Um dos maiores temores dos ecologistas nos anos 90 começa a se tornar realidade na China: o consumo de carros está virando uma febre num país que tem 1,3 bilhão de habitantes e um enorme potencial de emissão de gases poluentes.

Hoje, as ruas de Pequim já estão congestionadas por dois milhões de veículos e, segundo Heike Holbirg, cientista política do Instituto de Pesquisa da Ásia, de Hamburgo, na Alemanha, a tendência do mercado automobilístico chinês é continuar crescendo a passos largos.

Um mercado com tal potencial de consumo está atraindo o interesse da indústria automobilística européia. Calcula-se que ela investirá nos próximos anos cerca de um bilhão de euros na China.

O caso chinês chama a atenção por sua singularidade. Ao contrário de outros países, como a Rússia, que tiveram que se democratizar para fazer suas economias crescerem, a China começou a prosperar adotando algumas leis da economia de mercado, mas sem abrir mão do regime comunista.

Com uma política de exportação agressiva, ajudada em parte pelos baixos salários locais, a China conseguiu em pouco tempo se tornar a quarta maior nação do mundo em termos comerciais. O país perde apenas para EUA, Japão e Alemanha, como destacou recentemente o ministro do Comércio chinês, Wei Jianguo.

? Sem duvida, o século atual será de enorme prosperidade para os asiáticos ? avalia Holbirg.

Até outubro, a China exportou US$ 348,6 bilhões em produtos, um terço a mais do que no mesmo período de 2002. Além disso, o perfil dos produtos também mudou. Se antes predominavam os têxteis, hoje metade da pauta de exportações é composta por máquinas e eletrônicos.

Segundo Zhang Hehua, prefeito de Chengdu, o interesse de grandes empresas do mundo inteiro de investir até mesmo em regiões mais pobres da China, como é o caso de sua cidade, é enorme. Recentemente, Hehua negociou com a Intel a construção de uma fábrica de chips e processadores. A empresa vai investir cerca de US$ 400 milhões até 2005.

? O importante é a simplificar a burocracia e oferecer pessoal altamente qualificado ? afirma Hehua.

Mão-de-obra qualificada não falta. Embora recebam, em média, menos de 20% do que ganha um engenheiro americano ou europeu, os 300 mil engenheiros que entram no mercado chinês anualmente são capazes de competir, em termos de qualificação, com a nata da profissão no mundo.

De um lado a opressão política, do outro uma política econômica agressiva. Nos anos 80, a economia chinesa crescia anualmente cerca de 10%. Nos anos 90, a taxa de crescimento oscilou entre 8% e 9%, e para este ano a previsão é de 8%, igual à dos EUA.

? Há 14 anos, os estudantes universitários que participaram de manifestações de protesto contra o regime foram calados a tiros, mas nem isso atrapalhou o progresso econômico ? lembra Holbirg.

Nessa época, quando o mundo ainda estava dividido em economia de mercado e democracia, de um lado, e economia de planejamento e ditadura, de outro, políticos e ONGs ocidentais protestaram veementemente contra as execuções de dissidentes. Hoje, a rigidez do regime diminuiu, mas, segundo o braço alemão da Anistia Internacional, o governo chinês ainda viola direitos humanos.

Isso, no entanto, não inibiu os europeus em termos de negócios. Mesmo o Partido Verde, que faz parte da coalizão do governo alemão, apoiou quase integralmente os acordos fechados durante a recente viagem do chanceler Gerhard Schröder à China.

Segundo a edição alemã do jornal ?Financial Times?, a China está inundada de dinheiro graças ?ao bom nível de poupança e aos grandes investimentos estrangeiros?. Segundo o jornal, a Ásia é hoje a locomotiva da economia mundial.

Mas isto também cria conflitos. Recentemente, os EUA introduziram uma série de tarifas para produtos chineses, até para sutiãs. Washington acusa Pequim de manter a moeda local, o yuan, artificialmente baixa para inundar o mundo com os produtos chineses. Desde que a China entrou para a Organização Mundial do Comércio (OMC), em 2001, tornou-se o terceiro maior parceiro comercial dos EUA.

Além da indústria automobilística ? a China é hoje o mercado onde a Volkswagen mais cresce ? os supermercados e as lojas de departamento também tentam tirar proveito da sede de consumo dos chineses. A China ganhou filiais das empresas Metro, da Alemanha, Carrefour e Auchan, da França, e Wal-Mart, dos EUA. Em sua última viagem à China, no inicio de dezembro, Schröder disse que em breve todos os chineses terão poder aquisitivo para ir à Europa.

A TUI, maior empresa de turismo da Europa, levou a frase a sério e formou com a chinesa China Travel Service uma joint-venture onde detém 51%. Guido Brettschneider, da TUI, diz que dentro de dois anos cem milhões de chineses viajarão anualmente para o estrangeiro, tomando o primeiro lugar da Ásia dos turistas japoneses, com 18 milhões. Em contrapartida, a China Travel calcula que se tornará campeã mundial em hospedagem de turistas estrangeiros.

Os chineses também estão negociando mais com o Brasil. Zhang Dejiang, secretário do comitê do Partido Comunista da região de Quangdoong, disse que a China é hoje o segundo maior parceiro comercial do Brasil, com negócios de US$ 7 bilhões.

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