Crise

Comércio sofre com a falta de moedas para troco

Dono de uma padaria no Brooklin, em São Paulo, o português João Teixeira está acostumado a presentear funcionários de botecos e de bancas de jornal com bolos e coxinhas em troca de moedas. A dificuldade maior é sempre durante as festas de fim de ano, mas do último Natal para cá, só piorou. Nem os bancos, que costumam fornecer troco para os comerciantes, vêm recebendo moedas para operar.

Incansável caçador de centavos, Teixeira se viu, há alguns dias, em uma cena inusitada. Foi pedir troco numa agência do banco Santander, de onde é cliente, e acabou abordado por uma atendente, conhecida de longa data: “Ô João, você não me arruma umas moedinhas de cinco centavos?”

Quem o viu chegar com um pacote de 100 moedas debaixo do braço e entregar no caixa da agência deve ter achado estranho, diz ele. “Mas foi o que aconteceu. Fiz na amizade.”

Só que, do outro lado do balcão, nem a amizade com a clientela tem sido suficiente para suprir a falta de moedas no comércio. A reportagem ligou, aleatoriamente, para 15 agências bancárias de São Paulo – do Bradesco, Santander, Caixa e Banco do Brasil (no Itaú não foi possível falar com os atendentes por telefone).

Doze delas informaram imediatamente que não tinham troco. Outras três ficaram de tentar, mas entraram em contato no dia seguinte para dizer que não havia moedas disponíveis. “Não temos nem pra gente”, disse um dos funcionários. “O carro forte não entrega há quatro meses.” Em nota, o Banco do Brasil diz não ter identificado essa situação. Os outros bancos não responderam.

A explicação para o sumiço das moedas está no corte de orçamento do Banco Central, que encomenda a produção de dinheiro para a Casa da Moeda. No ano passado, a previsão era de que fossem produzidas 945 milhões de unidades, mas a quantidade não passou de 400 milhões – o que representa 17% das 2,3 bilhões de moedas feitas em 2013. Com isso, o valor dos contratos com o BC caiu de R$ 581,3 milhões para R$ 64,7 milhões de um ano para o outro.

Para este ano, a expectativa da Casa da Moeda é fabricar 776 milhões de unidades. O BC diz que, até este mês, colocou 317 milhões de moedas novas no mercado, o que equivale a 116 unidades por habitante. Em nota, informou que, “embora a produção de numerário, desde 2014, tenha sido impactada por necessidade de redução da despesa pública no âmbito federal, o BC tem administrado os estoques disponíveis com a finalidade de atender à demanda”.

A resposta foi parecida com a recebida pelo Sindicato da Indústria de Panificação e Confeitaria de São Paulo (Sindipan). Com tanta reclamação sobre falta de dinheiro miúdo, o presidente da entidade, Antero José Pereira, decidiu mandar ofício para o BC cobrando uma solução. “Recebemos um retorno bem bonito, sobre milhões e milhões de moedas em circulação no mercado. E foi só”, disse. “Não sabemos quando isso vai melhorar.” Até lá, ele brinca, só tem moeda quem é amigo de padre e tem como trocar cédulas pelos centavos arrecadados nas missas.

Ou quem vai buscar no interior, como o dono do Bar Birô, restaurante mineiro do bairro Vila Mariana. A cada 15 dias, Valdeir Ajala viaja quatro horas até Cristina (MG) para visitar a família e volta carregado de moedas. O dinheiro miúdo que junta em botecos e mercadinhos da cidade de 11 mil habitantes abastece o caixa do bar, que precisa de pelo menos R$ 100 em moedas por dia para operar, sem ter de ficar arredondando os preços ou pedindo a compreensão dos clientes. “É uma situação chata. E nem todo mundo entende que o problema não é só do comerciante.”

Comunicado

Para reduzir os desentendimentos com a clientela, uma unidade da confeitaria Amor aos Pedaços, em São Paulo, foi buscar informação sobre o que estava ocorrendo. Agora, no balcão, entre chocolates e pães de mel, chama atenção um comunicado impresso que vai além do “colabore com o troco”. O cliente que chega para tomar um cafezinho com bolo na loja do Shopping Bourbon, em Perdizes, é logo informado que os reflexos dos cortes de gastos em Brasília chegaram ali.

Segundo Ligia Priate, dona de duas franquias da Amor aos Pedaços, “o cliente acha que a culpa é nossa e isso estava gerando um certo constrangimento na hora de dar o troco”. A solução, diz, tem sensibilizado os clientes. Há um mês, um freguês quebrou o porquinho do filho para recuperar as moedas e as levou para trocar na loja.

A produção menor de dinheiro nos últimos anos só agravou um problema que já é crônico no comércio. As moedas estão sumindo à medida que as pessoas passam a fazer um número maior de transações nos cartões de débito ou crédito. Em 2014, segundo a Associação Brasileira das Empresas de Cartão de Crédito e Serviços (Abecs), os brasileiros gastaram R$ 978,8 bilhões em compras feitas com cartões – alta de 14,8% em relação a 2013.

Para o professor do Departamento de Economia da USP, Simão Silber, essa é uma das principais explicações para o desaparecimento das moedas. Ele explica que a inflação, em níveis elevados, também pode afetar a quantidade de moedas em circulação, pois o dinheiro vai perdendo valor com o aumento dos preços. Mas esse não é o caso do Brasil. “A inflação ainda não atingiu um nível que provoque esse tipo de efeito”, diz. “O uso do cartão e a moeda esquecida na gaveta ou guardada no porquinho ainda são as principais causas da falta de troco.” As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

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