Celso Amorim reage à inflexibilidade de Morales

Foto: Antonio Cruz/Agência Brasil

Amorim: Brasil não assistirá passivamente a uma possível decisão unilateral de La Paz.

O ministro das Relações Exteriores, Celso Amorim, reagiu ontem à inflexibilidade do governo de Evo Morales que manteve a data do dia 28 de outubro, véspera do segundo turno das eleições, como o prazo final para a definição dos termos do acordo para que a Petrobras continue operando na Bolívia apenas como mera prestadora de serviço. Amorim disse que os dois países não podem se tornar ?escravos? nem ?vítimas? do prazo estabelecido no decreto que nacionalizou o setor de gás e de petróleo do país. Igualmente reiterou que o governo não assistirá passivamente a uma possível decisão unilateral de La Paz.

?O Brasil não está pedindo a prorrogação do prazo. Os negociadores brasileiros dizem que é preciso ter uma negociação boa e que não podem ficar escravos do prazo. Isso não tem nada a ver com a eleição brasileira?, declarou Amorim. ?Não se pode prejudicar a perspectiva de cooperação e de uma relação estratégica entre o Brasil e a Bolívia com decisões unilaterais e arbitrárias. Elas têm de ser negociadas, o acordo tem de ser benéfico e equilibrado para ambos os lados, e chegar a isso não é fácil?, completou.

A decisão unilateral, no caso, será a aplicação dos termos do decreto ao pé da letra. Até o próximo sábado, se não houver um acordo fechado sobre as regras para a atuação da Petrobras na Bolívia, na condição de prestadora de serviços nas áreas de produção de gás e refino de petróleo, o governo Evo Morales poderá expulsar a companhia brasileira do país. Esta decisão, se confirmada, tenderia a se converter em pólvora para a oposição justamente no dia da votação no Brasil, como reconhece o próprio Amorim.

A mesma regra será aplicada às negociações que a YPFB mantém com cerca de 20 outras empresas petrolíferas estrangeiras presentes na Bolívia. Até o momento, nenhum desses acordos foi fechado. Tampouco surgiram sinais otimistas das negociações retomadas na tarde de segunda-feira (23) com a Petrobras, em La Paz, complicadas pela insistência dos bolivianos em impor um contrato de prestação de serviços com regras inaceitáveis. Esse documento prevê que a Petrobras atue no país por tempo indeterminado e seja remunerada a cada trimestre e que as eventuais pendências sejam resolvidas por uma arbitragem em língua espanhola sediada em La Paz, com base na Constituição boliviana.

Esse cenário alimenta a expectativa do governo Lula de que ainda se pode ter o adiamento do ?prazo fatal? pela Bolívia. Na semana passada, entretanto, o governo boliviano enviou clara mensagem ao ex-assessor de Assuntos Internacionais da Presidência e coordenador da campanha petista, Marco Aurélio Garcia, de que não estenderá o prazo para a conclusão do acordo, por força da crise política que começa a se irradiar na base de sustentação de Evo Morales.

Desde então, Amorim conversou por telefone com os ministros da Presidência (Casa Civil), Juan Ramón Quiroga, e das Relações Exteriores, David Choquehuanca, enquanto Silas Rondeau (Minas e Energia) tratava do assunto com o ministro de Planejamento para o Desenvolvimento, Carlos Villegas.

Reação gelatinosa

Em plena reta final das eleições, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva vem se esquivando de figurar como personagem do impasse. Sua última conversa com Evo Morales foi logo depois do primeiro turno, conforme informou o chanceler. Lula, entretanto, mantém o tom gelatinoso de sua provável reação a uma decisão unilateral de La Paz.

?O Brasil tomará as medidas legais que tiverem de ser tomadas?, avisou ontem Amorim, referindo-se à possível apelação à arbitragem internacional. ?Não vai retaliar a Bolívia nem fazer ameaças. Isso só serviria aos radicais, de um lado e de outro. É fácil ser truculento com os fracos e submisso com os fortes?, rebateu o ministro, que está pessoalmente empenhado na campanha de reeleição do presidente Lula. Sob o lema da benevolência para com os vizinhos mais pobres, o governo Lula dispõe como moeda de troca apenas dos projetos de cooperação e de relação estratégica mencionados por Amorim. Não se trata de um pacote barato, ainda mais para um país que necessita desesperadamente de recursos para a ampliação de sua produção de gás. Esses projetos envolvem futuros investimentos da própria Petrobras no país, a criação de um pólo gás-químico bilateral na fronteira e o financiamento de obras de infra-estrutura.

Tolmasquin descarta risco de faltar gás natural no Brasil

Rio (AE) – O presidente da Empresa de Pesquisa Energética (EPE), Maurício Tolmasquim, afastou ontem qualquer risco de faltar gás natural no Brasil nos próximos anos, especialmente em 2008, considerado crítico pelo mercado. Apesar disso, ele admitiu que ?serão anos de turbulência? até 2009, quando os principais projetos da Petrobras para a área de gás deverão ser colocados em operação, ?tornando a situação absolutamente gerenciável?.

Para driblar a ?turbulência?, Tolmasquim afirmou que estão sendo tomadas providências como a conversão de pelo menos três usinas térmicas da Petrobras em bicombustíveis, ou seja, usando óleo diesel em vez de gás natural. ?Pensava-se em fazer isso com mais plantas, mas não houve licença ambiental para todas elas?, disse.

Outra medida, segundo ele, é que a Petrobras está negociando a aquisição de plantas térmicas instaladas no nordeste e que hoje são operadas a partir do uso de diesel. São plantas instaladas a partir do pacote do PPT (Plano Prioritário de Termelétricas), lançado no governo Fernando Henrique Cardoso.

?A Petrobras vai adquirir estas térmicas para garantir lastro no caso de uma térmica a gás ter que ser acionada. Se ela (a estatal) não tem gás para abastecer a térmica, coloca a unidade a diesel para funcionar em seu lugar e arca com a diferença de preços?, afirmou.

Tolmasquim admitiu ainda que nos próximos anos o consumidor pode ter sua tarifa elevada, se os reservatórios caírem abaixo da média. ?O que estamos dizendo que, na pior das hipóteses, o risco não é de segurança no abastecimento, mas sim de aumento de tarifa?, afirmou.

Segundo ele, se houvesse uma ameaça de desabastecimento, ainda assim haveria o recurso de despachar usinas movidas a gás que estão descontratadas até 2009 e, portanto, são mais caras. ?Isso poderia elevar a tarifa do consumidor, mas em nenhum momento é considerada hoje pelo governo a possibilidade de uma térmica não ser acionada por falta do combustível?, destacou.

?Temos dois problemas: um conjuntural e outro estrutural. O primeiro ocorreu agora, com a quebra de compressores de gás na Bolívia, e que dificultou o despacho de algumas térmicas. Isso já está solucionado.? O outro problema é atender a demanda crescente no futuro e ?para dar conta disso, sabemos que a Petrobras está trabalhando duro em novos projetos?, disse, citando além da entrada em produção de novos campos de gás, a utilização do Gás Natural Liquefeito (GNL).

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