Crise global já afeta empresas no Paraná

Os reflexos da crise na economia internacional já estão mais evidentes do que muita gente imagina. Na última semana, a reportagem de O Estado conversou com empresas de diversos segmentos e constatou que os impactos já são visíveis, e que a crise já influencia incisivamente na vida financeira do consumidor em geral. A dificuldade de se conseguir financiamentos e a queda da demanda internacional têm sido os principais pontos relatados pelas empresas. Várias empresas estão programando férias coletivas, como é o caso das montadoras instaladas no Paraná que vão parar entre dezembro e janeiro períodos que vão de 15 a 20 dias.

Para o setor produtivo, a maior preocupação vem confirmando as projeções pessimistas, por causa da falta de crédito verificada no mercado de investidores. Com a falta de recursos, e com a diminuição do poder de compra de clientes de grande porte, os produtores de insumos já colocam o pé no freio.

A dificuldade dos clientes em concretizar o financiamento, tem feito com que os equipamentos produzidos pela empresa fiquem parados até que o crédito se confirme na conta da empresa.

Segundo o diretor técnico da Technoblock do Brasil (empresa que trabalha com sistemas de refrigeração), Nelson Millani, as instituições financeiras vêm segurando os recursos por conta da instabilidade na economia. Millani explica que a empresa atua com clientes que precisam de grandes investimentos para equipar o sistema logístico – geralmente corporações do setor da agroindústria. “Com a morosidade dos financiamentos, nosso segmento quase parou. Estamos praticamente sem serviço agora.”

A solução mais imediata, segundo Millani, foi optar por férias coletivas. Segundo ele, a produção da empresa, que chegou a 90% da capacidade instalada nos meses de agosto e setembro, está parada.

Millani conta que o momento turbulento frustou as expectativas positivas de produção para este ano, já que a empresa investiu R$ 700 mil para produzir os equipamentos em São José dos Pinhais, na Região Metropolitana de Curitiba, a partir de janeiro. “Vínhamos muito bem até setembro, com uma produção muito acima do que foi verificado no ano passado”, diz. Com o investimento do último ano, a previsão era produzir três vezes mais do que o que foi comercializado em 2007.

Porém, Millani afirma que a empresa deve fechar o ano com apenas dois terços do volume esperado. Outra empresa que deve optar pelas férias coletivas é a Perfimec – atuante no segmento de aço. De acordo com o diretor administrativo comercial da empresa, Ivo H. Wolff, a fábrica deve paralisar as atividades no próximo dia 12 e voltar apenas no dia 5 de janeiro. “A grande maioria dos nossos clientes também deverá utilizar a mesma alternativa.”

Wolff afirma que a demanda tem caído invariavelmente para todos os segmentos para os quais a empresa fornece os insumos, principalmente para os do ramo de metal mecânica e de implementos agrícolas e rodoviários. “Tivemos 40% de queda na produção, em relação à media dos meses anteriores.”

Wolff acredita que, além das dificuldades de financiamento, as empresas, principalmente as exportadoras, reduziram a produção. Segundo ele, a demanda internacional decaiu bruscamente nas últimas semanas. “Isso faz com que o nosso ritmo de produção também decaia, já que trabalhamos com insumos utilizados para a produção dessas empresas.”

Câmbio

Com a valorização do dólar verificada nas últimas semanas, grande parte das corporações que trabalham com produtos importados vêm assistindo a sucessivas perdas na margem de lucro. A Sofhar, empresa do ramo de software e informática, sente isso na pele.

O diretor presidente da Sofhar, Wilmar Prochmann, explica que, como a empresa trabalha com licitações, o valor do produto o,ferecido durante o processo licitatório fica defasado com uma oscilação muito grande da moeda americana.

Prochnann explica que no preço proposto na licitação são previstos os custos e a margem de lucro. Com a variação brusca, a empresa pode perder inclusive a margem de lucro. “Isso porque o processo demora e até o pagamento do contrato o dólar já se alterou. Obviamente, o cliente não vai pagar a diferença da variação”, afirma. Prochmann conta que a empresa tem perdido cerca de 30% no faturamento nos dois últimos meses.

Por outro lado, para o presidente da Sofhar, a alta do dólar pode favorecer o mercado interno, não só da área de software, mas também de outros segmentos, já que o produto nacional fica mais competitivo.

Na última sexta-feira, o dólar fechou cotado a R$ 2,46.

Cenário otimista

Mesmo com um panorama desfavorável para investimentos, grande parte dos executivos mantém perspectivas positivas para os próximos meses. Para o diretor técnico da Technoblock do Brasil, Nelson Millani, a expectativa é de que a economia retome a tendência de crescimento dos meses anteriores à crise e, conseqüentemente, os clientes voltem a investir.

“Sentimos que o Brasil não vai parar os investimentos e vai crescer mais do que perder”, diz Millani. Para ele, o País deve ganhar mercado com a falta de dinheiro no exterior.

Para Millani, o momento de dificuldade é normal em meio à crise e não há necessidade de desespero. “Essa é uma época em que o investidor pára para pensar mais por precaução, devido a incerteza do retorno dos investimentos”, afirma.

Já o diretor administrativo comercial da Perfimec, Ivo H. Wolff, espera um cenário mais claro já no final de fevereiro. “Temos projeto de expansão com a implantação de uma nova unidade de produção. Acreditamos que essa crise é temporária e tudo deve estar normalizado dentro de 60 dias, talvez não em patamares que estávamos, mas com certeza com desempenho positivo da produção.”.

Preocupação é com o desemprego

Chuniti Kawamura
Bernt Entschev: crise mudou o perfil do profissional.

Outro ponto que desperta grande preocupação da sociedade em relação à crise é a possibilidade de acentuação do desemprego. Para o consultor de recursos humanos Bernt Entschev, a queda na produção de vários segmentos deve significar cortes de pessoal.

Entschev relata que as empresas do ramo de RH também já estão sentido os reflexo da crise no caixa. Segundo ele, dependendo da atuação do empregado, as empresas perdem muito mais do que simplesmente um bom funcionário. Entschev explica que a empresa de consultoria em que atua oferece cursos de qualificação e que já está diminuindo a procura por esse quesito pelas empresas. Segundo ele, as corporações estão preferindo esperar para contratar um profissional mais qualificado. “Os custos de qualificação muitas vezes são caros e fica inviável contratar para logo depois demitir.”

No entanto, para Entschev, é justamente a falta de qualificação que pode potencializar os níveis de desemprego. O consultor conta que já há 1,2 milhão de novos desempregados que, por falta de qualificação, deixam de preencher as mais de 1 milhão de vagas que estão a espera de profissionais qualificados em falta no mercado.

Se por um lado o desemprego é inevitável, por outro o número de vagas ofertadas têm aumentado. É o caso dos altos executivos.

Bernt Entschev conta que, com a crise, o que mudou foi o perfil exigido dos profissionais. Segundo o consultor, o mercado passou a valorizar ainda mais o profissional angariador de recursos, que consegue alongar prazos. “Outro perfil valorizado é o do bom administrador de crise, que sabe otimizar recursos quando o cenário é positivo”, afirma.

Entschev acredita que a tendência é de que os cargos desempenhados por mais de um profissional poder&atild,e;o se fundir num só. “Além de uma medida de diminuição de custos, a concorrência deve selecionar o mais dinâmico, que naturalmente deve acabar acumulando as funções.”

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