Cooperação se destaca como alternativa contra a crise

Introduzido no século XIX pelos imigrantes que se estabeleceram no Paraná, o cooperativismo tem cada vez mais atraído adeptos. Seja pelo modelo de ajuda mútua e responsabilidade que prega, ou pela perspectiva de resultados mais expressivos quando se trabalha em conjunto. Para muitos segmentos, o cooperativismo também surge como uma alternativa para vencer a crise. E os números provam isso.

Somente as 228 cooperativas registradas no Sindicato e Organização das Cooperativas do Estado do Paraná (Ocepar) – de um total de 3.005 registradas na Junta Comercial do Paraná – faturaram R$ 16,5 bilhões em 2005. No mesmo período, elas participaram de 18% do Produto Interno Bruto (PIB) do Paraná, e 55% do PIB brasileiro. Em 2004, essas sociedades cooperativas exportaram perto de US$ 1 bilhão, e US$ 680 milhões no ano passado – queda influenciada pelo preço internacional da soja, principal produto made in Paraná.

Segundo o superintendente adjunto da Ocepar, Nelson Costa, quase a totalidade desses números é resultado das 78 cooperativas agropecuárias – que foram as precursoras do modelo. Ele destaca que em muitos municípios do Paraná as cooperativas figuram como a principal atividade econômica, bem como, geradora de receitas e empregos.

Mas longe de alcançar os bilhões das grandes cooperativas, muitos grupos estão se reunindo para encontrar soluções conjuntas de viabilizar um negócio próprio. As consideradas pequenas cooperativas são a grande maioria no estado e, mesmo com todas as dificuldades, estão apostando no sucesso. É o caso da Cooperativa dos Produtos de Cachaça Artesanal do Oeste do Paraná – Copercachaça, que reúne 31 produtores de 22 municípios da região. Fundado em agosto de 2004, o grupo já criou uma marca própria – Cachaça Quati – e almeja conquistar o mercado externo.

O presidente da Copercachaça, Reginaldo Martins, comenta que eles contam com diversas parcerias que estão ajudando a viabilizar o negócio, que, admite, ?ainda está em fase de abertura de mercado?. Da primeira safra de 450 mil litros de cachaça produzidos dentro do sistema cooperativo, apenas 15 mil litros foram entregues – o restante foi vendido informalmente. Porém, Martins destaca que os produtores têm uma capacidade ociosa que pode chegar a 2 milhões de litros. Por isso, entre os planos estão, além da cachaça branca, produzir a envelhecida em madeira, a bidestilada, a orgânica e licores com frutas tropicais.

Diversidade

O modelo de cooperativismo deu tão certo que expandiu as fronteiras agrícolas e passou a se desenvolver também no meio urbano, em áreas como saúde, crédito, educação, turismo, trabalho e habitação. Em alguns casos, o modelo foi aplicado não apenas com visão econômica, mas para mudar um sistema. Há 11 anos, um grupo de 100 pais da cidade da Lapa se reuniu e formou uma cooperativa educacional porque queria dar um ensino de maior qualidade aos filhos. No início, o Colégio Cooperativa da Lapa tinha apenas duas turmas. Hoje oferece desde o ensino maternal até o chamado terceirão (último ano do ensino médio), tendo 200 alunos e 25 colaboradores.

O diretor administrativo e financeiro da cooperativa, Eraldo Correia do Nascimento, comenta que, mesmo sendo um negócio, a proposta era construir uma consciência de ajuda mútua e que os resultados fossem investidos no negócio, para trazer um diferencial para o ensino com custo baixo. O médico veterinário e um dos fundadores da cooperativa, Eloy Marcelo Reynaud dos Santos, lembra que na época foi difícil viabilizar a idéia ?porque as pessoas não tinham a cultura do cooperativismo, achando que o modelo se aplicava somente à agricultura ou produção?. Porém, ele entende que o resultado foi tão positivo que ajudou inclusive a balizar o ensino público oferecido no município.

Hoje acadêmico de Desenho Industrial da PUC do Paraná, Cassiano Müller dos Santos, ex-aluno do Colégio da Lapa, lembra que o diferencial da escola foi não apenas a educação formal, mas a moral. ?A escola tem não apenas qualidade de ensino, mas me ajudou a crescer como pessoa?, finalizou.

Experiência que transforma vidas

Além da geração de renda, muitas vezes a experiência do trabalho cooperativo traz uma transformação de vida. Isso pode ser aplicado à Cooperativa dos Pequenos Produtores de Mandirituba, que surgiu há quatro anos para difundir o artesanato e a produção familiar de um grupo de agricultores. Porém, hoje as mulheres agricultoras trabalham na confecção de bolsas feitas de lona. A matéria-prima é toda reaproveitada de material destacado de bancos, Exército e Correios, e muitas peças feitas em Mandirituba já foram para a Suíça.

Nenhuma das mulheres tinha experiência com costura e para chegar na fase atual dizem que foram conquistando ?ponto por ponto?. Dilair Lecheta afirma que a experiência que adquiriu transformou sua vida para melhor, pois além de uma profissão ela voltou a estudar. ?Antes eu ficava na lavoura e só lá naquele mundo. Com a cooperativa, tive que me comunicar e, por isso, senti necessidade de voltar a estudar. Agora não quero parar mais?, afirmou.

A sede da cooperativa fica em uma escola que estava desativada e as dezoito máquinas foram compradas com dinheiro da produção e de verbas conseguidas através de projetos de fundações. Antes dos equipamentos, lembra Irene Medina, as mulheres levavam a lona para lavar em casa. ?Era feito tudo manual, com uma escova?, conta. Hoje, a produção feita na cooperativa – cerca de 400 bolsas por mês -, diz Luciane da Silva Konapa, é vendida em feiras e diversos pontos comerciais de Mandirituba e Curitiba – o material foi até levado para o exterior por uma ong parceira das cooperadas. Muito do que é produzido também atende encomendas, como de centros acadêmicos de universidades. A prova de fogo para essas mulheres será atender uma encomenda de 90 mil porta níqueis. ?Nós temos dois meses para isso e, se for preciso, varamos a noite para conseguir?, garantem.

Opção ao desemprego estimula crescimento do setor

O número crescente de cooperativas, avalia o engenheiro civil e professor da UniBrasil e da Universidade Federal do Paraná (UFPR), José Ricardo Vargas de Faria, pode ser explicado por dois fatores: alternativa para o desemprego e a opção das pessoas de não terem patrão. Por isso, ele afirma que ocorreu uma inversão do meio rural para o urbano, já que as chamadas cooperativas de trabalho representam a maioria do setor.

?E essa peculiaridade traz em alguns momentos uma interpretação errônea do papel das cooperativas?, diz Faria, citando que muitas são associadas com um meio de burlar a legislação. Porém, garante que todas pagam impostos normalmente e são fiscalizadas como qualquer outra empresa. ?É apenas uma forma legítima de organização dos trabalhadores?, ponderou. Já na opinião do superintendente adjunto da Ocepar, Nelson Costa, as dificuldades em viabilizar uma cooperativa esbarram na questão financeira e qualificação. Segundo ele, uma média de 200 grupos interessados consultam a Ocepar todos os anos, mas somente de 3% a 5% fundam a cooperativa.

E dar suporte na qualificação e indicar formas alternativas para encontrar capital de giro têm sido os trabalhos da Incubadora Tecnológica de Cooperativas Populares da UFPR. A coordenadora de Extensão e do Programa de Incubadoras, Sandra Suely Bergonsi, explica que a incubadora é formada por um grupo multidisciplinar, que tem como objetivo dar suporte para a fundação e desenvolvimento das cooperativas, passando por assessoria jurídica até o desenvolvimento de produtos.

A coordenadora comenta que muitas das cooperativas que surgiram pela incubadora conseguiram a auto-suficiência e hoje já estão trabalhando na diversificação dos produtos para não ficarem reféns do mercado. É o caso da Cooperativa Serramar, que envolve pescadores de Antonina. Antes, eles só trabalhavam com o beneficiamento do pescado; hoje, estudam a implantação da criação de siri em cativeiro.

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