O comportamento da inadimplência no curto e no médio prazo é o grande ponto de interrogação em termos de endividamento e consumo, avaliou nesta quinta-feira, 17, o economista Bruno Fernandes, da Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC). Diante do encarecimento do crédito decorrente da alta de juros, o nível de endividamento das famílias tem crescido, a despeito da tentativa de contenção de novos gastos. A grande questão é que, diferentemente de anos anteriores, quando o crescimento da renda acomodava as dívidas, o mercado de trabalho agora perde fôlego.
“Agora temos um cenário com renda em desaceleração. Os indicadores macroeconômicos não vêm favorecendo a questão da inadimplência. A situação pode piorar”, observou Fernandes. Hoje, a CNC informou que o endividamento subiu a 63,0% em julho, e 18,9% dessas famílias têm contas em atraso. Apesar disso, 6,6% delas não têm condições de quitar os débitos vencidos, mesma fatia de junho. É este porcentual menor que serve de guia sobre a inadimplência dentro da pesquisa da confederação.
O Banco Central, contudo, já tem apontado aumento da inadimplência. Na categoria de crédito livre para pessoas físicas, os atrasos superiores a 90 dias subiram a 6,7% em maio, após três meses estáveis em 6,5%. “Nós últimos anos, o aumento do endividamento não virou inadimplência porque o mercado de trabalho tinha força e a renda absorvia isso. Agora, o cenário é menos favorável”, reforçou o economista da CNC.
Apesar disso, Fernandes observou que as famílias tentam cada vez mais evitar novas dívidas. A prova é que, na comparação anual, o nível de endividamento caiu (era de 65,2% em julho de 2013). Mesmo assim, elas estão mais alavancadas do que no mês passado. “Por mais que o aumento do custo do crédito faça com que elas contratem menos dívidas, está mais difícil pagar”, explicou o economista.
“Há queda no poder de compra, com juros mais altos e inflação elevada. As famílias tentam se desalavancar, mas não conseguem”, acrescentou Fernandes, citando mais uma vez a menor alta na renda como determinante neste processo.
A despeito de o BC ter mantido, pela segunda vez consecutiva, a taxa básica de juros em 11% na reunião do Comitê de Política Monetária (Copom) finalizada nesta quarta, 16, o economista da CNC acredita que os juros ao consumidor seguirão numa tendência crescente. “Há certa defasagem (entre o aumento da Selic e a repercussão nos juros do varejo). Isso ainda vai refletir no curto prazo e deve contribuir para segurar ainda mais o ritmo de aumento do crédito”, avaliou.
Diante do quadro, a CNC tem constantemente revisado para baixo a projeção de crescimento do volume de vendas no varejo restrito (sem veículos e materiais de construção) este ano. Na última rodada, ajustou a previsão de 4,7% para 4,5%. Mas a desaceleração no consumo ainda não deve trazer alívio ao orçamento das famílias, justamente por causa do aumento dos juros e da inflação, que ainda deve se manter elevada. “Dificilmente teremos desaceleração do endividamento no curto prazo”, sentenciou Fernandes.