Diante da recessão econômica que arrasou o varejo, as empresas brasileiras de calçado e vestuário não conseguiram reduzir os estoques no ano passado mesmo adotando medidas conservadoras para controlar seus volumes de mercadorias. Em valores, os estoques somados das companhias de capital aberto atingiram o recorde de R$ 3,4 bilhões, alta de 5% na comparação com 2015, e obrigaram as marcas a prolongarem suas liquidações.
A Restoque, dona das marcas Le Lis Blanc, Dudalina, John John, Induvidual, BO.BÔ, Rosa Chá e Base, foi uma das que teve maior incremento em estoque: um avanço de 25% em relação ao ano anterior, enquanto sua receita líquida recuou 10,41% – o faturamento do setor de roupas e calçados no País diminuiu 6%. Ao lado da Restoque, aparece a Renner, que, apesar de ter conseguido elevar a receita com venda de mercadoria em 4,97% mesmo com o cenário adverso, registrou alta de 25,66% em mercadorias estocadas.
Na tentativa de desovar os produtos, houve redes do varejo de moda que deram início a promoções antes mesmo do Natal e só as encerraram na semana passada. Historicamente, as liquidações do início de ano se concentram em janeiro.
De acordo com o diretor de relações institucionais da Associação Brasileira de Lojistas de Shopping (Alshop), Luís Ildefonso da Silva, os descontos concedidos no período de liquidação, que chegavam a 70%, ficaram no mesmo patamar de anos anteriores. A diferença é que houve mais itens oferecidos por causa do maior volume de mercadorias disponíveis.
O executivo disse que as marcas não estão comprando de modo exagerado e credita a elevação dos estoques à paralisação da economia. “Com a crise, não é de se estranhar esse aumento. Para as redes, é fundamental continuar comprando para trazer novidade. A expectativa é que, no segundo semestre, isso (estoque) ainda não se normalize, mas já comece diminuir.”
Disciplina. O especialista em varejo Alberto Serrentino, da Varese Retail, também não vê equívocos nas compras das marcas. Segundo ele, as empresas foram conservadoras em 2016, aumentando a disciplina e o cuidado com despesas e estoques. “Não consigo enxergar uma situação de descontrole.”
Serrentino afirma que o avanço dos estoques no fim de 2016 pode sinalizar uma projeção de incremento nas vendas em 2017 e que a situação atual das varejistas é bastante desigual no País.
A Riachuelo, por exemplo, vai na contramão. No ano passado, a empresa diminuiu o valor de seus estoques em 11%, após um 2015 também de retração – de 3,8%. Em dias, o estoque caiu de 135 para 114 no período. A receita líquida da marca subiu 7,5% ainda em 2016, um resultado que só perdeu para o da Arezzo.
A calçadista registrou alta de 10,6% na receita, enquanto seus estoques avançaram em um ritmo mais lento, de 3,3%. De acordo com o diretor da empresa Thiago Borges, as mudanças no cenário econômico em 2015 fizeram a Arezzo se adequar em 2016 para reduzir as mercadorias nos centros de distribuição.
A empresa também vem, há cinco anos, lançando suas coleções mais próximo do início da estação. A ideia é que a data de chegada da mercadoria no mercado não fique distante da realização da venda. Com o aumento das vendas no ano passado, o estoque disponível da marca em número de dias caiu de 34 para 32.
Intencional. O diretor financeiro e de relações com investidores da Lojas Renner, Laurence Gomes, afirmou que a companhia elevou seus estoques de propósito no fim do ano passado para poder lançar a coleção de outono/inverno antes do carnaval, na segunda semana de fevereiro. “Foi a primeira vez que fizemos isso. Geralmente o lançamento é um pouco mais tarde e com entradas (de peças nas lojas) mais fragmentadas.”
De acordo com o executivo, foi necessário um esforço logístico maior para adotar essa estratégia comercial. Gomes disse que, no terceiro trimestre de 2016, a companhia começou a sentir uma melhora gradual nas vendas e decidiu estar bem abastecida para 2017.
Procurada, a Restoque não quis comentar. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.