O comprometimento da renda das famílias com os juros e a amortização de empréstimos saltou de 19,8% em dezembro de 2010 para 22,7% no mesmo mês de 2011, segundo projeção do Credit Suisse.

continua após a publicidade

Em recente relatório, o banco aponta que o comprometimento da renda é provavelmente uma das causas do aumento da inadimplência (mais de 90 dias) da pessoa física de 5,8% no primeiro trimestre de 2011 para 7,6% em janeiro e fevereiro de 2012. A inadimplência em alta, por sua vez – a média desde junho de 2000 é de 7% -, aumenta a percepção de risco dos bancos, o que pode ter impactos nos spreads e nos volumes de crédito concedidos.

“O cenário mais provável hoje é a expansão do crédito à pessoa física ser menor e o comprometimento de renda com juro e amortização tende a aumentar”, resume Nilson Teixeira, economista-chefe do Credit Suisse.

No relatório, o banco alerta que qualquer recuo do alto comprometimento da renda das famílias com juros e amortização do crédito pessoal depende da redução dos spreads bancários e do aumento do prazo médio das operações. Além disso, nota que a alta inadimplência pode dificultar a aceleração do crédito nos próximos meses, reduzindo as chances de uma retomada econômica mais forte no curto prazo.

continua após a publicidade

Para dezembro de 2012, o Credit Suisse projeta que o comprometimento da renda das famílias com o serviço do crédito pode variar entre uma ligeira queda e um forte aumento. No melhor cenário, ele recua para 22,4%. Mas isso supõe a redução dos juros médios de cada modalidade da pessoa física para o nível de outubro de 2010, o menor da história, e uma elevação do prazo médio da mesma dimensão da ocorrida em 2008.

Num cenário menos otimista, com estabilidade dos juros e do prazo médio de todas as modalidades no nível do fim de 2011, o comprometimento daria mais um salto, para 23,7% da renda em dezembro de 2012.

continua após a publicidade

Em fevereiro, mesmo com a trajetória de queda da Selic (juro básico), a taxa média anual dos empréstimos a pessoas físicas subiu de 45,1% para 45,4%.

Carlos Kawall, economista-chefe do banco J. Safra, recorda que “a taxa de juros e os spreads (do crédito à pessoa física) subiram violentamente quando o BC adotou as medidas macroprudenciais no fim de 2010”.

Posteriormente, ele acrescenta, essas taxas iniciaram um movimento de queda, mas ainda estão em nível bem superior ao do fim de 2010. Ele observa ainda que o crescimento da inadimplência das famílias em 2011 aconteceu mesmo com um mercado de trabalho espetacular e a renda em alta.

Para Kawall, “houve um excesso na concessão de crédito para a pessoa física e agora a gente vive um pouco a ressaca, o que limita o potencial de crescimento da economia no curto prazo”.

O economista Samy Dana, doutor em Administração e professor da Escola de Economia de São Paulo (EESP) da Fundação Getúlio Vargas (FGV), especialista em finanças pessoais, observa que o Brasil tem um dos maiores spreads (diferença entre os juros de captação do banco e dos empréstimos) do mundo. Combinadas com a falta de educação financeira dos brasileiros, as altíssimas taxas das linhas de crédito contribuem para

os excessos.

“As pessoas não sabem usar o crédito de forma saudável, e pensam muito no valor da parcela, sem questionar os valores totais”, diz Dana.

Um exemplo de como os brasileiros se enredam com crédito excessivo é o do músico Gilberto de Syllos, 44 anos, que foi assessorado por Dana para sair da armadilha de um cartão de crédito que subiu de contas mensais de R$ 300 para R$ 11 mil. Contando outras linhas, ele chegou a dever R$ 20 mil.

“Quando vi que estava pagando no cartão R$ 1.800 de juros, isto é, de nada, eu vi que tinha de dar um jeito”, diz Syllos, que toca contrabaixo, mora entre São Paulo e Campinas e dá aula na Faculdade de Música Souza Lima, nos Jardins. Sana o orientou a priorizar a quitação da dívida cara do cartão, o que ele conseguiu fazer no fim do 2011.

Um dos sinais preocupantes da evolução recente do crédito é justamente que as modalidades mais caras, como cheque especial e cartão de crédito, tiveram um impulso maior do que o crédito para a aquisição de veículos, que é uma linha mais barata com papel importante no boom de empréstimos à pessoa física nos últimos anos. As concessões de crédito imobiliário recuaram desde dezembro, mas depois de forte salto a partir de setembro.

A média diária de concessões de crédito para aquisição de veículos caiu de R$ 436 milhões em novembro de 2011 para R$ 381 milhões em fevereiro, e o nível atual é praticamente o mesmo do início de 2011. Já a média diária do cheque especial caiu de R$ 1,310 bilhão para R$ R$ 1,229 bilhão entre outubro e dezembro, mas voltou a subir para R$ 1,264 bilhão em fevereiro. Em janeiro de 2011, ela estava em R$ 1,141 bilhão. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.