A produção de gás na Bolívia "está no limite", o que impossibilita ao país cumprir o contrato com a Argentina e o Brasil, advertiu hoje o gerente de Coordenação e Estratégica da Câmara Boliviana de Hidrocarbonetos, Yussef Akly. Enquanto isso, a Argentina busca "alternativas" a esse combustível para evitar uma crise energética que pode repercutir no Chile.
A Bolívia "está trabalhando para aumentar essa produção para atender a demanda argentina", disse Akly à radio Mitre de Buenos Aires, lembrando que fazer isso "leva bastante tempo, até as reservas chegarem ao mercado, temos que colocá-las para produzir".
A atual produção boliviana de gás ronda os 40 milhões de metros cúbicos diários, que subirão este ano para 42 milhões, enquanto a demanda do mercado externo e interno está por volta dos 46 milhões de metros cúbicos por dia.
La Paz envia entre 27 e 30 milhões de metros cúbicos diários de gás ao Brasil e tem vigente um acordo para exportar 7,7 milhões de metros cúbicos para a Argentina, embora atualmente o fluxo se limite a cerca de três milhões de metros cúbicos.
Argentina busca alternativas
A presidente argentina, Cristina Fernández de Kirchner, negou ontem a existência de uma crise energética em seu país, ainda que analistas advirtam sobre riscos de cortes que afetem a indústria e as residências.
Nesta quarta-feira, em Buenos Aires, o chefe de Gabinete, Alberto Fernández, disse que o governo argentino "já está trabalhando" para buscar alternativas ao combustível boliviano.
"Se não temos o gás da Bolívia teremos que buscar alternativas, como fizemos em anos passados. Temos a tranqüilidade de que certamente poderemos dar a cada um a energia necessária", assegurou o ministro.
"Temos um problema que é de toda a região: Brasil, Bolívia, Chile. Este [Chile] objetivamente tem maiores dificuldades do que nós tem porque não tem gás. Além disso, o fornecedor, que éramos nós, nem sempre estamos nas melhores condições", comentou Fernández.
Chile tem cenário "zero gás"
No Chile, o especialista Francisco Aguirre, da empresa Electroconsultores, afirmou à ANSA que "o cenário com que tecnicamente avaliamos e tomamos decisões de investimento é de zero gás argentino, zero gás boliviano e independência energética. Essa política nosso país não conta, mas é a que os especialistas acreditam que o Chile deve seguir olhando para o futuro".
Diante das declarações de Argentina e Bolívia, Aguirre disse que "para nós, técnicos, esse tema é absolutamente insensível".
"Não estamos contando nem com gás boliviano nem argentino. Politicamente o Chile tem que seguir exigindo que Buenos Aires respeite o Protocolo Gasífero de 2005, mas sabe que não pode contar com a Bolívia há dois anos, pois o país tem decretos específicos que impedem que os volumes de gás que entrega à Argentina venham ao Chile", explicou o especialista.
O Protocolo Gasífero estabelecia o envio de 25 milhões de metros cúbicos diários ao Chile, dos quais 15 milhões estavam destinados à geração elétrica. Atualmente o país recebe pouco mais de 1 milhão de metros cúbicos, que se destinam a abastecer os lares e o comércio menor de Santiago, cifra considera "uma miséria" por Aguirre.
Crise regional
O alarme se intensificou depois que o vice-presidente da Bolívia, Álvaro Garcia Linera, admitiu que La Paz não poderá cumprir com os compromissos assumidos com a Argentina em curto e médio prazo.
No último dia 23 de fevereiro, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva se reuniu, em Buenos Aires, com Cristina e o presidente da Bolívia, Evo Morales, mas o encontro não gerou nenhum acordo para solucionar os problemas na repartição de gás.
Após a reunião, o chanceler argentino, Jorge Taiana, anunciou que os chefes de Estado formarão um grupo coordenador de ministros de áreas energéticas para analisar "a evolução" das "demandas de energia" e acompanhar "o crescimento sustentado das economias" desses países.