Contas fecham se economia crescer 5%

Foto: Agência Brasil

Ministro Guido Mantega, da Fazenda: ?Você faz parte do grupo dos pessimistas??

As contas fiscais apresentadas pelo Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) só fecham se a economia crescer 4,5% este ano e 5% a partir de 2008. Se essa meta não for alcançada, todas as projeções para a trajetória da dívida pública, para as despesas com a Previdência Social, para os gastos com o funcionalismo público, entre outros, terão de ser revistas. Em conversa ontem com colunistas de economia, o ministro da Fazenda, Guido Mantega, foi questionado longamente sobre esse ponto. ?Não tenho dúvida de que será possível crescer 5%, pois o Brasil está pronto para isso.

Quando foi lembrado ao ministro que o País não cresce 5% há décadas, ele perguntou: ?Você faz parte do grupo de pessimistas?? A projeção do mercado, feita no boletim Focus do Banco Central, é de crescimento de apenas 3,5% este ano. A maioria dos analistas considera que será possível crescer 5% ao ano somente depois de 2010, assim mesmo se o governo fizer as reformas que permitirão equilibrar as contas públicas e reduzir a carga tributária.

Na conversa com os jornalistas, Mantega apresentou um quadro com uma série de projeções para as principais variáveis econômicas. Uma delas diz que a dívida pública líquida chegará a 39,7% do Produto Interno Bruto (PIB) em 2010. Hoje, ela está em torno de 50% do PIB. O problema é que, se o ritmo de crescimento da economia for inferior a 5%, essa trajetória será bem diferente. Com base na expansão econômica prevista pelo mercado, a dívida líquida ficaria em torno de 45% do PIB no último ano do segundo mandato de Lula, admitiram dois assessores de Mantega.

As despesas da Previdência só serão estabilizadas em 8,2% do PIB como indica a projeção, se o País crescer 5% ao ano. Caso o crescimento seja menor, as despesas não serão estabilizadas e crescerão mais ainda, o que resultará em déficit maior.

A mesma coisa pode ser dita sobre os gastos com salários dos servidores. Essa despesa só cairá de 5,3% do PIB este ano para 4,7% do PIB em 2010, como mostra a projeção, se a expansão for de 5% ao ano, em média. Caso a economia tenha um desempenho inferior, o governo Lula será obrigado a rever todas as projeções das contas públicas e talvez tenha de adotar medidas mais duras.

É possível resumir o programa apresentado anteontem a duas medidas essenciais: redução do superávit primário de 4,25% do PIB para 3,75% do PIB e proibição de que as despesas com o pagamento de salários dos servidores dos Três Poderes subam mais do que 1,5% ao ano, em termos reais. Com a queda do superávit, o governo aumentará substancialmente os investimentos em infra-estrutura. Com a regra dos salários dos servidores, o governo espera controlar o crescimento das despesas correntes, explosivo nos últimos 12 anos.

Das 19 medidas anunciadas por Lula, apenas um projeto de lei complementar reduz as despesas da União. É aquele que trata do controle dos gastos com pagamento de servidores. Mesmo assim, esses gastos somente cairão em relação ao PIB a partir de 2008 e na hipótese de crescimento de 5% ao ano, em média. Em 2007 eles ainda terão forte expansão, pois a proposta preserva os acordos salariais feitos pelos Três Poderes até dezembro do ano passado.

Servidores não serão prejudicados

Brasília (ABr) – Os servidores da Rede Ferroviária Federal (RFFSA) e da Companhia de Navegação do São Francisco (Franave) não serão prejudicados com a extinção das empresas, segundo o ministro dos Transportes, Paulo Sérgio Passos. A extinção das empresas está estabelecida no Programa de Aceleração de Crescimento (PAC), apresentado anteontem pelo governo federal. Segundo o governo, a medida irá reduzir os gastos públicos no médio e longo prazos.

?A Rede Ferroviária Federal já havia entrado no Programa Nacional de Desestatização desde 1992. Há muitos anos a empresa deixou de atuar operacionalmente e passou a ser uma empresa em liquidação. Evidentemente era previsível que em algum momento esse processo de liquidação se encerrasse, como se encerrou com a medida provisória assinada ontem (anteontem) pelo presidente Lula?, disse o ministro após participar de entrevista a emissoras de rádio parceiras da Radiobrás.

Segundo Passos, os trabalhadores ferroviários ativos e inativos da empresa terão seus direitos preservados. ?Os servidores ativos continuarão em exercício e passarão a ter a sua folha de salário administrada pela Valec?, afirmou. A Valec – Engenharia, Construções e Ferrovias é uma empresa pública vinculada ao Ministério dos Transportes responsável pela construção da ferrovia norte-sul.

?O encerramento do processo de liquidação vem como um desdobramento natural, já que o sistema ferroviário brasileiro hoje é explorado pela iniciativa privada em regime de concessão?, destacou.

Sobre a Companhia de Navegação do São Francisco, o ministro afirmou que se trata de uma empresa ?deficitária? e suas atividades operacionais já foram estudadas por um grupo interministerial.

?É uma companhia que só produziu prejuízos nos últimos anos, do ponto de vista operacional. E o governo entendeu que era chegado o momento de pôr essa empresa em liquidação porque a iniciativa privada será capaz de buscar alternativas de transporte naquela região, que hoje ainda conta com os serviços da Companhia de Navegação do São Francisco?, avaliou Passos.

Agricultura reclama ?segundo plano?

Brasília (ABr ) – A Confederação Nacional da Agricultura (CNA) avalia que o Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) deixou em ?segundo plano? as ?demandas específicas? da agricultura e só beneficiou o setor na medida em que prevê a execução de obras de infra-estrutura logística, importantes para o escoamento da produção.

?O ponto de destaque para o setor foi o anúncio de uma série de investimentos em rodovias, ferrovias e hidrovias que, se efetivamente saírem do papel, causarão impacto positivo na redução dos custos de produção, gerando recuperação da competitividade?, afirma a CNA, em nota na qual faz uma avaliação preliminar do PAC, divulgado anteontem.

A entidade aponta, na nota, que os números relativos a investimentos do setor privado em setores como o álcool e o biodiesel foram ?inflados?. A CNA também cobra o repasse, pela Petrobras, da redução recente nos preços do petróleo para os preços finais dos combustíveis, especialmente o diesel. ?Sem dúvida, esta atitude (a não redução dos preços) está garantindo uma lucratividade e uma capacidade de investimento extra à Petrobras à custa dos usuários, como o produtor rural?, critica a nota.

Analistas pedem pressa na redução de juro e impostos

São Paulo (AE) – As medidas contidas no Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) são insuficientes para destravar a economia e fazê-la crescer no ritmo de 5% ao ano até 2010, como deseja o governo. Essa é a opinião unânime dos economistas consultados pela Agência Estado.

O diagnóstico é de que o PAC contém medidas setoriais e não ataca os pontos básicos que empacam o crescimento, como a elevada carga tributária, o gasto público alto e o déficit da Previdência. ?O que destrava a economia é a queda nos juros. Com uma taxa real na casa de 8% a 8,5% ao ano, fica difícil crescer num ritmo mais acelerado?, diz o diretor da RC Consultores, Fábio Silveira.

Ele observa que a economia irá crescer nos próximos anos não por causa das medidas contidas no PAC, mas por causa da trajetória declinante da taxa básica de juros nos últimos meses. ?O plano será um adorno.?

Silveira diz que o PAC não ataca os pontos principais que emperram o crescimento. A deficiência mais relevante das medidas anunciadas é, na sua opinião, a falta de consistência macrossetorial. Isso significa não apenas estabelecer taxas de crescimento como as que foram anunciadas, mas dizer como elas serão alcançadas. Para isso, é preciso eleger os setores prioritários no médio e longo prazos para atingir o crescimento esperado.

O economista-chefe do banco de investimentos WestLB, Roberto Padovani, diz que o plano é tímido porque tem medidas setoriais, e afirma que faltou um ajuste fiscal mais ousado. ?Ao aumentar os gastos sem reduzir as despesas, o governo poderá dar um tiro no próprio pé?, diz o economista.

Com a elevação da dívida pública em relação ao PIB, Padovani explica que a necessidade de financiamento do governo aumenta. Isso pode retardar a queda dos juros, um indutor fundamental para o crescimento.

?As medidas são pouco ambiciosas para o que está se propondo?, afirma o economista da MB Associados Sergio Vale. Na sua opinião, para destravar o crescimento, é necessária uma reforma mais ampla no setor fiscal e a redução na carga tributária. ?Não é possível crescer 5% ao ano com uma carga tributária entre 38% e 40% do Produto Interno Bruto (PIB).?

Incompleto

A avaliação é compartilhada pela economista-chefe do ABN Amro, Zeina Latif. ?As isenções tributárias anunciadas no PAC estão concentradas na construção civil e nos bens de capital.? Segundo a economista, faltaram medidas mais horizontais que incluíssem vários setores produtivos. Ela pondera que haverá impactos positivos, mas setorialmente. Esses impactos serão insuficientes para garantir o ritmo de crescimento econômico sustentável e desejado. ?Há muito ruído nesse pacote?, diz Zeina, referindo-se ao fato de que as medidas terão de ser aprovadas pelo Congresso.

O economista não acredita que esse estímulo será suficiente para fazer com que os empresários da iniciativa privada façam significativos investimentos depois do anúncio do PAC. ?O que faz o empresário colocar a mão no bolso é o cheiro de lucro no ar?, diz Silveira. Para ele, trata-se de ?mais um? plano que, dentro de pouco tempo, será esquecido.

Para o diretor do Centro de Economia Mundial da Fundação Getúlio Vargas (FGV), Carlos Langoni, o PAC não vai fazer milagre, mas alavanca o crescimento de alguma forma. Otimista, Langoni estima que o PIB deverá crescer 4% este ano, taxa que já esperava mesmo sem o PAC. Para 2008, ele prevê uma expansão de 4% a 4,5%, se não houver alteração no cenário da economia mundial.

O ex-ministro da Fazenda Marcílio Marques Moreira vê riscos nos próximos anos de uma desaceleração maior na economia internacional. Também avalia que o Brasil não terá energia elétrica suficiente até 2009 ou 2010 para crescer muito mais que 3,5%.

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