A concessão de subsídios no crédito ocorre em todo lugar do mundo; o problema é que o Brasil o faz de forma pouco transparente com excesso de crédito direcionado, avaliou nesta sexta-feira, 24, o presidente do Banco Central (BC), Ilan Goldfajn, em aula inaugural do curso de graduação em economia da Escola Brasileira de Economia e Finanças (EPGE) da Fundação Getulio Vargas (FGV). O presidente do BC comparou o crédito direcionado à “meia-entrada” dos cinemas e eventos culturais.
“No Brasil, todo mundo procura o privilégio, mas, quando alguém consegue, o outro tem que pagar. O privilégio é pago por quem não tem. O sistema financeiro hoje tem a metade do crédito direcionado. Ou seja, não é a taxa de mercado, são taxas subsidiadas”, afirmou Goldfajn à plateia formada majoritariamente por estudantes.
Segundo ele, é preciso aproximar os custos do crédito livre do crédito subsidiado. “Temos que trabalhar tanto com o direcionado quanto com o livre”, afirmou o presidente do BC.
Após sua apresentação, questionado sobre como funciona o crédito direcionado em outros países, Goldfajn disse que “em qualquer lugar do mundo o crédito tem subsídios”, citando os financiamentos à agricultura e à habitação como exemplos. “O que nos torna únicos é que fazemos de forma pouco transparente. Subsídios existem no mundo todo, só que a gente faz isso na intermediação”, explicou o presidente do BC.
“Não podemos conviver por décadas mais com essa dicotomia entre crédito livre e subsidiado (entre crédito livre e subsidiado). A gente tem que tratar o de cima e o de baixo também (juros mais altos e mais baixos)”, acrescentou.
Questionado sobre os estudos para mudar o formato de cálculo da TJLP, que poderão passar a ser referenciados nas taxas das NTN-Bs, como revelou o Broadcast, serviço de notícias em tempo real do Grupo Estado, em dezembro, o presidente do BC concordou que é importante fixar as mudanças em lei. “A questão de colocar na lei é essencial”, disse Goldfajn, recusando-se a dar qualquer detalhe sobre os estudos. “Não dá para falar antes de colocar a lei”, disse.
Ao tratar dos spreads bancários durante sua aula, Goldfajn mencionou não acreditar que seja o momento de mexer nos impostos nem nos compulsórios. “Não acho que seja momento de trabalhar impostos, também não acho que seja momento de trabalhar compulsórios”, afirmou o presidente do BC, enquanto mostrava os diversos componentes do custo final de crédito. “Temos que trabalhar para termos juros baixos para todo mundo”, disse Goldfajn.
Autonomia ‘de facto’
Questionado sobre a importância de haver independência formal da autoridade monetária, Ilan Goldfajn disse que a autoridade monetária tem autonomia “de facto”, mas que seria importante transformá-la numa independência “de jure”.
“Hoje em dia, o BC tem toda a liberdade para usar seus instrumentos, mas não temos autonomia ‘de jure'”, disse Goldfajn, após dizer que a independência é algo “relevante”. “A autonomia ‘de facto’ é relevante, mas estar na lei é importante porque sedimenta o que já acontece”, disse o presidente do BC, completando que a independência formal daria “frutos com poucos custos”.
Goldfajn também afirmou que não vê necessidade de mudar o mandato do BC, para incluir, além do controle da inflação, a manutenção de baixo desemprego. “Não vejo necessidade de mudar isso neste momento”, disse o presidente do BC, associando essa questão à falta de autonomia formal. “Num arranjo em que não há independência formal, vejo risco em ter um duplo mandato”, completou Goldfajn.