TST, em 1976, exercer o cargo até 1982, e, no ano de 2000, voltar para o Tribunal no cargo como ministro. O mundo tem sido muito bom para comigo.” As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.