Crise afeta vida de brasileiros no Japão

Pelo menos 30 mil dekasseguis (brasileiros descendentes de japoneses com emprego temporário no Japão) podem estar em dificuldades financeiras naquele país em razão da crise econômica mundial. Bem longe dos tempos em que tentar a vida no Japão podia abrir um leque de possibilidades para os descendentes, a crise tem alterado os planos dos 300 mil dekasseguis que vivem lá, dos quais cerca de 80 mil são paranaenses. Todos eles enviam para o Brasil algo em torno de US$ 2 bilhões por ano, sendo que US$ 600 milhões são para o Paraná.

O Japão passa hoje por um momento econômico que, se não é o pior, está bem próximo da recessão pós-Segunda Guerra Mundial. A avaliação é do coordenador estadual do Programa Dekassegui Empreendedor e do consultor do Serviço de Apoio às Micro e Pequenas Empresas do Paraná (Sebrae-PR), Marcos Aurélio Gonçalves.

Os setores que mais absorviam mão-de-obra estrangeira no Japão, o automobilístico e o eletroeletrônico, são também hoje os que mais demitem. “Está havendo um deslocamento desses setores para a área de alimentos e turismo, como hotéis”, avisa Gonçalves. O lado negativo é que são setores com remuneração menor, com variação de 20 a 30% menos. Segundo Gonçalves, as prefeituras também têm aberto vagas para estrangeiros, desde que tenham domínio da língua japonesa.

O impacto na mão-de-obra estrangeira apenas foi acelerado com o quadro recessivo que apareceu a partir de novembro do ano passado. “As demissões e as escassas ofertas de emprego já aconteciam desde maio de 2008. A partir de novembro, começaram as demissões em massa, muito por conta da divulgação da crise e também pela reprogramação da produção industrial japonesa”, avalia o consultor do Sebrae. No Japão, a produção e a consecutiva contratação de trabalhadores – é reprogramada a cada três meses.

Como o ano fiscal no Japão se encerra em 31 de março, a expectativa é que haja um novo cenário a partir de abril, embora sem otimismo exagerado. “Espera-se que haja uma retomada ou pelo menos um cenário diferente na oferta de empregos no Japão, mas muito distante de se imaginar um patamar semelhante ao de dois anos atrás”, afirma Gonçalves.

Não existe um percentual claro, nem para o próprio governo do Japão, do acréscimo ou decréscimo da mão-de-obra estrangeira que o país possa vir a precisar nos próximos anos, segundo o consultor. “A população japonesa envelhece rapidamente e novos postos de trabalho não são ocupados. Com ou sem crise, eles vão precisar de estrangeiros, mesmo sem saber claramente qual vai ser essa porcentagem”.

Conforme explica Gonçalves, os trabalhadores estrangeiros funcionam como um colchão de amortecimento para a economia japonesa. “É um plano do governo a criação de um ‘colchão’ de trabalhadores com regime próprio, diferente do trabalhador japonês, composto por descendentes não só brasileiros, mas também tailandeses e indianos, por exemplo, que funcionam como amortecedor em momentos de crise”. Assim, as demissões ocorrem primeiramente nesse colchão, para tentar amenizar o desemprego na sociedade japonesa. “O problema é que desta vez esse colchão furou e atingiu os japoneses. É isso que tem preocupado o governo japonês”, completa.

Sonho de riqueza fica cada vez mais distante

Menos de um ano atrás, eram centenas os dekasseguis que saíam do Brasil com emprego garantido no Japão. Foi o caso do paranaense Fábio Miúra, que ficou por lá durante três anos. Ele mesmo reconhece que esse cenário está bem diferente agora. “A aceitação está bem difícil porque não há mais contratação. É muito difícil alugar um apartamento, por exemplo. É inviável ir e se aventurar”, opina.

No caso de Miúra, ele n&a,tilde;o voltou ao Brasil por causa da crise, mas reconhece que, se pretendesse ficar mais tempo no Japão, seria obrigado a voltar de qualquer jeito. “Desde novembro do ano passado as agências de emprego não estavam mais cadastrando estrangeiros e dificultou até para os japoneses, porque as agências nem atendiam mais o telefone”, lembra.

Em conversa com amigos que ainda estão no Japão, Miúra acha que os próximos meses não devem ser muito animadores. “Minha antiga empresa, do setor de autopeças, está oferecendo US$ 2 mil para quem quiser pedir demissão voluntária e voltar para seu país de origem”, conta o paranaense.

Consultoria

Com o retorno antecipado ao Brasil, muitos brasileiros têm recorrido ao Programa Dekassegui Empreendedor, parceria do Sebrae com a Associação Brasileira de Dekasseguis, que orienta descendentes japoneses que voltam ao Brasil e planejam abrir um pequeno negócio. O número de atendimentos do Sebrae em janeiro cresceu 30%.

O Sebrae nacional também pretende disponibilizar uma linha telefônica gratuita para os dekasseguis no Japão, por meio da qual os trabalhadores poderão se informar sobre o Programa Empreendedor, gestão empresarial e empreendedorismo. O serviço encontra-se em fase de licitação e deve entrar em operação ainda neste semestre.

Até maio, o Sebrae espera lançar o guia “Voltando para o Brasil”, material com informações úteis para os dekasseguis, tendo em vista os efeitos da crise internacional sobre os negócios no Brasil. Em Londrina e região, o atendimento começa no início de março. Mais informações sobre o programa pelo site: www.dekassegui.sebrae.com.br.

Procura por seguro-desemprego disparou

Com a crise mundial afetando os trabalhadores brasileiros no Japão, a busca pelo seguro-desemprego por lá disparou. A estimativa do Serviço de Assistência e Informação para Trabalhadores Nikkeis (Saitran) é que a procura tenha crescido cerca de 500% nos últimos meses.

Para enfrentar esse momento delicado da economia mundial, o mercado japonês, assim como boa parte do mundo, exige cada vez mais trabalhadores qualificados. Aqueles que ainda pensam em tentar a vida no Japão devem dominar a língua japonesa, que é um dos pontos-chaves apontados pelo consultor do Sebrae-PR para obter sucesso naquele país.

Para quem já está lá, a dica é procurar cursos de aperfeiçoamento oferecidos por organizações não-governamentais e pelo próprio governo japonês. Estar aberto a diferentes tipos de trabalho também pode ajudar, já que tem aumentado a diversificação de empregos. Segundo informações do Saitran, ainda há possibilidade de abranger trabalhadores estrangeiros em trabalhos diferentes dos habituais, principalmente nos setores agrícola, silvícola e na pecuária.

Além disso, de acordo com o nível de conhecimento da língua japonesa, há possibilidade de emprego fora das fábricas. Para prestar auxílio, a Agência Publica de Emprego (Hallo Work) divulgou recentemente que será investido no treinamento profissionalizante de língua japonesa aos desempregados estrangeiros.

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