O Copom (Comitê de Política Monetária, do Banco Central) resolveu atender a apelos de empresários, políticos e até do Palácio do Planalto e, após nove meses consecutivos de alta, decidiu, ontem, manter a taxa básica de juros da economia, a Selic, em 19,75% ao ano. A decisão foi unânime entre os integrantes do Copom, e não surpreende o mercado financeiro, já que a maior parte apostava na manutenção.
Nas atas das últimas reuniões, a justificativa da autoridade monetária para as altas era a persistência da inflação. No entanto, o IPCA (Índice de Preços ao Consumidor Amplo, do IBGE) deu fortes sinais de desaceleração em maio, quando ficou em 0,49%, contra 0,87% no mês anterior.
Há também uma queda nas expectativas de inflação por parte do mercado, que está em 6,21%. Ainda está acima do objetivo do BC, que é uma inflação de 5,1% medida pelo IPCA (Índice de Preços ao Consumidor Amplo), mas já é menor do que expectativas anteriores.
O IPCA é o indicador usado pelo governo para a meta de inflação, que, segundo a margem de tolerância fixada pelo BC, pode chegar a até 7% neste ano.
Justificativas
Mesmo com a interrupção do ciclo de altas, o BC ainda deve sofrer críticas por ser considerado o responsável pelo desaquecimento da economia.
No ano passado, o PIB (Produto Interno Bruto) teve um crescimento de 4,9%, o maior desde 1994. No entanto, o crescimento no primeiro trimestre de 2005 foi de apenas 0,3% na comparação com o trimestre anterior. Já a produção industrial, que no ano passado cresceu 8,3%, ficou estável em abril na comparação com março.
Após a divulgação do resultado do PIB, o Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica e Aplicada) reduziu a projeção de crescimento deste ano de 3,5% para 2,85%.
O fim do processo de alta dos juros deve agradar parcialmente a empresários, sindicalistas e a classe política em geral, que vêm pressionando fortemente o BC nos últimos meses.
A justificativa para a decisão da reunião de ontem será conhecida no dia 23, quando será divulgada a ata da reunião de hoje.
Anomalia
O presidente do Sistema Federação das Indústrias do Estado do Paraná (Fiep), Rodrigo da Rocha Loures, disse ontem que os brasileiros não têm o que comemorar com a decisão do Comitê de Política Monetária do Banco Central (Copom) de manter a taxa Selic em 19,75% ao ano. ?Temos é que intensificar um movimento, de toda a sociedade, para derrubar esse modelo econômico que só contempla o setor financeiro. É preciso acabar com a anomalia de uma nação sujeita a viver para pagar juros. Assim não há solução à vista para o País?, afirmou.
Segundo Rocha Loures, ao manter os juros que decide pagar em patamares tão elevados, o governo incentiva uma ciranda perigosa para o País, ?a da estabilidade sem crescimento, nem investimento?. ?Com essa política, o governo federal arrecada cada vez mais e dá cada vez menos, já que tem que arcar com o ônus de uma dívida imposta pela própria máquina pública. Nos últimos 10 anos, o pagamento de juros cresce firme e sistematicamente, em prejuízo a todos os setores produtivos da sociedade e, assim, os investimentos cessam?, disse.
Outro que considera a decisão do Copom ?tardia? é o presidente da Abiesv (Associação Brasileira da Indústria de Equipamentos e Serviços para o Varejo), Marcos Andrade. Segundo ele, a decisão (de segurar a taxa básica de juros) ?é tardia, mas renova as esperanças do setor varejista para o segundo semestre de 2005?.
Segundo o empresário, se houver reflexo na ponta, ou seja, diminuição das taxas de financiamento no médio prazo, é possível que o desempenho das empresas que fornecem equipamentos para lojas seja melhor do que o inicialmente previsto para este ano.
Decisão não surte efeito no curto prazo
A decisão do Copom (Comitê de Política Monetária, do Banco Central) de interromper o ciclo de altas dos juros após nove aumentos consecutivos ajuda a reduzir a deterioração do cenário econômico. Depois das nove altas seguidas, a economia brasileira já começou a dar sinais de desaquecimento.
Para o economista da Fipe (Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas, da USP), Paulo Picchetti, a manutenção do juro básico (Selic) não tem grande efeito na economia no curto prazo, pois a taxa de 19,75% ao ano continua alta, mas colabora com as expectativas em relação ao futuro.
Ou seja, com a estabilidade da Selic, o mercado começa a especular sobre quando o Copom voltará a reduzir a taxa, o que pode provocar um recuo nas projeções dos juros futuros.
A expectativa de juros menores no futuro ajuda as empresas nas suas decisões de investimentos porque abre a possibilidade de os financiamentos ficarem mais baratos e estimula o crescimento da economia.
Selic
Selic é a sigla para Sistema Especial de Liquidação e Custódia, criado em 1979 pelo Banco Central e pela Andima (Associação Nacional das Instituições do Mercado Aberto) com o objetivo de tornar mais transparente e segura a negociação de títulos públicos.
O Selic é um sistema eletrônico que permite a atualização diária das posições das instituições financeira, assegurando maior controle sobre as reservas bancárias.
Hoje, Selic identifica também a taxa de juros que reflete a média de remuneração dos títulos federais negociados com os bancos.
A Selic é considerada a taxa básica porque é usada em operações entre bancos e, por isso, tem influência sobre os juros de toda a economia.