O Comitê de Política Monetária do Banco Central (Copom) conseguiu a proeza de surpreender o mercado na reunião de ontem. Não exatamente pelo aumento do juro, de 0,5 ponto porcentual (que era a hipótese menos aguardada), passando de 16,25% para 16,75%, mas porque conseguiu tomar a decisão mais conservadora por unanimidade. “Ninguém acreditava que haveria unanimidade em torno do 0,5 ponto”, observa um operador. Na reunião passada, quando o Copom retomou o ajuste da taxa Selic, o placar ficou dividido, com 3 votos a favor de uma alta de 0,5 ponto e 5 pela alta de 0,25 ponto. E, desta vez, o mercado acreditava que haveria uma divisão parecida.

Após a reunião, o Comitê divulgou a seguinte justificativa: “Dando prosseguimento ao processo de ajuste moderado da taxa de juros básica, iniciado na reunião de setembro, o Copom decidiu elevar, por unanimidade, a taxa Selic para 16,75% ao ano, sem viés”. Este é o segundo mês consecutivo em que o Banco Central aumenta a taxa, que vinha sendo mantida em 16% desde abril. Em setembro, a taxa foi elevada em 0,25 ponto percentual. Essa é a taxa mais alta desde a reunião do dia 19 de novembro de 2003, quando foi fixada em 17,50% ao ano.

Na opinião dos profissionais do mercado, tanto a unanimidade dos integrantes do Copom quanto a opção por uma decisão mais conservadora devem reforçar a credibilidade do Banco Central e dissipar as dúvidas a respeito de eventuais pressões políticas nas decisões sobr e a Selic. “A dúvida sobre a autonomia do BC para elevar o juro com mais força ajudou a limitar as apostas para a reunião de hoje”, afirmou um operador, referindo-se ao fato de que boa parte dos analistas que apostavam em alta de 0,25 ponto defendia um aumento maior.

Como conseqüência da decisão de hoje, operadores apostam que a curva mais curta de juros futuros deve subir, já que os prêmios não embutiam integralmente essa idéia. Mas, no longo prazo, é possível que as taxas caiam, mostrando a melhora da credibilidade do Banco Central.

A Selic

A Selic é a taxa de juros que o governo se compromete a pagar quando toma dinheiro emprestado no mercado interno. Essa taxa é estabelecida mensalmente, pelo Copom. Ao calcular a Selic, o Copom leva em consideração diversos fatores, entre eles a previsão da inflação futura (próximos 30 dias) e as tendências momentâneas de queda ou elevação dos preços da economia (inflação passada).

As condições da economia internacional também são consideradas. Se há excesso de dinheiro no mercado internacional (liquidez internacional) ou se há falta de dinheiro. Se há muito ou pouco dinheiro circulando no mercado interno (liquidez interna) e também a necessidade de financiamento das contas públicas (se o governo tem pouco ou muito dinheiro em caixa para honrar seus compromissos).

Jaques Wagner: “Aumento não é boa notícia”

O ministro-chefe do Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social (CDES), Jaques Wagner, disse que o aumento da taxa Selic, de 0,50 ponto porcentual, “não é boa notícia”. “Nunca é bom os juros subirem, é sempre ruim. Vamos aguardar os esclarecimentos da ata”, disse ele. Para Wagner, com os esclarecimentos da ata ficará mais fácil para a sociedade entender as razões do aumento. “Lastreando com razões que justifiquem, a gente não gosta do aumento. Mas o aceita”, afirmou. Para Wagner, o conjunto de variáveis que levam o Banco Central a elevar os juros pode também auxiliar o País a continuar seu ciclo de crescimento. “Para termos o crescimento em médio e longo prazos, algumas vezes temos de perder no primeiro momento”, alegou.

Ele admitiu ainda que representantes da sociedade civil que participam do CDES deverão se queixar no próximo encontro. Mas reiterou, de novo, que a ata do Copom poderá diminuir a insatisfação dos conselheiros. “Não é um conselho de aplausos, mas de debate e as queixas são compreensíveis. Mas tenho dito aos conselheiros que não pensem apenas naquilo, como diz o dito popular”, argumentou.

Empresários lamentam decisão do Copom

O presidente em exercício da Confederação Nacional da Indústria (CNI) e ex-presidente da Fiesp, Carlos Eduardo Moreira Ferreira, lamentou a decisão do Comitê de Política Monetária (Copom) de elevar em 0,5 ponto porcentual a taxa básica de juros, afirmando que “ela é danosa para a produção e cria problemas par os investimentos”. “Eu acho que nós não podemos compartilhar essa visão do Copom quanto à necessidade de aumentar os juros”, afirmou Moreira Ferreira. “Só podemos lamentar a decisão. Na nossa visão, o que a economia brasileira está enfrentando não são pressões inflacionárias decorrentes do excesso de demanda”, disse.

Ele lembrou que, “algum tempo atrás, a inflação tinha mostrado certa renitência por problemas de choques de oferta”. Mas ponderou que “hoje não existem pressões que justifiquem essa visão (do Copom)”. Na opinião do presidente em exercício da CNI, a melhor decisão teria sido “manter a taxa ou até diminuir”.

Fiesp

O presidente da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), Paulo Skaf, questionou a decisão do Banco Central de manter juros elevados em um mercado ainda distante de risco de inflação de demanda. Segundo ele, a melhor solução para evitar a alta de preços, refreando pressões inflacionárias, seria estimular investimentos para aumentar a oferta, a produção e criar mais empregos. Skaf defendeu ainda a participação dos empresários e dos trabalhadores nas decisões nacionais.

Fecomércio

A Fecomércio (Federação do Comércio do Estado de São Paulo) ressalta o caráter negativo do aumento da Selic. “Os efeitos da elevação e mesmo da interrupção da trajetória de queda da Selic já podem ser notados. As taxas ao consumidor final voltaram a subir. O volume de crédito e os prazos de financiamento pararam de melhorar. Inevitavelmente, o comércio sofrerá com isso”, afirma o presidente da Fecomercio, Abram Szajman. De acordo com ele, as conseqüências das altas consecutivas da Selic neste segundo semestre poderão provocar uma desaceleração do crescimento do setor.

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